Maria Eugénia Alves - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Maria Eugénia Alves
Maria Eugénia Alves
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Professora portuguesa, licenciada em Filologia Românica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com tese de mestrado sobre Eugénio de Andrade, na Universidade de Toulouse; classificadora das provas de exame nacional de Português, no Ensino Secundário. 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Recomendou há tempos a Fundéu (Fundació del Español Urgente) o uso de um neologismo entrado recentemente na língua castelhana, o verbo arrobar, no sentido de usar o caracter [@], arroba, empregado para endereçamento de mensagens na internet. E em português há razão para o adotarmos, também?

Resposta:

    Numa pesquisa do correspondente em português, verifiquei que ainda não está contemplado nos dicionários consultados. O que temos, por exemplo, no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa é outra aceção da palavra para contexto diferente:

(arroba + -ar) verbo transitivo: 1. Pesar às arrobas; 2. Sopesar; 3. Calcular o peso de.

    Não sei se os nossos vizinhos praticarão assiduamente o verbo, ao ponto de a Fundéu ter aconselhado o seu uso, mas, por enquanto, em Portugal, parece não ter caído em graça, à semelhança de outros oriundos do léxico da internet: guglar, deletar ou escanear, que também não colheram adeptos, apesar das entradas dicionarísticas.

    O que é certo é que hoje em dia pouca gente, especialmente a da urbe, saberá, quiçá, o que é uma arroba, para além daquela sinalefa internética, que tanto jeito lhe dá.

     Ouvir falar de arrobas de batatas, lenha, ou laranjas rondará, muito provavelmente, o domínio do esotérico. 

 

N.E. (9/12/2022) O verbo guglar já tem registo dicionarístico, na forma aportuguesada preferivel a googalaraqui e aqui, por exemplo. Deletar («apagar») e 

Pergunta:

Gostava que me esclarecessem sobre a forma correta de escrever palavras do tipo nanoesfera, nanoestrutura, microesfera, microestrutura, infraestrutura, macroesfera e macroestrutura. A dúvida é se têm ou não hífen (nano-esfera) ou se o e nestas palavras cai ou não (nanosfera).

Grata pela atenção.

Resposta:

A Base XVI do Acordo Ortográfico  de 1990 (Do hífen na prefixação, recomposição e sufixação), estipula o seguinte:

1. Nas formações com prefixos (como, por exemplo: ante-, anti-, circum-, co-, contra-, entre-, extra-, hiper-, infra-, intra-, pós-, pré-, pró-, sobre-, sub-, super-, supra-, ultra-, etc.) e em formações por recomposição, isto é, com elementos não autónomos ou falsos prefixos, de origem grega e latina (tais como: aero-, agro-, arqui-, auto-, bio-, eletro-, geo-, hidro-, inter-, macro-, maxi-, micro-, mini-, multi-, neo-, pan-, pluri-, proto­, pseudo­, retro-, semi-, tele-, etc.), só se emprega o hífen nos seguintes casos: 

a) Nas formações em que o segundo elemento começa por h: anti-higiénico/anti-higiênico, circum-hospitalar, co-herdeiro, contra-harmónico/contra-harmônico, extra-humano, pré-história, sub-hepático, super-homem, ultra-hiperbólico; arqui­hipérbole, eletro-higrómetro, geo-história, neo-helénico/neo-helênico, pan-helenismo, semi-hospitalar. [...]

b) Nas formações em que o prefixo ou pseudoprefixo termina na mesma vogal com que se inicia o segundo elemento: anti-ibérico, contra-almirante, infra-axilar, supra-auricular; arqui-irmandade, auto-observação, eletro-ótica, micro-onda, semi-interno. [...]

2. Não se emprega, pois, o hífen:

a) Nas formações em que o prefixo ou falso prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por r ou s, devendo estas consoantes duplicar-se, prática aliás já generalizada em palavras deste tipo pertencentes aos domínios científico e técnico. Assim: antirreligioso, antissemita, contrarregra, contrassenha, cosseno, extrarregular, in...

Pergunta:

Sempre que leio narrativas, encontro verbos no tempo verbal pretérito mais-que-perfeito, mas fora isso é bem difícil eu encontrar o uso dele – tanto na fala quanto na escrita. Porém, analisando mais calmamente percebi que trocando o verbo no pretérito mais-que-perfeito para um Verbo auxiliar + verbo principal no particípio, o sentido da oração se torna o mesmo.

Vejam-se estes exemplos:

1 – «Quando o noivo apareceu, a noiva já chegara à igreja.» Caso eu troque o «já chegara» para «já tinha chegado», a frase tem o mesmo sentido: «Quando o noivo apareceu, a noiva já tinha chegado à igreja.»

2 – «Pálida, jogada fora de uma Igreja, olhou a terra imóvel de onde partira e aonde de novo fora entregue». Caso eu troque o «partira» e «fora» para «tinha partido» e «tinha sido entregue», a frase tem o mesmo sentido: «Pálida, jogada fora de uma Igreja, olhou a terra imóvel de onde tinha partido e aonde de novo tinha sido entregue». Por isso, gostaria de saber se será sempre correto, de acordo com a norma padrão, fazer essa troca que eu fiz e se um equivale a outro.

Obrigado.

Resposta:

    Quando se diz «trocar», está a referir-se ao uso do mesmo tempo verbal, o pretérito mais-que-perfeito do indicativo, que tem duas variantes: o simples (chegarae o composto (tinha chegado). Assim, ambos são substituíveis um pelo outro, pois têm o mesmo sentido.

   No entanto, há subtilezas no seu uso: o simples é usado sobretudo na escrita literária, enquanto o composto é mais usado na oralidade. A formação do pretérito mais-que-perfeito composto do indicativo é formado pelo pretérito imperfeito do indicativo do verbo auxiliar ter mais o particípio passado do verbo principal.

    Segundo Evanildo Bechara, na sua Moderna Gramática Portuguesa, o

Pergunta:

Sobre o uso da segunda pessoa do plural, gostaria de saber se ainda é possível, em Portugal, ouvir alguém que não seja do extremo norte utilizar o pronome vós em alguma situação. Sei que o uso dos possessivos (vosso/vossa/vossos/vossas) e dos pronomes oblíquos (vos/convosco) é extremamente comum e recorrente, mas o que dizer do pronome pessoal do caso reto que lhes corresponde? Usa-se o vós na fala coloquial? Com que frequência? E na escrita, é permitido pela norma misturar os pronomes auxiliares do vós com o pronome vocês? Ainda é comum os livros apresentarem os diálogos com o pronome vós? Ele soa estranho ou antiquado para os portugueses? Qual é a percentagem aproximada de portugueses que ainda usam o vós coloquialmente? São muitas dúvidas, mas achei melhor perguntar tudo duma vez em lugar de fazer várias perguntas parecidas.

Resposta:

    A forma de tratamento que usa a segunda pessoa do plural (vós) é de uso muito raro em Portugal, não se empregando na fala coloquial quotidiana. Contudo, é possível ainda hoje encontrar esse registo em formas dialectais, sobretudo no norte de Portugal.

   No que respeita à escrita informal, não é possível a mistura de vós e vocês, uma vez que o primeiro é arcaico e o segundo tomou o seu lugar há muito no registo dos falantes. No entanto, na escrita literária, os dois pronomes podem ocorrer, se o contexto assim o permitir. 

   Pode dizer-se que o seu emprego é limitado, de forma geral, a registos muito formais e litúrgicos. Como diz Lindley Cintra na sua obra Sobre Formas de Tratamento na Língua Portuguesa, «o vós e a 2ª pessoa do plural permaneceram como relíquias de um estádio anterior, nas orações dos cristãos e, de um modo geral, no modo de se dirigir a Deus ou à Virgem: 'Pai Nosso, que estais no céu [...]; Bendita sois vós entre as mulheres'.»

Pergunta:

Como diferenciar as Conjuncões das Preposições e conjunções preposicionais ou preposições conjuncionais?

Resposta:

Segundo o Dicionário Terminológico, as classes de palavras podem ser:

1. abertas, quando possuem um número ilimitado de palavras (nome, adjetivo, verbo, advérbio, interjeição),

2. fechadas, quando possuem um número limitado de palavras (determinante, pronome, quantificador, preposição e conjunção) 

O consulente pretende identificar as conjunções e as preposições e disso daremos conta a seguir. Chamamos a atenção para o facto de não existir a nomenclatura a que alude na pergunta, «conjunções preposicionais ou preposições conjuncionais». 

 

A. CONJUNÇÕES

 A Gramática de Português, de Maria Regina Rocha, Porto Editora, 2017, define assim: «As conjunções são palavras invariáveis que servem para ligar elementos dentro de uma frase. Em função do tipo de oração que introduzem, podem classificar-se de coordenativas ou subordinativas.

A par das conjunções, existem as locuções conjuncionais, constituídas por sequências de duas ou mais palavras que têm as mesmas funções das conjunções.»