Filipe Carvalho - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Filipe Carvalho
Filipe Carvalho
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Mestre em Teoria da Literatura (2003) e licenciado em Estudos Portugueses (1993). Professor de língua portuguesa, latina, francesa e inglesa em várias escolas oficiais, profissionais e particulares dos ensinos básico, secundário e universitário. Formador de Formadores (1994), organizou e ministrou vários cursos, tanto em regime presencial, como semipresencial (B-learning) e à distância (E-learning). Supervisor de formação e responsável por plataforma contendo 80 cursos profissionais.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Tenho algumas dúvidas em relação a algumas palavras no novo acordo ortográfico. Assim, as minhas dúvidas são: co-infeção ou coinfeção, co-autoria ou coautoria, auto-imune ou autoimune (esta já não relativa ao prefixo co, mas ao prefixo auto que me parece, a mim, leiga, na mesma condição).

Desde já, obrigada pela ajuda. 

Resposta:

Coinfeção, coautoria e autoimune é a grafia correta.

Segundo o Acordo Ortográfico de 1990, com  os prefixos ante-, anti-, arqui-, circum-, co-*, contra-, entre-, extra-, hiper-, infra-, inter-, intra-, semi-, sobre-, sub-, supra-, ultra- e com os falsos prefixos aero-, foto-, macro-, maxi-, mega-, micro-, mini-, neo-, pan-, proto-, pseudo-, retro- e tele- só se emprega o hífen: 

1. Se o segundo elemento começar por h [ante-histórico, anti-higiénico, auto-hipnose, circum-hospitalar, co-herdeiro, infra-hepático, pan-helénico, sobre-humano, super-homem]. Exceção são as palavras que têm os prefixos des e in [desumano, desarmonia, inábil].

2. Se o prefixo ou falso prefixo termina na mesma vogal do que o segundo elemento [auto-observação, anti-inflamatório, arqui-inimigo, contra-almirante, intra-abdominal, proto-orgânico, so...

A insistência cabo-verdiana no erróneo “caboverdeano”

 Associação Caboverdeana de LisboaUnião Caboverdeana (na Noruega), União CaboverdeanaCaboverdeanamente (filme) – são alguns exemplos, recentes e antigos (muitos deles até em textos literários), de um uso incorreto do gentílico de Cabo Verde.

Pergunta:

Pode anestético ser sinónimo de anestésico (=anestesia ou aquilo que produz anestesia)? Alguns dicionários apenas assim o atestam, outros, porém, relacionam-no unicamente com aquilo «que revela falta de estética». Serão acolhidas, em português europeu, ambas as aceções?

Resposta:

         As duas aceções são acolhidas em português europeu. 

      É isso que atesta o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, Editorial Verbo, Volume 1, 2001, na página 242, que reafirma a sinonímia entre os dois termos, remetendo o significado para a falta de sensibilidade e com origem no grego: anestésico [do grego anestesia+-ico], anestético [do grego anaísthetos, «insensível»].

      Apesar da sinonímia, em medicina, está convencionada a utilização de anestésico como substância que diminui ou suprime a sensibilidade física, enquanto em arte, anestético como algo que revela falta de estética. 

Pergunta:

Na frase, «Penso, aliás, que tal intervenção terá de dispor de outras alternativas para além das atualmente existentes, que não são eficazes», o que, na segunda ocorrência, «que não são eficazes», é um pronome relativo ou uma conjunção causal?

Grata pelo esclarecimento.

Resposta:

Pode ter um valor causal, pois a partícula que é substituível pela conjunção porque, ficando a frase com o mesmo sentido: «Penso, aliás, que tal intervenção terá de dispor de outras alternativas para além das atualmente existentes, porque não são eficazes». Trata-se de uma oração subordinada adverbial causal*

Não obstante, poderá, igualmente, ter um valor explicativo: «Penso, aliás, que tal intervenção terá de dispor de outras alternativas para além das atualmente existentes, que não são eficazes», sendo a oração  «que não são eficazes» uma oração subordinada adjetiva relativa explicativa**. Estas, geralmente, são antecedidas pelo pronome relativo «que» e estão entre vírgulas. Para melhor se compreender o que se afirma, poderemos inverter a frase: «Para além das alternativas existentes, que não são eficazes, penso, aliás, que tal intervenção terá de dispor de outras alternativas.». De notar que a oração «que não são eficazes» poderá ser substituída por «ineficazes», um adjetivo. Assim, depende do autor do enunciado desejar dar-lhe um valor causal ou explicativo. 

 

`«A oração causal exprime a razão, o motivo ou o que dá lugar a um facto: É um sábio, porque estudou muito. A oração causal pode equivaler a uma forma infinita: As estrelas parecem pequenas, porque estão muito distantes [= por estarem, etc.]. Obs. : a causa pode também exprimir-se por uma oração adjetiva: Este aluno que estuda sempre as suas lições deve fazer boa figura nas aulas», J. M. Nunes de Figueiredo e A. Gomes Ferreira.

Pergunta:

Qual (e porquê) a construção correta? «Seja qual for o presente, oferece-lo com amor»; «Seja qual for o presente, oferece-o com amor». Eu diria que é a segunda, mas a verdade é que leio cada vez mais casos semelhantes ao da primeira.

Muito obrigado.

Resposta:

     Depende. A forma do sujeito está omissa, apesar de este poder ser identificado através da forma verbal. Se se pretende dizer: «Seja qual for o presente,[tu] oferece-lo com amor», estará correta a frase. Se, por outro lado, se desejar afirmar: «Seja qual for o presente, [ele] oferece-o com amor, também estará correta. Ainda há a possibilidade da contrução «Seja qual for o presente, oferece-o com amor» [no imperativo]. Depende, portanto, do sujeito.

     A explicação é a seguinte: os verbos que terminam em vogal devem ter como pronome oblíquo átono o ou os [se forem masculinos singular ou plural, respetivamente], a ou as [no caso de serem femininos] lo,los, la ou las, se terminarem em consoante e no, na, nos ou nas, se a última sílaba for nasal.

     Esta explicação está presente numa boa gramática, como, por exemplo, a Gramática da Língua Portuguesa, de António Afonso Borregana, Universal, Texto Editores, página 150.