DÚVIDAS

Construção comparativa: «a mais do que»

Aproveito essa oportunidade para agradecer a toda a equipa do Ciberdúvidas o trabalho que têm desenvolvido incessantemente ao longo dos anos. A plataforma tornou-se um recurso mais que valioso para muitos seguidores da lusofonia e, sobretudo, permitam-me aqui uma nota, um meio de preservação e pesquisa de particularidades que destacam precisamente o português de Portugal, bastante e imerecidamente preterido hoje em dia em materiais didáticos estrangeiros e pela Internet fora.

Ao assunto.

1. Apareceu-me uma frase:

«[O sobrinho]… respondeu-me com o braço por cima dos meus ombros, cresceu quase meio metro a mais do que eu e tem gosto em sentir que nos protege (...)» (P., 18/08/24, por B.W.).

Embora eu tenha visto tal uso diversas vezes em edições precolendas portuguesas (Público, etc.), ouvido estar em plena circulação no português do Brasil e tenha sido o fenómeno registado em:

1. Dicionário Priberam

e 2. Infopedia – nos exemplos não verificados pelos editores e na descrição do verbete, sempre me deixa em dúvida a "convivência" das duas expressões, a meu ver, distintas: «qualquer coisa mais (do) que qualquer coisa» e «qualquer coisa a mais».

Na maioria esmagadora dos resultados que obtive ao pesquisar, a preposição a surgia na formação «a mais do que qualquer coisa», enquanto a regência verbal («... corresponde a mais do que metade...») ou nominal («referência/algo referente a mais do que...»), e não como parte da locução comparativa única. Ou, se ocorria «a mais», era seguida de um ponto final: «tantas vezes a mais»; «uns anos a mais»; «ficou com moedas a mais», etc. O mesmo acontecia a «a menos».

Se bem que isto não pareça apresentar uma agramaticalidade, se tanto, será que se precisa de a em «a mais do que» do exemplo exposto?

Em tese, podia (ou devia?) ser algo como: «...cresceu mais alto (do) que eu, ficou com meio metro a mais [ponto final]»?

Haverá cambiantes de acepção ou estilo tanto no contexto do português de Portugal como no âmbito brasileiro?

 Obrigado.

Resposta

No contexto apresentado, o uso da locução «a mais» é possível e está correto.

A locução adverbial «a mais» é uma expressão fixa que pode ser usada com o valor de «além do desenvolvido ou necessário; a maior, em excesso, de sobra» (Dicionário Houaiss)

Assim, na frase em apreço, identificamos uma oração principal, aqui simplificada na frase transcrita em (1)

(1) «Ele cresceu quase meio metro a mais.»

A esta oração acrescenta-se uma oração subordinada de valor comparativo, que na sua forma completa ficaria como se exemplifica em (2):

(2) «Ele cresceu quase meio metro a mais do que eu cresci.»

Na frase original, o verbo da oração subordinada está omitido, tal como acontece muito frequentemente com as orações subordinadas comparativas:

(3) «Ele cresceu quase meio metro a mais do que eu.»

Em nome do Ciberdúvidas, agradeço as gentis palavras que nos endereça.

Disponha sempre!

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