Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Os seguintes prenomes estariam de acordo com a ortografia atual da língua portuguesa: Susana, Marisa, Isilda, Isildinha, Ivã, Argemiro?

Muito obrigado.

Resposta:

O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (AO90) não altera nenhum dos nomes próprios apresentados, assim como mantém a grafia dos antropónimos portugueses. Os casos de alteração referem-se a nomes próprios derivados de antropónimos estrangeiros, como se pode verificar nas indicações da Base I — «DO ALFABETO E DOS NOMES PRÓPRIOS ESTRANGEIROS E SEUS DERIVADOS» —, estando tais alterações associadas, sobretudo, à inclusão das letras k, w e y  ao alfabeto de língua portuguesa, às combinações gráficas ou sinais diacríticos invulgares à nossa grafia e aos casos das consoantes finais b, c, d, g e h. Para que não haja dúvidas, importa citar as partes (2.º, 3.º, 4.º  e 5.º da Base I) do texto do AO que se referem a antropónimos:

2. As letras k, w e y usam-se nos seguintes casos especiais: a) Em antropónimos/antropônimos originários de outras línguas e seus deriva­dos: Franklin, frankliniano; Kant, kantismo; Darwin, darwinismo; Wagner, wagneriano; Byron,

Pergunta:

O Acordo Ortográfico de 1990 removeu os hifens de "dona-de-casa"? Em caso afirmativo, qual a regra geral que vigora em casos como este?

Resposta:

De facto, o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 90 (AO 90), na Base XV — «Do hífen em compostos, locuções e encadeamentos vocabulares» —, retira o uso do hífen nas locuções (salvo raras excepções), como se pode verificar no 6.º:  «Nas locuções de qualquer tipo, sejam elas substantivas, adjetivas, pronominais, adverbiais, prepositivas ou conjuncionais, não se emprega o hífen, salvo algumas exceções já consagradas pelo uso (como é o caso de água-de-colónia, arco-da-velha, cor-de-rosa, mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa).  Sirvam, pois, de exemplo, de emprego sem hífen as seguintes locuções:

a) Substantivas: cão de guarda, fim de semana, sala de jantar;
b) Adjectivas: cor de açafrão, cor de café com leite, cor de vinho; [...]».

 

Portanto, e uma vez que não faz parte das excepções assinaladas, a forma correcta é dona de casa.

Refira-se, porém, que, antes da aplicação do AO 90, dona de casa também não se hifenizava, como se pode verificar no Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, e no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (ver na respectiva subentrada, incluída no verbete de dona).

Pergunta:

Aquando da final do programa televisivo Ídolos, ganho por uma mulher, a concorrente Sandra, houve uma expressão muito pronunciada pelos apresentadores que me deixou com o bichinho atrás da orelha. A expressão foi a seguinte: «Sandra é o novo ídolo de Portugal.» Esta expressão foi várias vezes repetida e sempre me soou estranha. De acordo com as regras de concordância da língua portuguesa, o correcto não seria «Sandra é a nova ídolo de Portugal?» Tal como dizemos «Maria é a nova presidente» e não «Maria é o novo presidente», vinha perguntar se o meu raciocínio está correcto, ou se este caso é uma das excepções na nossa magnífica língua…

Numa segunda abordagem desta questão, e após ter feito algum trabalho de análise, verifiquei que a palavra ídola está dicionarizada [...]. Poderá por conseguinte a forma mais correcta não ser nenhuma das anteriores, mas, sim, «Sandra é a nova ídola de Portugal»?

Resposta:

Pode parecer paradoxal, mas não encontrámos o termo ídola em nenhum dos dicionários1 com a indicação de que designaria o feminino de ídolo, tal como sucede com outras palavras registadas como «feminino de» determinado nome masculino. Não será, decerto, por acaso que os significados das entradas de ídolo evidenciam a generalização do conceito, retirando a especificidade do sexo: «imagem (estátua, figura, objecto) a que é prestado culto como a uma divindade»; «pessoa famosa que é objecto de culto»; «pessoa a quem se tributa grande veneração»; «pessoa que se considera um modelo a seguir»;«pessoa por quem se tem grande admiração ou adoração, a quem se prestam homenagens, em especial, artista de cinema ou teatro, cantor, desportista a quem o público dedica muita estima ou consideração».

Em pesquisa no Vocabulário Ortográfico do Português e no Lince – conversor para a nova ortografia  — recursos oficialmente adoptados pelo Estado português), ambos desenvolvidos pelo Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC) —, verificámos que «ídola não se encontra registada», sendo fornecidas as seguintes sugestões: «ídolo (nome) […], ídolos (do substantivo ídolo)». Assim, ídolo está atestado da seguinte forma, destacando-se as  informações a nível da flexão (somente a formação do plural):

« í•do•lo
nome masculino
Singu...

Pergunta:

Qual a origem do nome Simões?

Resposta:

Segundo o Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa (2003), de José Pedro Machado, o apelido Simões deriva «do latim tardio Simonici, patronímico1 de Simão» [que, por sua vez, tem origem no «latim Simō, ōnis, ou Simōn, ōnis, nome de  Simon Petrus, São Pedro, e de outras personalidades» (idem)]. O primeiro registo de Simoiz surge em 1220 em Inquisitiones (pp. 24, 161, 205); em 1265 (Johan Simões», em Portel, n.º 15, p. 23); em 1324 («Pero Symōoez», em Descobrimentos Portugueses, I, p. 46). Acrescenta Machado (idem): «O D[iário de] N[otícias] de 21-X-1978, p. 13, registou o nome do Sr. Simões Rosa Calado, como antr[opónimo], portanto. Por outro lado, em Antr[oponímia Portuguesa] [de José Leite de Vasconcelos, Lisboa, 1928], lê-se: "Sei de um indivíduo que tem o apelido Simões, isto é, que se chama F. de tal Simões, embora o pai se chamasse F. de tal Simão.[...]"»

1 Patronímico («do grego patrōnymikós, é, ón, “tirado do nome pai”»): o nome (antroponímico) «formado do nome do pai ou de nome de ascendente» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2009) ou «que derivou do nome dos pais e que é comum a todos os descendentes de uma pessoa de família» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010).

Pergunta:

Tenho dúvida quando ouço a expressão "mensalidade anual". Penso que o termo mensalidade se refere a mês. Ouvi falar que mensalidade pode se referir a algo periódico, não sendo necessariamente mensal, de forma que mensalidade poderia ser anual. Para mim fica esquisito.

Isto é correto?

Resposta:

Não há dúvida de que o uso que se vai fazendo da língua é fruto de um determinado número de situações em que as palavras vão perdendo o seu valor original, porque os falantes as utilizam, adaptando-as a outras realidades que têm uma certa proximidade semântica.

De facto, tal como a consulente considera, o termo mensalidade refere-se a «qualidade que é mensal; quantia que se paga ou recebe por mês; verba que se paga todos os meses; prestação; mesada» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010); «carácter ou condição do que é mensal; quantia em dinheiro que se dá ou se recebe referente a um mês; importância que se paga (por ex., a uma instituição) referente ao período de um mês» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2009).

Aliás, bastar-nos-á termos em conta a etimologia da palavra para que não haja qualquer réstia de dúvida: mensalidade = mensal + -i + -dade. Ora, mensal significa «relativo a mês; que acontece, que se realiza uma vez por mês (reunião mensal); que é avaliado, determinado de mês a mês (temperatura média mensal); que aparece uma vez por mês (publicação mensal); que se deposita, se paga ou se recebe a cada mês (factura mensal)» (idem).

Estranha-se, por isso, que seja utilizada a expressão «mensalidade anual», o que pressupõe a mistura de duas realidades temporais distintas: a do mês e do ano. Um outro motivo de estranheza deve-se ao facto de existir um termo — anuidade — que designa, precisamente, «quantia que se paga anualmente a uma instituição; importância que um devedor deve reembolsar anualmente a um credor para amortizar uma dívida ou os juros de um empréstimo» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, ob. cit.); «pagame...