D´Silvas Filho - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
D´Silvas Filho
D´Silvas Filho
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D´Silvas Filho, pseudónimo literário de um docente aposentado do ensino superior, com prolongada actividade pedagógica, cargos em órgãos de gestão e categoria final de professor coordenador deste mesmo ensino. Autor, entre outros livros, do Prontuário Universal — Erros Corrigidos de Português. Consultor do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de entender o porquê das regras de acentuação para paroxítonas.

Resposta:

Como existe tendência na língua para a paroxitonia, poder-se-ia esperar que estas palavras não precisassem de acento e que este ficaria reservado para as oxítonas e para as proparoxítonas.

A verdade, porém, é que há muitas palavras, sem nenhum acento, que são pronunciadas como oxítonas. Por exemplo, sem outro sinal ortográfico, são oxítonas as palavras que terminam em: -l, -n, -ps, -r, -x, -ã, -ãs, -ão, ãos, -ei, -eis, -i, -is, -um, -uns, -us. Assim, palavras paroxítonas com estas terminações, precisam de ser acentuadas para que não sejam oxítonas (ex.: amável, éden, fórceps, almíscar, tórax, órfã, órfãs, órgão, órgãos, hóquei, amáveis, beribéri, bílis, fórum, fóruns, húmus; têxtil, cânon, âmbar, pulôver, bômbax, zângão, zângãos, têxteis, dândi, dândis, ânus). Também se acentuam alguns casos particulares de paroxítonas como: pôde, pára, péla/s, pólo/s, pêro/a, etc.

Ao seu dispor,

Pergunta:

A professora de minha filha da quarta série disse que as palavras: chapéu, fiéis, anéis são oxítonas.

Eu li em várias gramáticas que essas palavras, quanto à acentuação grafica, são ditongos abertos. E as oxítonas acentuadas são terminadas em: -em, e, o, a, seguidas de -s ou não.

Está correta a correção da professora? Isso não vai deixar minha filha confusa na quinta série?

Devo falar com a professora?

Resposta:

A senhora professora tem razão; papéis, fiéis, anéis são acentuadas.

É facto que são `oxítonas acentuadas´ as palavras terminadas em -em, -e, -o, -a, como indica (ex.: Belém, boné, paletó, acolá, português, robô, etc.). No entanto, a regra não é exclusiva: são também acentuadas as palavras oxítonas terminadas em -éis, -éu/s, -ói/s, -ens (ex.: anéis, chapéu/s, remói/s, manténs).

Quanto a em, ens, repare que a regra não se aplica às palavras monossilábicas (ex.: sem, tens). Note ainda que há palavras oxítonas acentuadas noutras letras (ex.: atraí). Fixarmo-nos numa regra ortográfica para generalizar, é arriscado na complexidade…

Finalmente, permito-me sublinhar que ei (bem como eu, oi) pode ter um som fechado, predominante sem o acento (ex.: andei ¦êi¦, comeu ¦êu¦, foi ¦ôi¦). Se não acentuássemos, por exemplo fiéis, em vez do plural de fiel estaríamos em presença da flexão do verbo fiar: `que vós fieis´.

Tudo isto que acabo de escrever é que poderá baralhar o espírito da sua filhinha. Deixe a senhora professora ir por partes. É a melhor maneira…

Ao seu dispor.

Pergunta:

Dúvida que surgiu com o esclarecimento de "biopsia" (pronuncie-se biopsía). Bom, se o Dicionário Aurélio registra a forma "biópsia", então a forma "biótipo", registrada por ele estaria certa?

Atenciosamente.

Resposta:

É muito interessante a sua dúvida. Permite algumas reflexões irreverentes.

Efectivamente, os vernaculistas recomendam biopsia ¦pssía¦, por obediência ao som do étimo (Vocabulário da Academia das Ciências de Lisboa, Rebelo Gonçalves, dicionários: Editora, Universal da Texto). Julgo, porém, não errar muito se disser que mais de cinquenta por cento dos médicos em Portugal pronuncia ¦bió¦ (como proparoxítona aparente). E julgo que será também este o motivo por que o excelente dicionário brasileiro Aurélio já apresenta a grafia `biópsia´, como variante fónica de biopsia.

Quanto a biótipo, neste caso a pronúncia correcta é mesmo como proparoxítona. Ora acontece que, neste termo, grande parte das comunidades cultas, quer em Portugal quer no Brasil, pronuncia ¦biotípo¦, como paroxítona (Aurélio indica que biótipo é a grafia correcta, mas que se usa correntemente `biotipo´ no Brasil).

Há entre biopsia e biótipo uma curiosa indiferença das comunidades cultas pelas recomendações dos vernaculistas, parecendo até serem `do contra´, como diz o povo. Em biopsia, preferem a palavra esdrúxula, quando não o devia ser; em biótipo, que devia ser esdrúxula, não a aceitam assim, e preferem-na grave.

É um fenómeno semelhante ao que se passa com termóstato, grafia correcta, que se transformou em `termostato´ entre os técnicos; é igualmente um fenómeno semelhante ao azimute, que já ninguém pronuncia ¦zí¦ e ao míope que ninguém diz ¦mió¦… Enquadra-se na polémica entre Cleópatra e `Cleopatra´, entre Heraclito e `Heráclito´... Deixa alguma dúvidas sobre a indispensabilidade de acentuação das proparoxítonas.

Qual o meu conselho? Na...

Pergunta:

Gostaria de pedir-lhes que me respondessem à questão sobre a reforma ortográfica, mas enfocando uma "reforma gramatical", na qual as formas correntes no Brasil, como o uso indistinto da próclise, possam ser admitidas como corretas. Gostaria de saber a posição dos senhores a respeito; afinal, é correto dizer que 150 milhões de brasileiros falam erroneamente? Melhor não seria liberar a posição pronominal, para que ficasse ao gosto do usuário?

Resposta:

O novo acordo ortográfico, como o nome indica, preocupa-se exclusivamente com a vertente ortográfica da Língua.

É facto/fato que as regras gramaticais não coincidem nos dois lados do Atlântico, nomeadamente no vocabulário, mas as diferenças não são assim tantas. Repare que uma das gramáticas mais prestigiadas em Portugal é a do brasileiro Celso Cunha (com a colaboração de Lindley Cintra).

Na minha modesta opinião, se é necessária alguma uniformização na ortografia (não fazem, por exemplo, sentido diferenças do tipo comummente ou escuteiro), na gramática deve atender-se aos hábitos linguísticos peculiares da comunidade culta respectiva. Para mim, a linguagem que obedeça à norma aprovada no Brasil é tão correcta na nossa comum língua, como a que obedeça a norma aprovada em Portugal.

Uma Língua é constituída por todas as suas variantes e um património social, independente dos seus falantes, não é?

Ao seu dispor.

Pergunta:

Diante de uma dúvida que dividiu as opiniões entre o nosso grupo, gostaria de saber se a palavra PETROBRAS deve ser acentuada, mesmo se tratando de uma sigla.

Grato pela atenção dispensada.

Resposta:

No meu entender, PETROBRÁS é um acrónimo e não uma sigla.

Em sentido estrito, sigla (do latim `sigla´, abreviatura) é uma letra isolada, que representa uma palavra inteira, da qual é a inicial. Por exemplo, a sigla (conjunto de siglas) do agrupamento de palavras `Estados Unidos da América´, será, em Portugal, EUA. Modernamente, nas siglas não se põem pontos depois das letras, contrariamente ao que é hábito nas abreviatura de nomes (ex.: Silvas Filho: S.F.).

Acrónimo (do grego `ákron´, extremidade, + `ónyma´, nome) é um vocábulo formado pelas letras iniciais ou sílabas de várias palavras, que se pronuncia como uma palavra normal; o que é o caso deste agrupamento de letras. Trata-se de vocábulo que, embora não registado no Aurélio, é o nome duma empresa.

Se for «PETROBRAS» (sem acento) a designação desejada pela empresa e se é assim que o nome está registado, a maneira correcta de pronunciar o vocábulo, de acordo com a tendência da Língua, é ¦petróbrâs¦, paroxítono.

Penso que se deve pôr o acento gráfico: PETROBRÁS, para que a acentuação tónica seja de vocábulo oxítono: ¦petrobrás¦. Repare que acentuamos petrodólares, um vocábulo já registado no nosso comum léxico.

Ao seu dispor.