Miguel Moiteiro Marques - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Miguel Moiteiro Marques
Miguel Moiteiro Marques
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Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas (Estudos Portugueses e Ingleses) pela Faculdade Letras da Universidade de Lisboa e mestrando em Língua e Cultura Portuguesa na mesma faculdade.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Deve dizer-se «cantar afinado», ou «cantar afinadamente»? Porquê?

Resposta:

As duas opções apresentadas pelo consulente são usar o adjetivo afinado ou usar o advérbio afinadamente para indicar o modo de cantar de alguém. Ambas as formas são possíveis em português, associadas a contextos de formalidade diferentes, como refere Carla Viana nesta resposta.

De qualquer forma, procurando o consulente utilizar a forma mais elegante, deverá optar por usar o advérbio, em detrimento do emprego adverbial do adjetivo, pois, como referem Cunha e Cintra na Nova Gramática do Português Contemporâneo, «a forma adverbial, invariável, impede a possibilidade de concordância, justamente o elo que prendia o adjetivo ao sujeito, e, com isso, faz aflorar com toda a nitidez o modo por que se processa a ação indicada pelo verbo».

Assim, deverá optar por «Ela canta afinadamente» em vez de «Ela canta afinada».

Pergunta:

O adjetivo numeral primeira tem sinónimo?

A frase é: «Quando a mãe a presenteava com uma guloseima, Amarguinha fazia uma careta à primeira trincadela num chocolate ou lambidela num chupa.»

Resposta:

O numeral primeira tem, de facto, vários sinónimos, com sentidos próximos aos de elementar, inicial, precedente, primitivo, primogénito, principal e superior (Dicionário Houaiss de Sinônimos e Antônimos).

Quanto à frase em questão, julgo que poderia ser usado o termo inicial, ficando a frase «Quando a mãe a presenteava com uma guloseima, Amarguinha fazia uma careta à trincadela inicial num chocolate ou lambidela num chupa».

Pergunta:

Gostaria de saber se a palavra consagrar tem origem em ou significa «com sangue».

Resposta:

Consagrar tem origem no verbo latino consacrare, resultante da correção de consecrare e com o mesmo sentido de sacrare: «dedicar a Deus, aos deuses ou ao serviço divino; tornar sagrado» (José Pedro Machado, Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa).

O facto de este termo ser também relativo à consagração do pão e do vinho na celebração da eucaristia, e dada a simbologia do vinho associada ao sangue de Cristo, não significa, porém, que o verbo consagrar se relacione com hipotéticas construções como «com sangrar» ou «com sangue».

Pergunta:

Espero não estar a repetir uma pergunta, mas não é uma pesquisa muito fácil de fazer, neste caso. Segundo o dicionário online Priberam, ex já pode ser considerado um substantivo, significando alguém de um relacionamento anterior. Fiquei, no entanto, na dúvida quanto ao plural desta palavra. Dever-se-á dizer «os meus ex», ou há um plural mais correcto?

Resposta:

O uso de ex como nome para os dois géneros em frases como «A minha ex telefonou-me», significando alguém de um relacionamento anterior, está limitado a contextos informais, como até acrescenta o Dicionário Priberam. O nome não é reconhecido nem pelo Vocabulário Ortográfico do Português, disponível no Portal da Língua Portuguesa, nem pelo vocabulário da Academia Brasileira de Letras, mas o Grande Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, de Malaca Casteleiro, indica tratar-se de um estrangeirismo com origem no inglês, lendo-se [ɛksɨ], tal como na suposta língua de origem.

A primeira questão é saber a origem do termo. As fontes consultadas que reconhecem a sua existência são contraditórias, uma (Grande Dicionário da Língua Portuguesa) indicando ser um estrangeirismo com «pronúncia à inglesa» – opção adotada, por exemplo, na promoção do filme A Lista dos Ex – e outra (Dicionário Priberam) propondo a pronúncia [eis], igual à da palavra composta.

Aquilo a que assistimos, nestes casos, é a uma redução morfológica de um elemento da palavra composta, situação que acontece também com outras palavras com prefixos latinos, como, por exemplo, vice, reconhecida pelo Dicionário Houaiss como «redução de substantivos precedidos do elemento antepositivo vice-», ...

Pergunta:

É correto nos dirigirmos às pessoas com a expressão «muito bom dia» ou «muito boa tarde» ou «muito boa noite»?

Resposta:

O uso do advérbio muito como determinante do adjetivo está correto, tratando-se da construção do grau superlativo absoluto analítico, como em «muito quente» ou «muito frio». Podemos, pois, dirigir-nos às pessoas e saudá-las, dizendo «muito bom dia!».