Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual a forma correta para designar o penteado: "rabo-de-cavalo", ou "rabo de cavalo"?

Resposta:

Com a aplicação do Acordo Ortográfico de 1990, a palavra escreve-se atualmente sem hífenes, se se referir a um penteado («rabo de cavalo»), mas emprega-se rabo-de-cavalo, para designar diferentes espécies botânicas (ver Infopédia). Antes da nova ortografia, deveria escrever-se com hífenes (rabo-de-cavalo), mas é preciso notar que, em Portugal, a palavra não está atestada nos vocabulários ortográficos mais antigos (refiro-me ao de 1940 e ao de Rebelo Gonçalves, publicado em 1966). Um vocabulário ortográfico mais tardio, o de José Pedro Machado, e o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (2001) acolhem a forma rabo-de-cavalo, como designação quer de um penteado quer de uma planta. Mas trata-se de fontes anteriores à aplicação do novo acordo.

Pergunta:

Após ter consultado vários dicionários (e verificado se haveria alguma resposta à minha questão no Ciberdúvidas), persiste a dúvida. O termo amálgama aparece, em vários dicionários, como tendo dois géneros (já em francês é masculino.) Contudo, em nenhum consegui perceber em que casos se aplica um género ou outro. Confrontei-me com esta dúvida ao ler um artigo de 1939 que refere que «A chamada literatura feminina [...] é no seu conjunto um amálgama de banalidades romantizadas.»

Resposta:

O uso mais antigo da palavra amálgama atribui-lhe o género masculino, o que significa que, de um ponto de vista normativo mais conservador, se pode considerar que o emprego correto é «o amálgama». No entanto, atualmente, aceita-se o emprego da palavra no feminino e pode até dizer-se que esta tendência se expandiu, de tal modo, que hoje amálgama é substantivo que ocorre corretamente quer no género masculino quer no género feminino. Aliás, os dicionários consultados, portugueses e brasileiros, atribuem-lhe os dois géneros, sem indicação de haver contraste semântico entre ambos os usos (dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, dicionário da Porto Editora, Dicionário Aurélio, Dicionário Houaiss).

Ainda a propósito de amálgama como substantivo do género masculino, observe-se que é mais frequente este uso em textos do século XIX e da primeira metade do século XX. Com efeito, no Corpus do Português amálgama conta 42 ocorrências com género identificado, ficando o feminino em minoria com 18 ocorrências. Pela análise destes dados, não é possível distinguir contraste semântico entre o uso no masculino e o uso no feminino.

Acrescente-se que, em 1940, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa registava a palavra apenas no género feminino. Mas tarde, nos finais dos anos 50 do século passado, um gramático normativista, Vasco Botelho de Amaral, no seu Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português, continuava a condenar a atribuição do género feminino a amálgama: «Esta palavra no grego (malagata) é masculina. É erro, pois, escrever ou dizer-se: a amálgama. Correto: o amálgama.

Pergunta:

No Ceará existe uma localidade cuja denominação é Arneiroz. Sei que em Portugal há um lugar chamado Arneirós. Minha dúvida consiste na maneira como se grafa o topônimo aqui no Brasil. Justifica-se o uso do zê em vez do esse?

Muito grato.

Resposta:

Se é verdade que Arneiroz é a transposição do topónimo português Arneirós , então o topónimo brasileiro deveria apresentar a mesma grafia que o topónimo português, porque se trata de nome próprio derivado do latim *ARENARIOLAS (diminutivo de ARENARIA, «areeiro»; o * indica que é forma não atestada), étimo que exibe um s final que a ortografia do português conserva (ver José Pedro Machado, Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, Infopédia e portal da Câmara Municipal de Lamego). No entanto, é sabido que no Brasil se tem adotado um critério – enunciado no antigo Formulário Ortográfico de 1943 – que permite que certas grafias se mantenham quando têm tradição. É o caso de Bahia e muito provavelmente do topónimo em questão, Arneiroz. Trata-se, portanto, de um topónimo cuja grafia parece requerer o parecer das entidades que, no Brasil, intervêm em matéria de normalização linguística.

 

Pergunta:

Existe a expressão «troca por troca»? O que significa?

Resposta:

A expressão «troca por troca» está dicionarizada. Por exemplo, o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa regista-a como expressão idiomática, a que atribui o seguinte significado: «permuta de uma coisa por outra sem dar lugar a receber alguma quantia; ela por ela». A mesma fonte abona o seu uso com a seguinte frase: «Não compraram nem venderam nada, foi tudo troca por troca.»

Pergunta:

Escrevo-lhes porque tenho uma dúvida relacionada com o plural de pequeno-burguês. É "pequeno-burgueses" ou "pequenos-burgueses"?

Agradeço-lhes antecipadamente a sua resposta.

Resposta:

O plural de pequeno-burguês é pequeno-burgueses, conforme se pode confirmar em várias fontes dicionarísticas (dicionário e vocabulário ortográfico da Porto Editora, Dicionário Priberam da Língua PortuguesaVocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras, ). Esta palavra composta, usada quer como adjetivo quer como substantivo, distingue-se por uma anomalia quando usada como substantivo: ao contrário do que se verifica em geral (cf. pequeno-almoços, pequenos-almoços), o constituinte adjetival (pequeno) não concorda com o constituinte nominal (burguês) e, por isso, se diz «os pequeno-burgueses».