Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

   O que são recursos estilísticos e quais são?

Resposta:

Constitui recurso estilístico não só a expressão pessoal de um autor ao utilizar a língua de uma forma artística, como as chamadas figuras de estilo, modos de dizer já categorizados, com características específicas. Sempre que se recorre às potencialidades da língua para construir uma frase bela, emocionante, expressiva, que traduza a realidade de uma forma criativa, estamos perante um recurso estilístico.

Assim, são recursos estilísticos:

1 – A utilização de uma adjectivação sugestiva, a ligação inusitada de um substantivo a um adjectivo, o uso de uma pontuação que sugira o estado de alma, a opção por uma sequência de vocábulos de um determinado campo semântico, a utilização de processos enfáticos, etc.

2 – As figuras de estilo:

a) A nível fónico: aliteração, assonância, onomatopeia, paronomásia, rima, ritmo;

b) A nível morfossintáctico: anacoluto,

Pergunta:

Como ensinar concordância verbal e nominal para um adulto que fala muito errado?

Resposta:

Em Portugal não usamos a expressão familiar "falar errado" mas sim "falar mal", "exprimir-se mal", "dar muitos erros".

O que pergunta abrange todo o ensino da sintaxe.

A sintaxe ensina-se com a verificação da ocorrência (um momento), a clarificação da regra (outro momento), o contacto frequente com os exemplos (outro momento) e a prática, o treino (outro momento). Estes momentos não estão hierarquizados; eles permutam entre si.

Assim, o contacto com interacções verbais correctas, a leitura, a consulta de gramáticas e prontuários (em especial a parte respeitante às concordâncias e regências nominais e verbais) e a escrita são os procedimentos normais para a aprendizagem da forma como construir frases com as devidas concordâncias.

Pergunta:

Por que no Sistema Ortográfico em Portugal optou-se por grafar as consoantes finais de sílaba em vocábulos como acto, acção, baptismo e outras?

Resposta:

A sua pergunta é muito curiosa.

Não foram os portugueses que optaram por grafar essas consoantes não articuladas, mas os brasileiros que optaram por deixar de as grafar.

Essas consoantes persistem por questões de natureza etimológica. Efectivamente, as palavras que as contêm têm um étimo, latino na maior parte das vezes, onde essas consoantes existiam e eram articuladas.

Na evolução da língua portuguesa, há a considerar três situações, em Portugal, a respeito das consoantes c /k/ e p /p/ em final de sílaba:

   1.ª - Vocalizaram-se: directu- > direito; doctore- > doutor; lacte- > leite; lectu- > leito; lectore- > leitor; nocte- > noite; octubre- > outubro; pectu- > peito; respectu > respeito; secta > seita; acceptabile- > aceitável; preceptu- > preceito.
   2.ª - Foram foneticamente assimiladas pelo som consonântico seguinte, desaparecendo a sua articulação (ou seja, não se lêem): abstracto (< abstractu-); acção (< actione-); acepção (< aceptione-); activo (< activu-); acto (< actu-); actualidade (< actualitate-); adjectivo (< adjectivu); adopção (< adoptione-); afectivo (< affectivu-); afecto (< affectu-); arquitecto (< architectu-); atracção (< attractione-); atractivo (< attractivu-); baptismo (< baptismu-); carácter (< do grego character<...

Pergunta:

O que são registros regionais da língua portuguesa? Cite exemplos. O que são variações linguísticas? Cite exemplos.

Resposta:

Registro é termo usado no Brasil correspondente a registo, em Portugal e demais países lusófonos. Em linguística, designa a variedade da língua definida de acordo com o seu uso em situações sociais.
Assim, o termo registos linguísticos designa os diversos estilos que um falante pode usar consoante a situação comunicativa em que participa: numa conversa informal num café com os amigos, por exemplo, utilizará um registo diferente do que utiliza em família, com a avó. A esta variação chama-se variação diafásica.
Variações linguísticas são as diferentes manifestações e realizações da língua, as diversas formas que a língua possui, decorrentes de factores de natureza histórica, regional, social ou situacional. Essas variações podem ocorrer a nível fonético e fonológico, morfológico, sintáctico e semântico.
Podemos considerar cinco campos de estudo da variação linguística.
1.º - Variação diacrónica (do grego dia + kronos = ao longo de, através de + tempo): as diversas manifestações de uma língua através dos tempos.
2.º - Variação sincrónica (do grego sy'n = simultaneidade): as variações num mesmo período de tempo.
3.º - Variação diatópica (do grego topos = lugar), geolinguística ou dialectal: a variação relacionada com factores geográficos (pronúncia diferente, diferentes palavras para designar as mesmas realidades ou conceitos, acepções de um termo diferentes de região para região, expressões ou construções frásicas próprias de uma região).
4.º - Variação distrática (do grego stratos = camada, nível): modos de falar que correspondem a códigos de comportamento de determinados grupos sociais. O sociolecto é uma variedade linguística partilhada por um grupo social que o demarca em relação a outros (por exemplo, as gírias). O tecnolecto (ou linguagem técnica) consiste na utilização de term...

Pergunta:

Li, num jornal diário, que "quando os Maias foram publicados..."
A minha dúvida é se os Maias foram publicados ou se um livro com o título de "Os Maias" foi publicado.
As minhas desculpas pelo incómodo e agradecimentos pela resposta.

Resposta:

Não há total consenso entre os autores que especificaram esta concordância.
Uns consideram que os títulos no plural exigem o predicado no plural, a não ser quando têm um predicativo do sujeito no singular.
Ex.: Os Contos de Eça de Queirós são muito conhecidos.
Os Contos de Eça de Queirós é uma obra muito conhecida.
Outros há que fazem depender a utilização do predicado no singular ou no plural da existência ou não de determinante a anteceder o título.
Ex.: Lendas e Narrativas reaviva mitos antigos.
As Lendas e Narrativas reavivam mitos antigos.
Em função das leituras que fiz, segue-se a minha posição e justificação.
Tanto poderá dizer "Os Maias foram publicados." como "Um livro com o título Os Maias foi publicado."
Poderá usar o singular, se anteceder o título de um substantivo que seja o sujeito da oração.
Ex.:
O romance Os Maias foi publicado em 1888.
A obra Os Maias é estudada no ensino secundário.
A narrativa Os Maias foi adaptada ao teatro.
A ópera de Wagner Os Mestres Cantores de Nuremberga é muito conhecida.
O hino A Portuguesa já não é cantado nas escolas.
Naturalmente que o particípio passado e o adjectivo (atributo ou predicativo) concordam em género e número com o sujeito (romance, obra, narrativa, ópera, hino, etc.).
No entanto, se utilizar apenas o título da obra, o predicado e outros elementos relacionados concordam com esse título (masculino ou feminino do singular, masculino ou feminino do plural).
Ex.:
Os Maias foram mencionados pela crítica como um dos melhores romances de Eça.
Os Maias são estudados...