Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Relativamente à palavra paleio (conversa), que verbo deve acompanhar este nome?

Poderá, ser, por exemplo, o verbo dar? «O homem dava paleio.»

Obrigado.

Resposta:

O substantivo paleio  «conjunto de palavras sem importância, verborreia; discurso hábil através do qual se pretende persuadir, seduzir ou enganar alguém, lábia; fluência e facilidade de expressão» (Infopédia pode ser associado a vários verbos, incluindo o verbo dar. Exemplos:

1. Dar: «ele deu-me paleio» («ele deu-me conversa»);

2. Deixar: «Vem comer e deixa-te de paleio» («Deixa-te de conversa»);

3. Ficar: «Eles ficaram no paleio» («Eles ficaram na conversa»);

4. Pegar: «Eles pegaram de paleio» («Começaram a conversar»);

5. Ficar: «Eles ficaram no paleio» («Ficaram na conversa»);

6. Começar: «Eles começaram no paleio» («Começaram a conversar»).

Ora, em todos os casos acima transcritos, percebemos que paleio é sinónimo de conversa, ainda que usado em contexto informal ou familiar, e, por isso mesmo, todos os verbos que associamos a conversa servirão, certamente, para o substantivo paleio. 

Pergunta:

Relativamente ao verbo implorar, perguntava-vos se podemos aceitar esta construção: «Ele implorou para a mãe o levar dali.»

Obrigado.

Resposta:

O exemplo apresentado – «Ele implorou para a mãe o levar dali» – é aceitável, se não mesmo correto.

O verbo implorar é um verbo considerado diretivo (designa atos de fala que representam ordens ou pedidos), que seleciona «orações infinitivas introduzidas pela preposição para» (Gramática do Português, Fundação Calouste Gulbenkian, pág. 1929)1. De salientar, ainda, que este verbo é transitivo direto, indireto e intransitivo, ou seja, ocorre com um complemento direto («aquilo que se implora/suplica»), um complemento indireto («a pessoa a quem se implora/suplica») ou sem qualquer complemento («pedir insistentemente») (J. Malaca Casteleiro, Dicionário Gramatical de Verbos Portugueses, pág. 504). Entre os exemplos apresentados neste dicionário, incluem-se os casos em que o verbo implorar ocorre como verbo transitivo (exemplo 1), ou enquanto transitivo direto e indireto, selecionando a preposição a (exemplo 2):

1. «Ele implorou a ajuda de todos»;

2. «Ele implorou ajuda à mãe».

Implorar aceita também o emprego da preposição por a introduzir o complemento referente à coisa que se implora ou suplica (no panorama dos dicionários do português do Brasil, ver Francisco Borba, Dicionário de Uso do Português do Brasil, São Paulo, Editora Ática, 2002):

3. «Implorei por toda a ajuda possível».

Pergunta:

Gostava de saber que preposição se usa com o verbo perguntar: «Perguntar alguém por/sobre/de algo», ou sem preposição?

Ex. «Ela sempre pergunta por/sobre/de tudo ou pergunta tudo? 

Obrigada.

Resposta:

Com o verbo perguntar, não se aceita a associação de um complemento introduzido pela preposição de. É, portanto, incorreta a frase como «ele sempre pergunta de tudo»1.

O verbo perguntar ocorre frequentemente de acordo com o seguinte esquema: «perguntar a alguém se/onde/que/qual...». Neste caso, o verbo ocorre com um complemento indireto («a alguém») e uma oração subordinada substantiva completiva que é também interrogativa indireta («...se conhece Lisboa»/«onde é Lisboa»/«que se faz em Lisboa»/«qual é o maior monumento de Lisboa»).

O verbo perguntar pode, no entanto, apresentar-se também com esta estrutura: «perguntar alguma coisa a alguém» (p. ex. «Ele perguntou ao amigo as horas»). Nesta construção, o complemento direto costuma ser realizado por uma expressão pronominal ou nominal de conteúdo mais abstrato, como «perguntou-lhe isso», «eles perguntam-lhe tudo», «ela perguntava-lhe coisas indiscretas» (= «fazia perguntas indiscretas»). Sendo assim, deve escrever-se: «perguntar tudo a alguém» – sem inserir a preposição de.

O verbo em questão aparece acompanhado ainda pelas preposições por e sobre:

2. i.«Perguntou pela Joana»

    ii.«Perguntei pela saúde da Joana»;

3. «O polícia perguntou sobre o assalto».

Em 2, ocorre com a preposição por, com duas aceções: em (i) tenta-se localizar alguém, e em (ii) tenta-se saber algo sobre determinada questão2. Em 3, perguntar corresponde a «interrogar (alguém) a respeito de algo».

 

1 Observe-se, contudo, a possibilidade de «ele pergunta de tudo», em que «de tudo» é uma locução q...

Pergunta:

Começo por expressar os meus agradecimentos por todas as respostas e a ajuda linguística. É um trabalho excelente e muito útil. Parabéns.

Gostava de saber que preposição se usa com o verbo permitir: «permitir a alguém de fazer algo»?

Ex. O restaurante não permite aos clientes de fumar.

Antecipados agradecimentos pela resposta.

Resposta:

O verbo permitir é transitivo direto e indireto, ou seja, seleciona um complemento direto e um complemento indireto, de acordo com o esquema sintático: «permitir alguma coisa [complemento direto] a alguém [complemento indireto]». Quando a referência àquilo que é permitido é marcada por um verbo no infinitivo – ou melhor, por uma oração de infinitivo –, mantém-se o mesmo esquema sintático: «permiti a alguém fazer alguma coisa». Por outras palavras, a frase correta é «o restaurante não permite aos clientes fumar», não se usando preposição antes do verbo no infinitivo. Esta, portanto, incorreto o exemplo em questão, em que a preposição de antecede o verbo fumar.

Note-se que, na situação descrita, o verbo permitir é usado na aceção de «dar liberdade, poder ou licença para [alguma coisa], consentir, conceder» (Dicionário Houaiss).

Contudo, o verbo em questão pode também ocorrer como transitivo direto:

1. «A sua rapidez permitiu a vitória»;

2. «A situação não permitia demora».

Em 2, permitir é interpretável como o mesmo que «dar lugar ou ocasião a, possibilitar» (ibidem). Em 3, assume o significado de «dar liberdade, admitir, tolerar» (ibidem). 

Agradecemos as palavras de apreço. 

Pergunta:

Ao pretender referir-me ao agente que elicita, ou seja, o que promove ou faz sair, que leva a, valoriza ..., fico com dúvida em: "elicitador", "elicitor", "elicidador", "elicidor" (sendo que prefiro o elicitor).

Procurei em inglês em elicit → elicitor é usado e em francês o verbo éliciter.

Mais uma vez agradeço poder ver esclarecida outra dúvida que vos submeto, aproveitando para realçar o bom acolhimento que anteriores têm tido.

Resposta:

Elicitar é variante discutível de eliciar (ver Textos Relacionados). Seja como for, atendendo a que elicitar tem uso já enraizado, a palavra derivada regularmente deste verbo e que denota a noção de agente é elicitador, tal como de licitar se forma licitador.