Pergunta:
Li o seguinte numa publicação religiosa: «Precisamos de alguém de fora para dar-nos o domínio próprio que os estóicos desejavam, e esse alguém é o Espírito Santo.» Nunca vi nos melhores escritores a combinação de um pronome demonstrativo com um pronome indefinido, mas percebo que tal junção se tem intensificado nas matérias que se publicam aqui. Necessito de vossa opinião, pois creio ser muito estranha essa sintaxe... Acredito também que tal arranjo não tem nenhum apoio clássico. Na língua latina nunca jamais vi «hic aliquis» nem «iste aliquis».
Illustrate me! Tenebras solvite!
Resposta:
Alguém, para além de pronome indefinido, é também um substantivo masculino. Neste caso, significa «ser humano», «pessoa», e pode vir acompanhado de determinante (pronome adjunto, no Brasil). A expressão «esse alguém» é já utilizada nos séculos XIX e XX, tanto por escritores portugueses como brasileiros, como comprovam os seguintes excertos, retirados do Corpus do Português:
Alexandre Herculano, O Bobo:
«O esperto pajem tinha notado quão frequentes vezes seu tio lançara os olhos inquietos para a porta: isto lhe provara que esperava alguém, e a falta do alferes-mor que esse alguém era ele.»
Machado de Assis, Balas de Estado:
«Parei, recuei, avancei e disse-lhe que era meu, que, se estava ocupado por alguém, esse alguém que saísse e mo restituísse.»
Eça de Queirós, Alves & Companhia:
«Nítido sotaque erablesiano, mas esse alguém, quando interpelado, declarava ter vivido toda a sua vida em Becre.»