Há adjetivos que, pura e simplesmente, não admitem graduação. É o caso de favorito. Ou se é ou não se é, como escreve o jornalista Wilton Fonseca, neste texto publicado no jornal "i" de 11/05/2012.
Ao longo da campanha [das presidenciais, em França], à medida que o domingo eleitoral se aproximava, François Hollande passou de “candidato” a “favorito”, de “favorito” a “mais favorito” e finalmente a “cada vez mais favorito” (“Público”, dois dias antes das eleições).
Ora, havia apenas dois candidatos em confronto, como se sabe. Se um era o favorito, o outro não o podia ser. O “favorito” nunca poderia ser “mais favorito”, nem o outro poderia ser “menos favorito”. O favoritismo é daquelas situações shakespearianas: é ser ou não ser, pegar ou largar. Trata-se de uma situação, não de um processo. Há várias outras ocorrências semelhantes na linguagem de todos os dias, como “morto” e “vivo” (ninguém fica ou está cada vez mais morto ou cada vez mais vivo). A não ser evidentemente os políticos, mestres na arte de viver e sobreviver.
in jornal i, de 11 de maio, na coluna semanal do autor, Ponto no i, sob o título original "Favorito". Manteve-se a grafia original da norma de 1945.