Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual é o gentílico da Lusácia, região europeia situada entre Alemanha, Polônia e Chéquia?

Tenho encontrado lusácio em diversos sítios da Web, mas estes nem sempre são confiáveis; o Portal da Língua Portuguesa acolhe o vocábulo, mas não o define; além do que os dicionários por mim consultados não consignam a palavra em apreço, daí a minha dúvida persistir.

Muito obrigado.

Resposta:

Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) da Academia Brasileira de Letras regista lusácio, como adjectivo e substantivo, e lusaciano, apenas como adjectivo. O VOLP da Porto Editora tem apenas lusácio, adjectivo e substantivo. O Vocabulário da Língua Portuguesa do ILTEC consigna só lusácio, mas também como adjectivo e substantivo. Embora nenhum destes vocabulários ortográficos defina estas palavras como gentílicos da Lusácia, obviamente que o são.

Pergunta:

O que significa o provérbio «Uma figa há em Roma, para quem lhe dá e não toma» e de onde vem?

Resposta:

Encontro uma variante do provérbio em causa no Dicionário de Provérbios de Madeira Grilo (edição do autor e do município de Pinhel, 2009):

«Uma figa há em Roma, para quem lhe dão e não torna.»

Significa que «há sempre um gesto de repúdio para os que recebem benesses e não voltam para demonstrarem gratidão.»

Sobre a origem, nada de concreto me foi possível apurar. Lembro apenas que uma figa é um gesto e um amuleto de repúdio, feitos «com o intuito de esconjurar alguém ou afastar o azar» (Dicionário Houaiss).

Pergunta:

Surgiu-me uma dúvida específica relacionada com a mesóclise e a anteposição do pronome reflexo após uma conjunção ou locução conjuncional.

Em «... pelo que me agrada mais esta solução», a opção é evidente, mas numa situação de mesóclise, qual a opção mais correta?

«... pelo que inclinar-me-ei perante a vossa decisão.»

«... pelo que me inclinarei perante a vossa decisão.»

Obrigada.

Resposta:

Numa oração subordinada, um pronome clítico passa sempre a anteceder o verbo, mesmo que este esteja no futuro simples do indicativo ou no condicional (futuro do pretérito no Brasil). A forma correcta é, portanto:

«... pelo que me inclinarei perante a vossa decisão» (com verbo no futuro simples ou do presente).

Pergunta:

O imperador romano Publius Helvius Pertinax deveria ter o seu nome aportuguesado como Públio Hélvio Pertinax, formas adotadas pela Wikipédia, ou deveria ser Públio Hélvio Pertinaz, como cuido, aportuguesando-se bem o último nome? Aliás, é de se perguntar se já houve no passado, entre nós, o aportuguesamento Pertinaz.

Muito obrigado.

Resposta:

O nome do imperador em apreço deve ser aportuguesado como Pertinaz, antropónimo masculino registado por Rebelo Gonçalves no seu Vocabulário da Língua Portuguesa (1966) e no Índice de Nome Próprios Latinos e Gregos (Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1995), de Maria Helena Prieto e Abel do Nascimento Pena.1 Assinale-se que, no âmbito das línguas românicas, o italiano também traduz o nome como Pertinace (ver artigo da Wikipédia em italiano).

Convém, no entanto, alertar que em obras de carácter historiográfico publicadas em Portugal, ocorre a forma latina, Pertinax. Do mesmo modo, no Dicionário Prático Ilustrado Lello (1959) e no Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa (2003), de José Pedro Machado, emprega-se a forma latina sem alteração.

1 Agradeço ao Doutor Rodrigo Furtado a indicação destas duas referências.

Pergunta:

Minha dúvida refere-se ao infinitivo gerundivo (preposição a + infinitivo). Não encontro nenhuma regra específica a ele e por isto recorro a vocês. Em uma sentença, se optar por usar gerúndio, eu posso (pelo menos, eu acho que posso) aplicar tanto ênclise quanto próclise para terceira pessoa feminina de verbos transitivos indiretos («fazendo-a» ou «a fazendo»). O que acontece se, em vez de «a fazendo», eu resolver usar o infinitivo gerundivo ao invés do gerúndio, mantendo a próclise: «a a fazer» «à fazer»? Há alguma informação na gramática acerca disto? Imagino que a construção destrua o sentido, mas fiquei curioso.

Obrigado.

Resposta:

O pronome pessoal clítico a (3.ª pessoa singular, género feminino) fica em ênclise, justamente para evitar a contracção (crase) com a preposição a: «a fazê-la».