Nas gramáticas descritivas contemporâneas 1, o pronome você é incluído no sistema de pronomes português, numa opção que dá conta do uso muito generalizado deste pronome, em substituição do pronome vós, cuja vitalidade parece diminuir gradualmente.
O pronome você tem, contudo, especificidades que o distinguem dos pronomes ditos tradicionais, na medida em que se associa a duas pessoas distintas. Você designa, por um lado, a pessoa com quem se fala (2.ª pessoa). Esta é a pessoa semântica de você, que se refere ao interlocutor. Por outro lado, surge com verbos conjugados na 3.ª pessoa. Esta é a pessoa gramatical de você. É a pessoa gramatical que determina que a série de pronomes associados a você seja, no singular, você, o/a, lhe, se, si, consigo e, no plural, vocês, os/as, lhes, se2. Assim, as opções adequadas a este esquema serão:
(1) «Queria comunicar-lhes a notícia.» (= -vos)
(2) «Gostava que o professor lhes desse uma boa nota.» (= vos)
(3) «Encontrei-os na rua.» (= -vos)
Por uma questão de coerência, também os possessivos deverão ser utilizados na 3.ª pessoa gramatical.
Não obstante, como se refere na Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013), «para alguns falantes, as formas os/as (de complemento direto) e lhes (de complemento indireto) podem alternar com a forma vos […], vocês não fizeram nada ao professor, mas ele pôs-vos de castigo, e […], vocês gostavam que o professor vos desse uma boa nota?. Como complemento da preposição com, pode ocorrer convosco: […] vocês gostavam que ele viesse convosco?» (nota, 39, p. 901).
Significam estas afirmações que ambas as opções apresentadas pela consulente são válidas e a coexistência de ambas as opções denota que, em termos linguísticos, se vive um período de instabilidade que necessitará do seu tempo até encontrar uma opção que fará parte da norma europeia da língua portuguesa. Diga-se, todavia, que, num discurso mais cuidado e formal, os falantes têm tendência a evitar a utilização do pronome você, preferindo formas mais neutras.
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1. Cf., por exemplo, Raposo et.al, Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, 2013, p. 902.
2. Cf. Id. Ibidem, p. 901.