Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Frequentemente leio «vou-te levar», «foi-te buscar»...

Gostaria que me esclarecessem se estas formas estão corretas, pois, no meu entender, não estão. Julgo que, quando um dos verbos é auxiliar, como é o caso do verbo ir, o verbo principal é que levará o pronome.

Resposta:

De facto, tal como a consulente sugere, alguns gramáticos aconselham a ligação do clítico ao verbo principal (no infinitivo ou no gerúndio), como é o caso de Cunha e Cintra1, do que resultariam frases como: «Vou buscar-te» e «[Ele/ela] foi levar-te».

No entanto, o uso tem mostrado que o pronome pode ocorrer ligado tanto ao verbo principal como ao verbo auxiliar (ou semiauxiliar), legitimando as duas formas. Por isso, as estruturas «vou-te levar» e «foi-te buscar» não são incorretas.

1Cunha e Cintra, sobre a colocação dos pronomes átonos, propõem que, «nas locuções verbais em que o verbo principal está no infinitivo ou no gerúndio, pode dar-se sempre a ênclise ao infinitivo ou ao gerúndio» (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 314).

Pergunta:

Exemplos do campo semântico do nome praia.

Resposta:

Tendo em conta que campo semântico corresponde ao conjunto de palavras que se enquadram no leque de sentidos/significados a que determinada palavra está associada ou relacionada, apercebemo-nos de que pertencem ao campo semântico de praia palavras como:

- areia;

- conchas;

- búzios;

- água;

- algas;

- mar;

- rio;

- ondas;

- mergulho;

- nadar;

- peixes;

- bóia;

- chapéu de sol;

- nadador-salvador;

etc.

Pergunta:

Gostaria de saber qual é a forma correta: «As coisas correram melhor do que o que pensava», ou «As coisas correram melhor do que pensava»?

Resposta:

As duas frases propostas estão corretas, embora haja uma certa preferência pela segunda – «As coisas correram melhor do que pensava» –, de forma a evitar-se a repetição de uma estrutura (de um constituinte relativo «o que») semelhante à do conetor de comparação «do que».

Sobre a coocorrência entre o conetor de comparação e os constituintes relativos, Gabriela Matos, em Gramática da Língua Portuguesa (de Mira Mateus et alli, p. 744), diz-nos que «tudo o que se pode afirmar é que há comparativas que incluem no segundo membro de comparação uma relativa, a par de outras comparativas em que não surge qualquer estrutura de relativização. Assim, o conetor de comparação pode (ou não) coocorrer com um constituinte relativo.

A única questão levantada foi a da impossibilidade de flexão do conetor de comparação («do que»), o que implicaria a agramaticalidade de uma frase do tipo *«Comprei mais livros dos que podia ler.» (frase incorreta), o que obriga à presença do constituinte relativo: «Comprei mais livros do que os que poderia comprar.»

Nota: Nas frases apresentadas, encontramo-nos perante um caso de comparativo de superioridade do advérbio bem1 [As coisas correram bem. As coisas correram melhor (= *mais bem) do que pensava], o que implica o emprego de do que (= daquilo que eu pensava), estrutura semelhante à presente em «Comprou um carro menor (mais pequeno) do que precisava».

1 O comparativo de superioridade (anómalo ou especial) melhor (do latim melìor, óris...

Pergunta:

Minha neném nasce essa semana, passei a gestação inteira decidida a colocar Eloísa com E. Na reta final, as pessoas falam que é errado, me tire essa dúvida por favor. Eloísa com E está errado?

Resposta:

O recente Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2009 (referente ao português europeu) é o único vocabulário ortográfico que regista três formas para o nome próprio (antropónimo) – Eloísa (com acento agudo), Eloisa e Heloísa –, o que atesta a coexistência de uma nova grafia a par da que já existia.

No entanto, é de se referir que os restantes vocabulários ortográficos da língua portuguesa – Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras; o Vocabulário Ortográfico do Português, da responsabilidade do lLTEC; e o FLIP – Vocabulário da Priberam – não incluem nomes próprios.

Nota: tal como já foi indicado em respostas anteriores, o Vocabulário da Língua Portuguesa (1966), de Rebelo Gonçalves, que respeitava o estipulado pelo Acordo Ortográfico de 1945, registava uma só forma – Heloísa –, resultante da adaptação portuguesa do nome próprio francês Héloïse, de origem germânica e que se vulgarizou no século XVIII com a publicação do romance de Jean-Jacques Rousseau Julie ou La Nouvelle Héloïse (cf. José Pedro Machado, no seu Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa).

Pergunta:

Referindo duas equipas de futebol, qual a maneira correcta: «os onzes são constituídos...», ou «os onze são constituídos»? Existe onzes?

Resposta:

Se tivermos em conta que onze se encontra registado pelos dicionários, assim como no Portal da Língua Portuguesa (da responsabilidade do ILTEC), como um nome/substantivo masculino — da gíria do futebol, para designar «equipa convocada para um jogo» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora) —, este termo comporta-se como qualquer outro substantivo/nome, o que lhe permite a flexão no plural1. Por isso, no contexto do futebol, e uma vez que designa uma equipa, sempre que há referência a mais do que uma equipa, a forma correta é precisamente:

«Os onzes são constituídos» (= «As equipas são constituídas»).

À primeira vista, pode parecer estranha a flexão de onze, vulgarmente conhecido como um numeral cardinal (classificação da gramática tradicional2), o que o torna invariável3 (tal como a grande maioria dos numerais cardinais). Por isso, importa lembrar que os numerais cardinais (ou quantificadores numerais ) são usados para «designar uma quantidade certa de pessoas ou coisas, caso em que acompanham um substantivo à semelhança dos adjetivos», recaindo a flexão no substantivo a que se referem.

Exemplo: «Os onze alunos fizeram todas as atividades.»

O mesmo se passa nas frases em que se omite o substantivo (casos de elipse do nome/substantivo), estando implícito o valor do numeral, como na frase seguinte: «Os onze [alunos] fizeram o trabalho.»

Trata-se, portanto, de casos diferentes do emprego de onze. Enquanto substantivo/nome (= «equipa de futebol»),