Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Tendo encontrado em registo escrito as expressões conteudística e conteudismo, gostaria que me esclarecessem sobre se é possível, e, já agora, correto, o recurso a estas expressões, tanto na expressão escrita como oral.

Muito obrigada.

Resposta:

Ambas as palavras são possíveis e corretas quer na oralidade quer na escrita, em qualquer variedade do português contemporâneo.

Está bem formada e tem uso legítimo a palavra conteudística, feminino do adjetivo conteudístico, o qual significa «relativo a conteúdo» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001, e Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, 2008-2013) e «relativo a conteudista ou conteudismo» (Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2003-2018).

Quanto a conteudismo, é este vocábulo igualmente correto, empregado como nome comum no contexto da literatura e das belas-artes com o significado de «tendência a valorizar mais o conteúdo do que a forma» (cf. dicionários acima mencionados). Também se regista o adjetivo conteudista, no sentido de «relativo a conteudismo», «que ou o que defende o conteudismo» e «pessoa que tem a seu cargo o conteúdo editorial técnico de uma obra» (esta última aceção é dada como característica do Brasil no Dicionário Houaiss e no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).

Apesar de ocorrerem como adjetivos por vezes sinónimos, é preferível usar conteudístico na aceção de «relativo ao conteúdo», deixando conteudista denotar a noção de «relativo ao conteudismo; que defende o conteudismo».

Pergunta:

IPMA (Instituto Português do Mar e da Atmosfera) é sigla ou acrónimo?

Resposta:

IPMA  é interpretável e pronunciável quer como sigla quer como acrónimo.

Se a abreviação IPMA (isto é, Instituto Português do Mar e da Atmosfera) for proferida letra a letra, isto é, soletrando – i-pê-eme-á –, trata-se de uma sigla. Contudo se pronunciarmos a mesma sequência como se fosse uma única palavra, fazendo soar "ípema", com três sílabas, ou "ipma", com duas, estamos perante um acrónimo. Ambos os usos são corretos, embora a comunicação social documente ocorrências do acrónimo (cf. "Rocha e a meteorologia/ Cinco para Meia-noite/ RTP", Youtube, de 1 min 4 s a 1 min 14 s).

É de admitir que o uso acronímico de IPMA se afigure estranho, porque encerra um encontro consonântico – [pm] – nada frequente em português. Contudo, na variedade europeia, conhecida pela redução do vocalismo átono, não é impossível articular tal encontro, como bem atesta outra sigla, IAPMEI – Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação –, que, em Portugal, se articula geralmente como palavra simples, com a aberto e acento tónico na última sílaba, numa pronúncia sem tradição de censura normativa.

Pergunta:

Como se diz corretamente: «fui ao pilates» ou «fui aos pilates»?

Resposta:

Deve dizer «fui ao pilates», empregando pilates como nome no singular, uma simplificação das expressões «método de Pilates» e «método Pilates».

No caso em questão, o singular afigura-se adequado, porque se denota assim um método de exercício físico que se chama "pilates". Note-se, porém, que se pode utilizar pilates no plural, quando com este termo se quer fazer referência aos exercícios que fazem parte desse método: «Fiz os pilates.»

O nome comum pilates tem origem no nome de Joseph Pilates (1883-1967), criador do conhecido método de exercícios físicos.

Pergunta:

No sítio da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa li o seguinte título: «Rastreios sobre o cancro da pele e observação de sinais.» Parece-me que o "rastreios sobre" não será a forma mais correcta. Não será melhor dizer "Rastreios de cancro..."?

Resposta:

A preposição usada é de facto de, e não sobre:

1. «Rastreios do cancro da pele e observação de sinais»

Compreende-se que seja de a preposição selecionada, uma vez que rastreio é verbo derivado de rastrear, que é verbo transitivo. Os substantivos derivados de verbos (deverbais) têm geralmente regência construída com a referida preposição.

No entanto, pode também ocorrer a:

2. «A importância do rastreio ao cancro da mama continua a ser muito ignorada pela maioria das mulheres [...]» (Diário de Leiria, 10/10/1997, in Corpus do Português)

Neste caso, a preposição selecionada deve-se ao facto de o uso de rastreio subentender «o rastreio (que é feito) a alguma coisa».

Pergunta:

A expressão «galeria de tiro» pode ser usada em português de Portugal? Em caso negativo, temos alguma expressão equivalente?

Resposta:

Nas fontes consultadas para elaboração desta resposta, não se acha «galeria de tiro» como termo da prática de tiro, muito embora a sua transparência seja de molde a interpretá-lo facilmente e até a prever-lhe já algum uso em Portugal.

Contudo, os termos que se encontram em documentos que regulam o tiro como modalidade desportiva são «complexo de tiro» e «carreira de tiro», sendo esta última expressão a que parece corresponder melhor a «galeria de tiro», se se pensar num espaço interior:

«Carreira de tiro» a instalação, interior ou exterior, funcional e exclusivamente destinada à prática do tiro com arma de fogo carregada com projéctil único; [...]» (cf. Regulamento técnico e de funcionamento e segurança dos complexos, carreiras e campos de tiro, art.º 1, Definições).