Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual é o gentílico da Filadélfia, primeira capital dos Estados Unidos da América? E o gentílico da (ou de?) Filadélfia, antiga cidade da Lídia, na Ásia Menor?

Muito obrigado.

Resposta:

Em relação à cidade norte-americana, podem ser usados os gentílicos filadelfiense e filadelfiano. O primeiro encontra-se registado no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, e na versão em linha do Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Filadelfiano tem entrada no Vocabulário da Língua Portuguesa (1966), de Rebelo Gonçalves, e nos novos vocabulários ortográficos publicados em Portugal: a forma ocorre sem comentários no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) da Porto Editora; e tem indicação de que diz respeito a Filadélfia, sem identificação de que cidade se trata, no Vocabulário Ortográfico do Português do ILTEC.

Contudo, fildelfiano é vocábulo ausente do VOLP da Academia Brasileira de Letras, que acolhe apenas filadelfiense e filadelfense, formas que a lexicografia brasileira define como gentílicos, respectivamente, de Filadélfia, em Tocatins, e Filadélfia, na Bahia (cf. Dicionário Houaiss).

Quanto a Filadélfia, na Lídia, na actual Turquia, o gentílico que se lhe atribui é filadelfeno (cf.

Pergunta:

"Heraldo", "Eraldo", ou "Haraldo"? Qual é a forma correta? Quais são a etimologia e o significado?

Muito obrigado.

Resposta:

Heraldo é a forma registada por Rebelo Gonçalves no Vocabulário da Lingua Portuguesa, de 1966. Sobre a origem deste nome, transcrevo o que diz José Pedro Machado, no seu Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa:

«[...] do fr. Hérard (com as var. Héraud, Hérault, etc.), de origem germânica, heri-, var. de hari-, "exército", e hard, "duro, forte". Por vezes aparece escrito, erradamente, Eraldo [...].»

Machado não acolhe a forma Haraldo, que parece simples adaptação do inglês Harald, este, por sua vez, variante escandinava e alemã de Harold (português, Haroldo), de Hereweald, de here, "exército", e weald, "chefe, líder" (cf. Behind the Name).

"Eraldo" é, portanto, forma incorrecta.

Pergunta:

Gostaria de saber se a palavra (ou as palavras) "publi-reportagem" deve ser escrita com ou sem hífen.

Obrigada.

Resposta:

Como amálgama decorrente da associação de publicidade e reportagem, deve escrever-se sem hífen, dobrando a letra r.

Uma publirreportagem é definida do seguinte modo, numa página da Internet:

«Define-se genericamente publi[r]reportagem1 como sendo a publicação de artigos publicitários pagos, como sendo reportagens de carácter noticioso.»

1 No original escreve-se erradamente "publireportagem".

Pergunta:

Em Acopiara, município do Ceará, existe um distrito cujo nome é "Trussu". Minha dúvida é a seguinte: é "Trussu" ou "Truçu" a maneira correta de grafar tal topônimo?

Muito grato!

Resposta:

O nome Truçu, que tem a variante Turuçu (Brasil A/Z — Enciclopédia alfabética em um único volume, São Paulo, Editora Universo), parece incluir o elemento -uçu ou -açu, «grande», de origem tupi, pelo que, em princípio, a grafia mais correcta é com ç, em harmonia com topónimos como Iguaçu ou Manhuaçu.

No entanto, não encontro fontes que confirmem claramente essa provável origem tupi, apesar de a região percorrida pelo rio assim chamado se encontrar em plena área de assentamento de populações que falavam essa língua. Assinale-se que Turuçu é também forma de um topónimo do estado do Rio do Grande do Sul, sobre o qual não consegui recolher elementos que apontassem uma origem tupi; o mais que encontro, numa página da Internet, é que o topónimo riograndense significa «águas grandes». Este significado é confirmado parcialmente pela semântica do elemento uçu, acima referido, mas é duvidosa a interpretação de tur- ou turu- como «águas».  Palavras de filiação tupi, foneticamente semelhantes ao elemento tur- ou turu-, são, por exemplo, turu, «verme», de origem indígena obscura, e turuna, «ágil, forte, capaz de tudo», do «tupi tyr´una, de tyr- `cano, monte+ -una `negro´; p.metf. `membro genital masculino» (Dicionário Houaiss). Conclui-se, portanto, que a análise do primeiro elemento de Truçu se defronta com um problema de homonímia parcial em vocábulos portugueses de origem tupi.   

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Pergunta:

Gostaria de saber qual a correcta pronúncia das seguintes palavras:

Bochecha: "bochêcha" / "bocheicha" / "bochécha"

Cristina: "Crestina" /"Crstina" / "Cristina"

Ministro: "menistro" / "mnistro" / "ministro"

Obrigado.

Resposta:

Em Portugal, a pronúncia normativa destas palavras é a seguinte:

a) bochecha: "bochâicha" ou "bochâcha" (transcrições fonéticas [buʃɐjʃɐ], [buʃɐʃɐ]);

b) Cristina, ministro: "Crestina", "menistro" (transcrições fonéticas: [kɾɨʃˈtinɐ], [mɨˈniʃtɾu]).

Sobre as pronúncias em b), esclareça-se que um i, em sílaba que antecede outra com i tónico, passa a [ɨ],1 vogal que, em português europeu, tem tendência a cair. Daí existirem também as pronúncias "Cr´stina" e "m´nistro".

Fontes: Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa; Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora.

1 Trata-se de um fenómeno de dissimilação.