Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber se se usa e é legítimo (ou se fui eu que a "inventei") usar a expressão «agora por isso», em alternativa a «por falar disso», «a propósito» e outras que me poderão estar a passar.

Gostaria de saber se há alguma citação que eu possa apresentar a quem diz que nunca ouviu falar de tal expressão.

Obrigada.

Resposta:

Trata-se de uma expressão conhecida, usada coloquialmente, muitas vezes
sob a forma «e agora por isso», pelo menos em Portugal, mas não atestada
nos dicionários consultados (dicionário da Academia das Ciências, Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, de Guilherme A. Simões, Dicionário Houaiss). Não obstante, foi possível achar duas atestações, ambas de textos da autoria do escritor português Júlio Dinis (1839-1871), que se encontram no Corpus do Português de Mark Davies e Michael Ferreira:

«Eu cá de romances não entendo. E agora por isso lembra-me que aquele endiabrado rapaz, o Carlitos, teimava que me havia de emprestar lá uns romances.. », Uma Família Inglesa;

«[...] mas sou eu só em casa, como V. Ex.ª sabe, a fazer o serviço, e a idade já me vai pesando. E agora por isso vem a pêlo dizer a outra coisa que me trouxe cá. [...]», Os Fidalgos da Casa Mourisca.

Trata-se,
de qualquer modo, de uma expressão que ocorre em diálogos, o que
reforça o anteriormente dito sobre o seu caráter coloquial.

 

Pergunta:

Qual a origem do nome bolhão para caracterizar uma boa parte das moedas medievais?

Resposta:

A palavra em apreço também é escrita bulhão e designa «prata baixa, muito ligada», segundo o Dicionário Houaiss, onde em nota etimológica se refere o seguinte: «fr. billon ´lingote` der. de bille < lat.vulg. *bīlia ´tronco de árvore`, de orig. gaulesa; no séc. XV bolhão, pl. bolhões, ocorrem também as var. bilhão, belhão e bulhão

Pergunta:

A palavra ortógrada existe em português?

Resposta:

Existe, como feminino de ortógrado, adjetivo que se aplica ao «[...] animal (homem) que mantém o corpo recto na marcha» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado; manteve-se a ortografia do original). Trata-se de um composto híbrido, fomado pelo elemento orto-, do grego orthós, «direito, correto», e pelo elemento átono -grado, com origem no latim gradus, us, «passo, degrau, grau» (cf. Dicionário Houaiss).

Pergunta:

Qual a etimologia da palavra tipografia?

Qual o seu sentido contemporâneo?

Resposta:

A palavra tipografia é palavra que surgiu em português por via erudita, sendo formada por dois elementos: tipo-, do grego túpos, ou, «marca feita de golpe, marca impressa, figura, símbolo, emblema», e -grafia, que, por sua vez, compreende o radical graf-, do grego graphē, ês, «escrita, escrito, convenção, documento, descrição», e o sufixo derivacional -ia, que forma substantivos abstratos (cf. Dicionário Houaiss).

Está dicionarizada, pelo menos, desde o século XVIII (ver Dicionário Houaiss). No entanto, é possível que a palavra já se usasse antes, como sugerem Maria Isabel Faria e Maria da Graça Pericão, em Dicionário do Livro (Edições Almedina, 2008), s. v. tipografia:
«Criação de carcteres para uso em impressos. Arte de compor e imprimir, reproduzindo o texto por meio de caracteres; a designação primitiva da tipografia foi a expressão ars impressoria, também designada calcographia antes que, no final do século XV, passasse a ser conhecida como tipographia. Lugar onde se imprime. Gráfica. Estabelecimento tipográfico. Arranjo ou estilo do texto tipográfico.»

São estes, portanto, os seus significados que chegaram até à contemporaneidade.

 

Cf. Os 60 anos da tipografia que virou ícone

Pergunta:

Gostaria de saber o valor semântico do vocábulo se no seguinte contexto. A meu ver ver, o valor semântico se aproxima de advérbio de intensidade, talvez equivalendo a como, quão. Não seria isso?

«Tenho muitas saudades de meu tempo de infância: gostaria que esse tempo voltasse. Seria muito bom... e se seria!»

Resposta:

Segundo Domínios – Gramática da Língua Portuguesa  3.º Ciclo e E. Secundário (Plátano Editora, 2011, pág. 190), as frases exclamativas podem ser assinaladas pela presença da conjunção condicional se selecionando conjuntivo: «Se não vivesse acima das suas possibilidades!»

Mas outros tempos verbais são compatíveis com se condicional em frase exclamativa, muitas vezes como resposta a uma pergunta ou comentário à observação de um interlocutor:

– Gostava de ir a Marte?

– Se gostava! (pretérito imperfeito)

– Come muitos chocolates, não come?

– Se como! (presente do indicativo)

– O exame foi difícil, acho.

– Se foi! (pretérito perfeito do indicativo).