Miguel Moiteiro Marques - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Miguel Moiteiro Marques
Miguel Moiteiro Marques
15K

Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas (Estudos Portugueses e Ingleses) pela Faculdade Letras da Universidade de Lisboa e mestrando em Língua e Cultura Portuguesa na mesma faculdade.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Na expressão «Levai-me àquele barco», o me tem a função sintática de complemento direto ou indireto?

Resposta:

Tal como referido nesta resposta, a função de me na frase apresentada pelo consulente deverá ser de complemento direto, assim como nesta tirada do sapateiro no Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente: «Hou barqueiros! Que aguardais? Vamos, venha a prancha logo e levai-me àquele fogo!»

Noutro contexto, o me poderá ser um complemento indireto, como na frase «Levai-me àquele barco a bagagem que estiver despachada». Neste caso, o complemento direto é «a bagagem» e, se o pronominalizássemos, a frase teria a seguinte forma: «Levai-ma [me + a] àquele barco.»

Pergunta:

A palavra embarcado é formada por parassíntese, ou por prefixação e sufixação?

Resposta:

A palavra embarcado é formada por sufixação a partir de embarcar, a qual é, de facto, formada por parassíntese (simultaneamente prefixação e sufixação) com o prefixo em- (por en-) e o sufixo -ar (cf. Dicionário Houaiss).

Pergunta:

Na frase «Meu pai, levai-me por quem sois», o me é complemento directo, ou indirecto?

Resposta:

A função de me na frase apresentada pela consulente deverá ser de complemento direto, tal como na súplica da personagem Maria no drama Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett: «Meu querido pai, levai-me, por quem sois, convosco.»

Contudo, o contexto poderá ser diferente, e o enunciador poderá querer dizer «Meu pai, levai-me, por quem sois, a sopa à cama», situação em que o me é complemento indireto.

Assim, dada esta ambiguidade, teremos de especificar o contexto e, visto que se confundem as formas acusativa e dativa do pronome pessoal eu, devemos experimentar alterar o complemento direto, referindo-nos a ela para tornar mais clara a função sintática:

«Meu pai, levai-a, por quem sois.»

Pergunta:

Gostaria de saber se é indiferente a utilização de anticonstitucionalmente e anticonstitucionalissimamente.

Já agora, qual a diferença entre as palavras, no que respeita aos seus significados?

Anticonstitucionalissimamente, sendo advérbio, poderá vir de anticonstitucionalíssimo?

Resposta:

Não é indiferente a utilização de uma ou outra palavra; há uma diferença no grau de intensidade das duas palavras: a forma anticonstitucionalissimamente é o grau superlativo do advérbio anticonstitucionalmente, significando «de modo muito anticonstitucional» (Dicionário Priberam).

As duas palavras podem ser utilizadas no contexto jurídico (veja, por exemplo, anticonstitucionalissimamente neste texto de José Inácio Gonzaga Franceschini de Introdução ao Direito da Concorrência). Contudo, a forma superlativa do advérbio parece reunir mais as atenções dos linguistas por ser a maior palavra não técnica registada na língua portuguesa (ver A Prolog morphological analyzer for Portuguese); já as palavras técnicas podem ser mais longas, como pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiótico, o termo mais longo registado no Dicionário Eletrônico Houaiss.

Quanto à formação, anticonstitucionalissimamente, vem, de facto, do grau superlativo do adjetivo, mas, como referem Cunha e Cintra na Nova Gramática do Português Contemporâneo (p. 545), «nos advérbios em -mente, esta terminação se pospõe à forma superlativa feminina do adjetivo de que se deriva o advérbio». Assim, a forma-base será

Pergunta:

Gostaria de saber se a palavra exibicional existe, uma vez que não encontrei a sua entrada em nenhum dos dicionários on-line onde procurei, incluindo o vosso. Provavelmente a sua origem não é latina, nem grega... Pergunto se será de origem inglesa, derivada da palavra exhibit?

Por favor satisfaçam-me esta dúvida.

Resposta:

Não conseguimos encontrar qualquer registo de exibicional em dicionários ou enciclopédias que confirmassem o sentido da palavra, apesar de ser atestada pelo Portal da Língua Portuguesa (mas não pelo Vocabulário Ortográfico do Português da Academia Brasileira de Letras).

A palavra é habitualmente usada na comunicação social portuguesa para referir a «qualidade de desempenho [demonstrada publicamente]», como atestam as seguintes frases retiradas do CETEMPúblico (Corpus de Extratos de Textos Eletrónicos MCT/Público)1:

1) «O jogo de Wembley foi de grande nível competitivo e exibicional

2) «Defendemos muito bem, mantivemos o mesmo nível exibicional e, assim, ganhámos o jogo.»

3) «Mas Matsuoka não conseguiu manter o nível exibicional durante muito tempo e acabou por perder.»

Mesmo na língua inglesa, da qual a consulente suspeita provir este termo, não há registo de exhibitional — nem mesmo em instrumentos linguísticos mais permissivos e inclusivos como o Wikdictionary —, e o