Pergunta:
Gostaria de saber qual a função sintáctica desempenhada pela expressão «Muitos mortos» na frase «Muitos mortos houve, entre eles D. Sebastião, na batalha de Alcácer-Quibir». Será sujeito nulo expletivo? Será complemento directo?
Agradeço desde já a vossa atenção e disponibilidade.
Resposta:
«Muitos mortos» é o complemento directo da frase «Muitos mortos houve», e não sujeito, pois o verbo haver é impessoal (na acepção de «existir»). Segundo a gramática tradicional, os verbos impessoais, usados invariavelmente na 3.ª pessoa do singular, não têm sujeito (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, 13.ª ed., Lisboa, Sá da Costa, 1997, p. 447).
Para além da especificidade deste tipo de verbo, é de referir que todo o verbo/predicado concorda com o sujeito da frase (quando o há) e, neste caso, não há dúvida de que não há qualquer legitimidade numa hipotética classificação de «muitos mortos» como sujeito de «houve».
Uma vez que a consulente faz referência ao sujeito nulo expletivo, importa lembrar a especificidade deste conceito, pois não pode ser confundido com a função de «muitos mortos». Segundo o Dicionário Terminológico, sujeito nulo é aquele que «não tem realização gramatical», e nos casos em que o «sujeito nulo pode não ter qualquer interpretação, como em (iii), [é] designado de expletivo:
(iii) [-] Choveu muito. [-] Há neve naquela montanha.»
No âmbito da investigação linguística actual, surge a noção de sujeito expletivo (também denominado gramatical, aparente ou vazio) para os casos em «que, noutras línguas, têm realização gramatical, marcando posição em construções com verbos impessoais (compare-se Chove torrencialmente com It rains cats and dogs), com verbos de elevação (compare-se Parece que o João já chegou com It seems John has already arrived), com sujeitos frásicos extrapostos (compare-se Surpreende-me que o João tenha chegado atrasado com It surprises me that Jonh came late) e em construções existenciais (compare-se...