Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Mestre, cumprimentando-o pelo excelente trabalho que vem desenvolvendo em prol do nosso idioma, que lembra a refrega do grande Heráclito Graça contra o sr. Cândido de Figueiredo, in illo tempore, indago-lhe, a fim de esclarecer o meu filho: está errado dizer-se suquinho?

Resposta:

Em nome do Ciberdúvidas, agradecemos as amáveis palavras que nos dedicou, esperando que possamos continuar a (cor)responder às expetativas dos que se nos dirigem.

Relativamente à questão que apresenta, não há dúvida de que o consulente não está errado ao utilizar o termo suquinho, porque é o diminutivo (sintético) da palavra suco (do latim succu-), substantivo/nome masculino sinónimo de «sumo» ou «seiva», «o líquido que se extrai dos vegetais e, também, da carne» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010).

Repare-se que existem os graus aumentativo e diminutivo para os substantivos/nomes, graus estes que se formam com a junção de sufixos (aumentativos e diminutivos) à palavra original. Ora, -inho é um dos sufixos diminutivos atestados pelas gramáticas, a par de -ito, -zinho -zito (cf. Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 199).

Portanto, suquinho, suquito, sucozinho e sucozito  são diferentes diminutivos de suco, formas estas que indicam que «aquele que fala ou escreve põe a linguagem afetiva em primeiro plano [...]», encontrando no sufixo diminutivo um meio estilístico que elide a objetividade sóbria e a severidade da linguagem, tornando-a flexível e amável» (idem).

Pergunta:

Gostaria de saber qual a diferença entre expressões populares e expressões idiomáticas, se possível com exemplos.

Resposta:

António Nogueira Santos, em Novos Dicionários de Expressões Idiomáticas (Lisboa, Sá da Costa, 1988), define expressão idiomática como «forma ou expressão própria de uma língua, impossível de traduzir literalmente noutra de estrutura análoga», o que evidencia a particularidade destas expressões de se tornarem difíceis de traduzir, porque a «frase ou expressão funciona como um todo que normalmente não pode ser entendido de forma literal» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010).

Repare-se que se torna muito difícil explicar a um estrangeiro o sentido de expressões como «apanhar um boné» (sentir-se enganado e desorientado), «descalçar esta bota» (resolver este problema), «à larga» (sem restrições), «onde Judas perdeu as botas» (em lugar distante e incerto), «lamber botas a» (bajular).

Por sua vez, as expressões populares são, tal como o adjetivo popular indica, as que têm origem no povo e estão geralmente associadas às profissões e afazeres que, desde a Idade Média, eram atribuídos a esse grupo social (agricultura, mudanças meteorológicas, ofícios, trabalhos domésticos, etc.) e resultam da sua experiência, a chamada sabedoria popular. Por isso, pertencem às expressões populares os provérbios, os regionalismos, as frases feitas, o calão e a gíria.

Não há dúvida de que o provérbio «Casa de ferreiro, espeto de pau» é, também, uma expressão popular, tal como «Deitar os bofes pela boca» (estar estafado, com a respiração ofegante) e «Lamber os beiços» (saborear, apreciar com bastante agrado),...

Pergunta:

Gostaria de saber se a palavra gado pode ser considerada um nome coletivo.

Resposta:

Gado é, de facto, um nome coletivo, pois representa «um conjunto de [...] entidades do mesmo tipo» (Dicionário Terminológico), o que se pode verificar pela atestação da palavra no Dicionário de Nomes Coletivos (Lisboa, Publicações Europa-América, 2006), de Fernanda Carrilho, pois designa um coletivo de «animais de médio e grande porte utilizados para fins diversos (bois, carneiros, cavalos...); animais do campo», mas o termo tem sido usado, também, popularmente, com caráter depreciativo para referir «pessoas insubmissas e indisciplinadas» e «prostitutas».

Pergunta:

Como classifico as palavras Oriana e promessa quanto à acentuação?

Resposta:

Nas duas palavras, a sílaba tónica recai na penúltima silaba, como se pode verificar através da respetiva divisão silábica:

O-ri-a-na e pro-mes-sa.

Trata-se, portanto, de palavras graves ou paroxítonas.

Nota: Embora os dois ss de promessa correspondam a um só som, o que deveria implicar que não ficassem separados na divisão silábica, a realidade é que, segundo a norma, «as consoantes iguais se separam obrigatoriamente» (como se se tratasse de uma translineação).

Pergunta:

Na frase «Falaram aos alunos», «aos alunos» tem a função de complemento indireto, ou oblíquo? Já vi as duas versões.

Resposta:

Quando há dúvidas, deve utilizar-se os testes para identificação das funções sintáticas. Assim, relativamente ao complemento/objeto indireto (cf. Mira Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho, 2003, p. 290):

1) Pode substituir-se o constituinte com a relação gramatical de objeto indireto pela forma dativa do pronome pessoal (-lhes):

a) «Falaram aos alunos.» (ob. ind.)

b) «Falaram-lhes.» (ob. ind.)

2) Pode formular-se uma interrogativa sobre o constituinte objeto indireto segundo o esquema A quem/A que é que SU V (OD)?, consoante se trate de um argumento, constituindo o objeto indireto a resposta mínima não redundante:

c) P: «A quem é que falaram?»

    R: [«Aos alunos»] (ob. ind.)

Perante estes testes, verifica-se que a expressão «aos alunos» (que se pode substituir pelo dativo correspondente e que é a resposta para a pergunta «a quem?») tem as propriedades típicas do objeto/complemento indireto.

De qualquer modo, e para que não haja razões para incertezas, importa fazer os testes de identificação do complemento/objeto oblíquo (cf. Dicionário Terminológico) que é «selecionado pelo verbo e [...] pode ter uma das seguintes formas:

– grupo preposicional que não é substituível pelo pronome pessoal na sua forma dativa (