Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Qual das seguintes formas consideram ser a correta: higro-regulável, ou higrorregulável?

Nenhuma delas consta do Vocabulário Ortográfico Português (Portal da Língua Portuguesa) ou do Dicionário da Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico (Infopédia/Porto Editora).

Resposta:

Se tivermos em conta o previsto na Base XVI («Do hífen nas formações por prefixação, recomposição e sufixação) do Acordo Ortográfico de 1990, apercebemo-nos de que esse termo não deve ser hifenizado, porque o segundo elemento não começa por h nem pela mesma vogal com que termina hidro-. Por isso, a sua forma é aglutinada: hidrorregulável.

De facto, esta palavra não se encontra contemplada no Vocabulário Ortográfico do Português (do ILTEC) nem no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Porto Editora, assim como no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras. Mas o próprio Acordo Ortográfico é explícito1 em relação a estas formações com hidro-.

1 O ponto 1 da Base XVI diz o seguinte: «Nas formações com prefixos (como, por exemplo: ante-, anti-, circum-, co-, contra-, entre...

Pergunta:

Gostaria de saber qual o tipo de erro que estou a cometer, se eu escrever «afim de que», ao invés de «a fim de que». Dei com esse erro, penso que recorrente, na alínea f) do número 6 da base XV do novo Acordo Ortográfico e gostaria de saber de que tipo de erro se trata. Ortográfico, não me parece; gralha, também não.

Resposta:

O seu erro deve-se, decerto, ao facto de escrever a locução conjuntiva subordinativa final1 (terminologia da gramática tradicional) «a fim de que»2 por influência de «afin que3», a locução conjuntiva francesa correspondente, em que, nesta, sim, a forma «afin» é aglutinada.

Ao escrever a forma afim (Vocabulário Ortográfico do Português, da responsabilidade do ILTEC), a consulente está a usar não a locução (ou conetor) mas um substantivo/nome [que designa «parente por afinidade» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora)] ou um adjetivo [como o significado de «semelhante; próximo; que tem afinidade» (idem)], cujos sentidos são diferentes do da expressão de fim. São exemplos:

«Vieram parentes e afins.»

«Faro e Olhão são cidades afins.»

«Nós estudamos a fim de termos boas notas.»

«Nós estudamos a fim de que possamos terminar o curso.»

1 Cunha e Cintra, ...

Pergunta:

Qual é a forma correcta: «Se eu não te vir», ou «Se eu não te ver»?

Resposta:

A forma correta é «Se eu não te vir».

Como se trata de uma frase condicional, em que é evidente a ideia de eventualidade no futuro, o verbo deve estar no futuro do conjuntivo1. Ora, embora essa forma verbal possa parecer quase idêntica à do infinitivo (ver), não as devemos confundir.

1 O futuro do conjuntivo do verbo ver: vir, vires, vir, virmos, virdes, virem (coincidente com o infinitivo pessoal do verbo vir).

Pergunta:

«Eles tornaram-se inseparáveis.»

Na frase acima, posso considerar inseparáveis predicativo do sujeito?

Se assim for, o predicado será verbo-nominal, como de resto defendem Celso Cunha e Lindley Cintra?

Resposta:

O verbo tornar-se é um dos verbos copulativos1 (Mira Mateus et alii, Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho, 2003, p. 302), «também denominados predicativos, de cópula ou de ligação», razão pela qual a análise da frase é a seguinte:

Sujeito: «Eles»

Predicado: «tornaram-se inseparáveis»

«Inseparáveis»: predicativo do sujeito

Nota: Diferente é o caso do verbo resultativo tornar, que «entra na construção transitiva-predicativa» (idem, p. 297), o que significa que seleciona complemento direto e predicativo de complemento direto. Exemplo: «A falta de preparação tornou a reunião improdutiva.»

1 Os verbos copulativos determinam o seguinte esquema relacional: SU (sujeito) V (verbo) PRED (predicativo do sujeito). Inês Duarte apresenta a seguinte «lista exemplificativa de verbos copulativos: andar, continuar, estar, ficar, parecer, permanecer, revelar-se, ser, tornar-se» (idem, p. 302). Cunha e Cintra classificam-nos, também, como verbos copulativos ou de ligação (

Pergunta:

É correta a designação «sé catedral»? Sendo expressão aceitável, trata-se de um pleonasmo, uma vez que ambas são referentes ao lugar da cadeira do bispo?

Parabéns pelo excelente trabalho e pela partilha.

 

Resposta:

De facto, só tem o estatuto de sé uma igreja episcopal ou patriarcal, o que lhe confere o atributo de catedral [cátedra + al], igreja onde se encontra a cátedra do bispo.

Por isso, não há dúvida de que a estrutura «sé catedral» é um caso de pleonasmo de que não nos apercebemos facilmente, de tal forma esta designação está consagrada pelo uso. A redundância só se torna evidente com a análise do significado de cada um dos termos.

Agradecemos as palavras simpáticas de apreço pelo Ciberdúvidas.