D´Silvas Filho - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
D´Silvas Filho
D´Silvas Filho
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D´Silvas Filho, pseudónimo literário de um docente aposentado do ensino superior, com prolongada actividade pedagógica, cargos em órgãos de gestão e categoria final de professor coordenador deste mesmo ensino. Autor, entre outros livros, do Prontuário Universal — Erros Corrigidos de Português. Consultor do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pelo autor
Angola e o Acordo Ortográfico

«Ficar à espera que "Angola ratifique, para então mudar, quando Angola espera mudanças para então ratificar" pode converter-se num círculo vicioso que só pode ser defendido por quem não quer mudar nada», escreve D'Silvas Filho, em texto colocado na sua página pessoal – a propósito de um publicado no Jornal de Angola, no dia 15/04/2017.

Pergunta:

Gostaria de saber se o uso das terminações -ita em Portugal e -ite no Brasil em palavras como malaquita/malaquite é uma regra consistente. Por exemplo, se vejo um mineral referido apenas como caulinita sem referência ao termo caulinite, posso ainda assim deduzir que no Brasil o termo correto seria caulinite, ou trata-se de uma prática casuísta, em que cada termo terá uma terminação (malaquite, mas caulinita, por exemplo)?

Muito obrigado.

Resposta:

O Dicionário Aurélio, brasileiro, só tem malaquita e caulinita, mas a Academia Brasileira de Letras regista para o novo Acordo Ortográfico malaquita e malaquite, caulinita e caulinite.

Em Portugal, o idóneo Houaiss regista também as duas formas em ambos os vocábulos, mas remete sempre as terminações –ita para –ite, depreendendo-se que –ite., neste caso, é preferencial.

Em suma, quer em Portugal quer no Brasil, pode no AO90 usar ambas as terminações nos dois vocábulos.

No entanto, uma análise mais profunda permite concluir que -ite é recomendada para nomes de uso comercial (ex.: grafite), explosivos (ex.: dinamite), medicina (ex.: bronquite), etc. Enquanto -ita é recomendada em gentílicos (ex.: israelita), palavras greco-latinas (ex.: eremita), etc.

Em mineralogia, está mais divulgada em Portugal a terminação –ite (ex.: antracite, grafite). Ora, quer malaquite quer caulinite são ambos vocábulos da mineralogia, logo isso justifica a pref...

Acordos Ortográficos imperfeitos não são sagrados

Artigo do autor, publicado na sua página pessoal e no Pórtico da Língua Portuguesa, da Academia da Ciências de Lisboa (ACL), constante da sua intervenção no colóquio Encontro de Profissionais da Escrita (sobre a adoção do Acordo Ortográfico em Portugal) – com a gravação vídeo aqui e aqui –, realizado em Lisboa, no dia 9 de março de 2017.

Pergunta:

O que aconteceu neste século para agora se escrever 2016/2017, e no século passado escrevia-se p.ex. 1998/99? Há regra, ou foi só bagunça do ano de transição 1999/2000?

Resposta:

As justificações que pessoalmente posso dar, senhora Professora, são mais do domínio psicológico que do linguístico.

No meu entender, temos uma grafia mais perfeita quando não abreviamos a representação dos anos. Acontecia, porém, que, em 1998/99, a abreviatura 99 era imediatamente apreendida pelo intelecto como significando 1999, porque o número 99 só podia ser uma abreviatura desse ano, no conjunto.

Já o mesmo não se passava em, por exemplo, 2002/03. De facto, lembremo-nos de que a norma de representação numérica das datas recomenda a seguinte ordem: ano/mês/dia (ex.: 2017/02/11). Então, em 2002/03, não estaríamos a representar março de 2002? O problema terá surgido logo no início do milénio e terá ficado o hábito de não abreviar no biénio, ...mas, inversamente, talvez tivesse sido para evitar a “bagunça”.

No conjunto em causa, 2016/2017, pode presentemente usar já a abreviatura 17 do ano 2017, porque 17 é superior a 12, número máximo de meses, e escrever: 2016/17; mas eu só usaria a abreviatura em 2032, para certeza de não haver nenhuma dúvida.

Noto que, quando se consideram dois anos, prefiro: biénio de 2016-2017. Com um hífen, aditivo (e); e não com a barra, que é disjuntiva (ou). Sublinho, porém, que, nesta minha preferência, já estamos no domínio das subtilezas que nos oferece esta nossa língua.

Ao seu dispor,

Pergunta:

Num exercício questionam se se escreve «uva passa» ou uva-passa, já procurei em vários locais designadamente em dicionários e a indicação nuns é de uma forma e de outros noutra, será que me podem auxiliar com indicações precisas é possível referenciação?

Obrigado.

Resposta:

O composto uva-passa não figura nos vocabulários presentemente considerados oficiais: Vocabulário do ILTEC (VOP) e Vocabulário Comum (VOC).

Parecer pessoal:

Eu escrevo uva-passa. Repare-se que, quando escrevemos a frase: «esta é um modelo de escola», estamos em presença de uma locução (palavras no sentido real, logo sem hífenes), qualificando essa escola como distinta do outras; mas se escrevermos uma escola-modelo, a atitude é diferente, pois o composto fica com um sentido especial, conotativo (dado pelo hífen) de a escola servir como modelo comparativo.

Passa-se um caso semelhante em uva-passa. O sentido do composto também é especial (dado pelo hífen), aparente do real das palavras. Na realidade, não se trata de uma uva que seja passa, porque já não é uva, mas de uma passa de uva (esta também uma locução, sem hífenes); e passa que, na forma uva-passa pode ter um sentido conotativo, simbólico.

Ao seu dispor,