Nem sempre é fácil distinguir prefixos de elementos de formação. O caso de contratempo insere-se no que Celso Cunha e Lindley Cintra (Nova Gramática do Português Contemporâneo, 1984, pág. 85/86) consideram como característico dos prefixos (itálico do original a negro):
«Os prefixos são mais independentes do que os sufixos, pois se originam, em geral, de advérbios ou de preposições que têm ou tiveram vida autónoma na língua. A rigor, poderíamos até discernir as formações em que entram prefixos que são meras partículas, sem existência própria no idioma (como des- em desfazer, ou re- em repor), daquelas e que participam elementos prefixais que costumam funcionar também como palavras independentes (assim: contra- em contradizer, entre- em entreabrir). No primeiro caso haveria derivação; no segundo, seria justo falar em composição.»
Margarita Correia e Lúcia San Payo de Lemos (Inovação Lexical em Português, Lisboa, Edições Colibri, 2005, pág. 31) incluem contra- entre os prefixos que se relacionam através do eixo semântico negação/oposição/negação(exs., in-/infeliz, não-/não-alinhado, des-/desfazer, a-/acéfalo, contra-/contramanifestação). Estas autoras advertem (ibidem), porém, que há um tipo de prefixos, os avaliativos (exs., super- em super-interessante ou mega em megaconcerto, que levanta problemas de classificação, «[...] dado que, na paráfrase composicional dos derivados, este prefixos equivalem frequentemente a adjectivos e, nesses casos, apresentam um significado que pode considerar-se de natureza lexixal, pelo que podem ser considerados elementos de composição.» Ora, pensando que contra é, além de preposição, advérbio e nome (cf. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa), concluiremos que este elemento mantém um certo grau de autonomia e, por conseguinte, não é claro o seu estatuto como prefixo.
Deste modo, recorremos ao parecer de duas consultoras de Ciberdúvidas, as quais apresentam perspectivas diferentes mas não antagónicas sobre a formação de contratempo. Para Carla Viana, a palavra contratempo é derivada por prefixação:
[contra] prefixo de oposição + [tempo] substantivo
Carla Viana observa que a composição é um processo diferente da derivação por prefixação. Enquanto a prefixação consiste na junção de um prefixo (partícula afixal que transmite informação semântica) a uma base primitiva ou derivada, a composição consiste na junção de duas ou mais palavras ou radicais, que podem ser de categorias gramaticais diferentes, a fim de constituírem uma só. A partícula contra transmite informação semântica significando movimento de natureza similar em sentido contrário (circunstância que contraria o curso de um acontecimento no tempo). No caso de contratempo, contra não funciona como palavra isolada mas como prefixo.
Edite Prada esclarece que os nomes que identificam os três processos fundamentais de formação de palavras – neologia, derivação e composição – não sofreram alteração na nova terminologia, pelo que a classificação das palavras, globalmente, também não sofreu alteração. No caso de contratempo, contra- é um elemento de formação e não um prefixo, pelo que a palavra contratempo é uma palavra composta.
Parece-nos que estas duas posições são, no fundo, complementares, porque dão conta do comportamento ambíguo de contra-. Lembremos, no entanto, que uma solução possível é encarar os prefixos correspondentes a palavras isoladas como parte da derivação prefixal (cf. Cunha e Cintra, op.cit., pág. 86).