Ana Martins - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Ana Martins
Ana Martins
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas – Estudos Portugueses, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e licenciada em Línguas Modernas – Estudos Anglo-Americanos, pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Mestra e doutora em Linguística Portuguesa, desenvolveu projeto de pós-doutoramento em aquisição de L2 dedicado ao estudo de processos de retextualização para fins de produção de materiais de ensino em PL2 – tais como  A Textualização da Viagem: Relato vs. Enunciação, Uma Abordagem Enunciativa (2010), Gramática Aplicada - Língua Portuguesa – 3.º Ciclo do Ensino Básico (2011) e de versões adaptadas de clássicos da literatura portuguesa para aprendentes de Português-Língua Estrangeira.Também é autora de adaptações de obras literárias portuguesas para estrangeiros: Amor de Perdição, PeregrinaçãoA Cidade e as Serras. É ainda autora da coleção Contos com Nível, um conjunto de volumes de contos originais, cada um destinado a um nível de proficiência. Consultora do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa e responsável da Ciberescola da Língua Portuguesa

 
Textos publicados pela autora

O título da crónica desta semana podia ser também: «ver como o que se diz não se faz».

Diz-se que o ensino do português no estrangeiro é uma questão nacional. Cavaco Silva, de visita aos EUA no passado mês de Junho, declarou que os portugueses no estrangeiro são os guardiães da língua portuguesa no mundo. A Constituição estabelece como um direito o ensino do português junto das comunidades emigrantes.

O (...) leitor Segismundo de Bragança traz-nos duas dúvidas que ilustram algo que é relativamente comum: as pessoas que se interessam por questões de língua começam a dar conta de que há formas e construções (conjugações, concordâncias, formações de palavras, etc., etc.) que, pela lógica, não deviam ser como são.

Noticiar é divulgar factos. A construção da notícia funda-se em aspectos da ordem da referencialidade, verdade, fidelidade e responsabilidade. Mas muitas vezes o jornalista não está em condições de assegurar totalmente a validação da informação que transmite, porque não presenciou os factos que enuncia e porque, por intermédio da sua fonte, adquiriu apenas uma informação provisória. Nessa altura, ele tem ao seu dispor recursos linguísticos que servem exactamente para marcar a não efectividade...

Saramago e o portunhol

José Saramago falando em portunhol num programa do segundo canal da televisão pública portuguesa.

Apontamento da professora Ana Martins, publicado originalmente no semanário Sol de 7 de Julho de 2007.

Pergunta:

Apesar de ter procurado, não encontrei nenhuma pergunta anteriormente colocada que respondesse à minha questão.

Assim, peço que me informem sobre o tempo verbal mais correcto aquando da redacção de um estudo que será brevemente publicado que possui vários capítulos, em que uns remetem para a análise de dados recolhidos no passado (1) e outros tratam de apresentar os processos e os resultados atingidos com certas metodologias aplicadas no passado (2).

Ou seja, como opto correctamente pelo tempo verbal no presente ou no passado? Exemplos:

(1) «Ao analisarmos a variação da população entre os censos de 1981 e 2001 podemos distinguir dois grupos de freguesias distintos em termos de evolução: por um lado, um conjunto de freguesias onde se observou (OU OBSERVA) um ganho populacional entre 1981 e 1991, seguido de uma perda de população nos censos de 2001 (...)»;

(2) «os instrumentos que foram preenchidos pelas participantes criou-se um portfólio individual, que será entregue a cada uma, onde ficaram organizados todos os instrumentos que foram utilizados e que reflectem algumas das competências adquiridas ao longo da vida, bem como o Curriculum Vitae. Este currículo constitui um documento de utilização universal, que concretiza todo este processo de auto-reflexão e análise, e ao mesmo tempo que actua ao nível da auto-estima e motivação pessoal...»

Para além destas questões, gostaria ainda que respondessem se é adequado num mesmo capítulo referente, por exemplo, à apresentação de uma instituição que existe e são analisados dados actuais mas também passados e da sua evolução, utilizarmos diferentes tempos verbais.

Resposta:

1. Sequência (1)

Quando se trata da apresentação de uma leitura de dados acessíveis ao leitor, o tempo usado é o presente simples do indicativo. O presente simples é um tempo neutro no que toca à localização e aos limites temporais dos eventos e, portanto, adequado à elocução descritiva de uma situação disponível intemporalmente.

Sequência (2)

O primeiro segmento não está transcrito correctamente, o que limita a possibilidade de avaliar o enquadramento temporal que está em causa no discurso. De qualquer modo, parece certo que importa substituir ficararam por estão: por um lado, porque interessa optar pelo presente simples, pela razão apresentada acima; e, por outro, porque o valor resultativo, que o verbo ficar acarreta, não se reveste de particular pertinência, dado que, pelo menos aparentemente, não estamos em face de um relato de eventos.

2. Um mesmo enunciado e um mesmo bloco textual podem apresentar diferentes tempos verbais. Há é que saber gerir mecanismos de concordância temporal e explicitar, sempre que necessário, o(s) ponto(s) de referência temporal em causa.