Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora
<i>Obrigado</i> vs. <i>gratidão</i>
A ênfase no agradecimento

Quando passou o substantivo gratidão a concorrer obrigado nos nossos agradecimentos? E em que contextos é usada esta expressão? A estas perguntas responde a consultora Sara Mourato, num texto onde reflete acerca dos usos de gratidão.

Pergunta:

De entre as formas contempladas, qual a etimologicamente mais correta para designar um natural das ilhas Maldivas?

Os meus agradecimentos.

Resposta:

De acordo com o Código de Redação Interinstitucional o gentílico a que corresponde um natural das Maldivas é maldivo/maldiva. No entanto, há registo de outras designações para um natural deste território, nomeadamente: maldívio/maldívia e maldiviano/maldiviana1.

Não há uma clara indicação sobre qual dos três gentílicos é etimologicamente mais correto para designar um habitante das Maldivas. Se tomarmos como referência o Código de Redação Interinstitucional, então a forma recomendada seria então maldivo/maldiva.

 

1 Foram consultados o Portal da Língua Portuguesa, InfopédiaDicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa, Dicionário Houaiss.

Pergunta:

O verbo reacionar [re-acionar] existe?

Ou seja, na aceção de «voltar a acionar» ou «voltar a pôr em ação, prática ou funcionamento» alguma coisa – mecanismo, medida, plano, processo, etc.

Resposta:

O verbo reacionar, apesar de não se encontrar atestado, está bem formado: ao verbo acionar agregou-se o sufixo re-, que tem sentido de «movimento para trás, repetição». Tem como significado, como o consulente refere, «voltar a acionar; voltar a pôr em ação, prática ou funcionamento». 

Talvez, contudo, seja mais comum ouvir-se reativar com o sentido dado a reacionar. Não obstante, reacionar é aceite.

Pergunta:

Qual o significado da expressão «neste conspecto», muitas vezes utilizada pelos tribunais?

Por exemplo:

«Quando o despejo tenha por fundamento a falta de pagamento de rendas, encargos ou despesas, a decisão de promoção da correspondente execução deve ser tomada em simultâneo com a decisão do despejo, o que significa que é conferida competência legal a um órgão administrativo para determinar, não apenas o despejo, mas a sua execução, e neste conspecto, o poder de decidir o despejo e de o executar, sob autotutela declarativa e executiva» – aqui.

Resposta:

Do latim conspectus, conspecto, de acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa, significa «ato de observar, de ver; vista de alguma coisa; exame, observação».

Assim, no contexto em apreço, «neste conspecto» pode ser entendido como «nesta perspetiva». De facto, «neste conspecto» refere-se à perspetiva da situação em que a competência legal é conferida a um órgão administrativo para decidir e executar o despejo. A expressão indica que a autoridade tem a capacidade de avaliar a situação como um todo, tanto no que diz respeito à decisão de despejo quanto à sua execução.

Pergunta:

Cumprimento-os, desejoso de que todos desfrutem de boa saúde física e emocional.

Surgiu uma dúvida quanto ao plural do vocábulo fera, usado como adjetivo.

O correto é dizer-se: «Os alunos são fera» ou «Os alunos são feras»?

Pergunto isso, partindo-se do pressuposto de que os substantivos, quando funcionam como adjetivos, não se flexionam em número.

Desde já, agradeço-lhes os vastos esclarecimentos.

Resposta:

Começo por referir que os substantivos, quando funcionam como adjetivo, flexionam em número. Caso disso é, por exemplo, o uso de nomes de animais adjetivalmente:

(1) «Ela é rata»

(2) «Elas são ratas».1 

Por essa razão, fera, enquanto adjetivo, flexiona-se:

(3) «Os alunos são feras».

Contudo, em português do Brasil2, parece haver tendência para não se flexionar quando nos referimos a um grupo de pessoas que é excecional naquilo que faz (em português de Portugal, este adjetivo não é utilizado com esta aceção), i. e., parece comum dizer-se:

(4) «os alunos são fera».

Contudo, é de salientar que esta simplificação coloquial do adjetivo fera, não é gramatical, mesmo que de uso comum e compreensível. 

 

Agradecemos as palavras de apreço.

 

1 A expressão, em alguns contextos, pode ter conotações negativas, i.e, quando se refere a alguém que é astuto, esperto ou perspicaz em determinadas situações. No entanto, em certos casos, essa expressão pode ser usada de maneira coloquial e amigável, dependendo do tom e do contexto da conversa. 

2 O adjetivo fera pode ter significados diferentes nas duas variantes do português. Em português de Portugal, fero/fera refere-se a alguém que «que demonstra ferocidade; que é selvagem; que denota crueldade, desumanidade; que denota violência, impetuosidade; que é áspero, agreste ou duro; que assusta ou amedronta; que possui ou demonstra robustez, força» (Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa). Além destas aceções, em português do Brasil, o mesmo adjetivo tem uso coloquial com o s...