Maria João Matos - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Maria João Matos
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Maria João Matos, professora de Português do ensino secundário, licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa.

 
Textos publicados pela autora

Ao sustentar esta controvérsia com o dr. José Neves Henriques, não me sinto numa posição confortável.

O dr. José Neves Henriques é um estudioso da Língua Portuguesa e já deu sobejas provas dos conhecimentos que tem sobre ela. Com as suas explicações no Ciberdúvidas, aprendi muito e espero continuar a aprender. Pelo contrário, eu entrei como consultora para o Ciberdúvidas praticamente na mesma altura em que manifestei a min...

Pergunta:

Em Português fui ensinado a dizer pormenor, em vez desse horrível galicismo do “detalhe”.

Quem mo ensinou foi Gaspar José Machado, nos idos de 1943... Será resultado dos sucessivos "acordos"??

Resposta:

A dinâmica da língua ultrapassa necessariamente a ratificação feita pelos acordos ortográficos. A propósito desta palavra, achamos interessante apresentar opiniões diversas de estudiosos da língua:

No Grande Dicionário de Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, da Sociedade da Língua Portuguesa, pode ler-se: «Galicismo inútil, vantajosamente substituível por minúcia, miudeza, pormenor, particularidade

No seu Dicionário de Questões Vernáculas (Livraria Ciência e Tecnologia Editora, São Paulo), Napoleão Mendes de Almeida escreveu: «Detalhe, detalhar – Já João Ribeiro a afirmar: "É galicismo muito usado...", já Vasco Botelho de Amaral a dizer: "A bem da verdade, detalhe, detalhar têm feição portuguesa" – que mais acrescentar? É realmente difícil impor a substituição em "O fato foi detalhadamente reproduzido" – "Não há detalhe que não revele o pintor" – como difícil é rejeitar a palavra quando temos talhe, entalhe. Se de "tailler" o francês fez "détailler", por que do nosso talhar não podemos fazer detalhar

Agradeço ao dr. José Neves Henriques as suas amáveis palavras. É através da controvérsia, certamente, que todos aprendemos, uma vez que ela nos obriga, como diz, "a observar, a pensar, a estudar e a resolver"; é também esse o meu objectivo, e é por isso mesmo que, mais uma vez, me permito discordar da sua explicação.

Pergunta:

Reparei, há tempos, numa opção de um autor de um Glossário em que se contempla a expressão "recém-nascido" como um exemplo de palavra derivada por prefixação. Tendo em conta que "recém" poderá ser considerado um adjectivo (se bem que não usado isoladamente) com sentido autónomo e inequívoco, não poderia esta expressão ser considerada como uma palavra composta?

Confundem-me, ainda, algumas situações de morfemas considerados prefixos mas cujo sentido é mais completo que "in-", "ex-" ou "per-" – como no caso de "mega", "auto", "hiper"... Existe algum tipo de classificação intermédia para estes morfemas que, não sendo utilizados isoladamente têm, no entanto, o comportamento de adjectivos?

Obrigada pela atenção.

Resposta:

O elemento de composição recém é uma forma apocopada do adjectivo recente, logo, a palavra recém-nascido é uma palavra composta, em que um adjectivo com função adverbial (recém) e uma forma verbal (nascido) originam a nova palavra.

Em relação à segunda questão, não conheço, na gramática tradicional, nenhuma classificação intermédia de prefixos. Por outro lado, as fronteiras entre composição e derivação nem sempre são claras. Note que mega(lo)- e auto-, segundo a Nova Gramática do Português, de C. Cunha e L. Cintra, são radicais e não prefixos, que entram na composição de palavras eruditas.

Não concordo de modo algum com a explicação dada pelo consultor José Neves Henriques sobre esta questão. Independentemente de a vírgula estar correcta ou não (e eu acredito que sim, que esteja correcta), ela está lá entre o sujeito e o predicado. A expressão «uma língua que não se defende» é o sujeito de «morre» e não pode ser considerada, portanto, uma expressão isolada entre vírgulas, ou seja, intercalada.