DÚVIDAS

Complemento preposicional/adverbial

Sinto alguma confusão entre complemento preposicional e adverbial: Na TLEBS vejo o exemplo: «O João foi [a Nova Iorque]», e «a Nova Iorque» é complemento preposicional; no manual (Das Palavras aos Actos, 10.º ano, da Asa) vejo o exemplo: «Os alunos vão a Lisboa», sendo aqui apresentado «a Lisboa» como complemento adverbial, tal como «na rua paralela» em «O João mora na rua paralela». Na Gramática da Língua Portuguesa (Mira Mateus e...) da Editorial Caminho, também não encontro uma explicação clara (pág. 425, por exemplo). Sinto a mesma dúvida a nível de modificadores: «Os alunos construíram um poema na semana passada.» «Na semana passada» é um modificador (adjunto ou circunstante) preposicional? Reconheço que, numa estrutura profunda, certos advérbios se identificam com sintagmas preposicionais («com doçura» = «docemente»; «nesse lugar» = «aí»), mas continuo a sentir dificuldade em orientar inequivocamente os alunos.
Grata pelo apoio.

Resposta

1. Em primeiro lugar há a distinguir complemento de modificador. Há vários testes que se podem fazer:

APossibilidade de figurar ou não numa pergunta

a) O Zé mora aqui.
O que se passa com o Zé (aqui)?
*Mora.

b) Espero por ti aqui.
O que se passa comigo aqui?
Espero por ti.

Se o complemento ocorrer numa pergunta tipificada como «O que é que se passa com…?» ou «O que é aconteceu a…?» a resposta ou é redundante ou é insuficiente.
O modificador pode ocorrer numa pergunta deste tipo sem prejuízo para a informatividade da resposta correspondente.
Assim: em a), «aqui» é um complemento; em b), «aqui» é um modificador.

BSupressão

Substituindo um verbo transitivo por um verbo intransitivo, o complemento tem de ser suprimido:

c) O professor abriu o livro.
*O professor espirrou o livro.

d) A abelha faz o mel.
*A abelha zune o mel.

Contrariamente, o modificador não tem de ser suprimido.

e) O professor abriu o livro na sala de aula.
O professor espirrou na sala de aula.

f) A abelha faz o mel na Primavera.
A abelha zune na Primavera.

Assim: em c) e d), os grupos «o livro» e «o mel» são complementos; em e) e f), os grupos «na sala de aula» e «na Primavera» são modificadores.

CEstrutura clivada

Ao colocar o grupo verbal em estrutura clivada, o complemento desloca-se obrigatoriamente com o verbo.

g) O professor abriu o livro.
Foi abrir o livro o que o professor fez.
*Foi abrir o professor fez o livro.

Porém, o modificador pode ser deslocado com o verbo ou não.

h) O professor abriu o livro na sala de aula
Foi abrir o livro na sala de aula o que o professor fez.
Foi abrir o livro o que o professor fez na sala de aula.

2. Os termos complemento/modificador preposicional/adverbial são classificações apuradas segundo a categoria da palavra que serve de núcleo ao grupo (ou sintagma) respectivo.

3. Estas são, pois, classificações morfológicas e sintácticas – são as que figuram na TLEBS no subdomínio «Sintaxe». No entanto, em semântica, e especificamente em semântica temporal, trabalha-se com o termo «expressão adverbial» ou simplesmente «adverbial». Uma expressão adverbial é uma expressão que tem valor idêntico ao do advérbio, mas que pode ser um advérbio ou não. E, de facto, muitas vezes não o é. Uma expressão adverbial pode ser realizada por um grupo nominal (i), por um grupo preposicional (j) e, inclusivamente, por orações subordinadas (l).

(i) Esta noite há bailarico.
(j) Na noite seguinte, havia bailarico.
(l) Quando se casa alguém, há bailarico.

Repare que, também na TLEBS, no subdomínio «Semântica frásica», as formas «em x tempo» e «durante x tempo» são justamente designadas por «locuções adverbiais».

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