Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Venho perguntar se o verbo desadensar existe realmente ou não. Efetivamente, não existe no Dicionário Priberam; no entanto, a Infopédia dá a entender que o verbo em causa existe e que é possível encontrar-se entradas relativas à existência do possível verbo.

Grato pela atenção.

Resposta:

O verbo desadensar está atestado em diversos dicionários, nomeadamente nos dicionários Houaiss, Infopédia e Michaelis. Este verbo, cujo significado é «tornar menos denso ou eliminar a densidade de», tem como sinónimos os verbos ralear e ralentar, e é formado pelo prefixo des, que se agrega ao verbo adensar. 

Pergunta:

«Aqui vem a sua música favorita», diz o locutor radiofónico; «é a minha comida favorita», diz a minha filha...

Nas duas situações eu usaria preferida em vez de favorita. Estarei errado?

Sempre associei o termo favorito a competição, a algo ou alguém que está melhor posicionado para alguma coisa («é a equipa favorita no campeonato», «o filme que era considerado o favorito naquela categoria», por exemplo). Já com a palavra preferido, penso numa escolha (quase subjetiva) de algo ou alguém («a minha música preferida», «ele é o aluno preferido da professora»). Por exemplo, eu poderia usar os dois na mesma frase: «eu acho que a equipa favorita no campeonato é X, mas a minha preferida é Y». Nos dicionários ambos os termos aparecem como possíveis sinónimos do outro, mas sem contexto algum.

Gostaria de ser esclarecido sobre este tema. Obrigado.

Resposta:

Efetivamente os adjetivos são sinónimos. Veja-se, por exemplo, o dicionário Houaiss, que atesta o adjetivo preferido como «que se prefere ou preferiu, o que foi escolhido, o mais querido, favorito, predileto». Na mesma fonte, favorito está atestado como «diz-se de ou que agrada mais, predileto, preferido; diz-se de ou indivíduo que goza da proteção de uma pessoa, grupo ou entidade poderosos».Podemos usar, portanto, um em lugar do outro nos casos enumerados.

Observe-se, ainda, que o dicionário em referência regista a ocorrência do adjetivo favorito também em contexto desportivo, como em: «diz-se de ou o concorrente que tem maiores chances de vencer uma competição». Assim, e apesar de sinónimos, em contextos de competição, prevalece o adjetivo favorito, tal como o consulente referiu. 

Pergunta:

Gostaria de saber se «vou beber o comprimido» está correcto1, ou se devemos apenas dizer «tomar o comprimido».

 

1 O consulente escreve correcto, seguindo a ortografia em vigor até 2009 em Portugal. No quadro do Acordo Ortográfico de 1990, escreve-se correto.

Resposta:

A verdade é que é comum e correto dizer-se que «tomamos o comprimido» com o sentido de «ingerir uma substância sólida». No entanto, esta ação é, em principio, acompanhada com água ou outra substância líquida, pelo que também a construção «beber o comprimido» se atesta no uso, ainda que de modo muito discutível.

Algo de semelhante parece acontecer em referência à ingestão de medicamentos, sejam eles sólidos ou líquidos, como seja um xarope, que é, por si, uma substância líquida, embora com uma textura viscosa: pode declarar-se que «tomamos o xarope» ou «bebemos o xarope». Ambas as construções ocorrem em discurso, mas, mais uma vez, o verbo tomar não só tem uso mais frequente como encontra maior favor (ver Textos relacionados). 

Onde foi parar o hífen?
A hifenização em palavras compostas designando espécies botânicas e zoológicas

Sabe-se que o uso do hífen nas palavras compostas é matéria de recorrentes desacertos. Não se esperaria, porém, que isso acontecesse num concurso televisivo cujos participantes são desafiados a provar que a sua cultura geral passa também pelo domínio do idioma nacional... Ainda por cima, sendo frequente os erros neste espaço da televisão pública portuguesa... 

Pergunta:

Há alguma diferença substancial entre escrever «partícipe da luta» ou «partícipe na luta»?

Resposta:

Tal como o verbo participar , o adjetivo e substantivo partícipe, sinónimo de participante, pode ser regido por ambas as preposições mencionadas: deem. Com efeito, no sentido de «ter parte, tomar parte, ser parte integrante de, intervir»1 o verbo participar é regido pela preposição em ou pela preposição de. No entanto, a norma do português europeu dá preferência ao uso da preposição em, o que, transposto para o caso de partícipe, leva a concluir que a frase mais próxima da norma é «partícipe na luta». Já no português do Brasil a situação pode ser inversa. Como verificamos no Dicionário Houaiss, há uma clara preferência pelo uso da preposição de. 

1 O verbo participar pode ter ainda o sentido de «comunicar, fazer queixa, saber, anunciar, transmitir» e, neste caso, é regido pelas preposições de ou a: «participou do funcionário ao fiscal».