«Os políticos são os maiores especialistas do "eu diria que".»
Perde-se a conta a quantos «eu diria» os portugueses escutam todos os dias nas TV e nas rádios, dentro e fora do contexto adequado. A moda pegou há uns anos e está de pedra e cal. É uma coloquialidade bacoca e até medrosa. São os ministros que reagem com o «diria que»; são autarcas, líderes da oposição, o presidente ou o primeiro-ministro que avançam com o «eu diria que»; são os analistas, especialistas, comentadores e afins que, a qualquer pergunta, iniciam a sua dissertação com a "bengala" do «eu diria que». Muitos jornalistas e simpatizantes, convictos, seguem o exemplo. Julgam de boa oralidade começar a sua intervenção com o batido «eu diria que». Se a floresta está a arder, o mote é: «eu diria que está a arder com rapidez.» Se Trump anuncia novas tarifas, o economista de serviço inicia a análise com o «eu diria que» da praxe. E por aí fora. Há honrosas excepções, mas o vício do «eu diria que» pegou de estaca, ainda que ninguém, entre amigos ou em reunião informal, utilize este gongórico «eu diria que».
Segundo as regras do português, o «eu diria que» é o presente do condicional, utilizado como um tempo indicativo a aproximar-se do futuro. Pode dizer-se que o «eu diria que» é um condicional que exprime o irreal, um desejo ou, quase sempre, a atenuação de uma afirmação. Acaba por ser uma maneira cautelosa de alguém prever o futuro sem se comprometer. Os políticos são os maiores especialistas do «eu diria que». Muitos utilizam também o mais subtil «digamos que...» «Digamos» é o mesmo que «façamos de conta», «é uma hipótese» ou «suponhamos». É a forma verbal de, sem grandes compromissos, apresentar uma situação imaginária. Praga da oralidade portuguesa, o «eu diria que» e o «digamos» são uma espécie de vírus linguístico, um condicional a roçar a cobardia. Digo eu.