1. Em Portugal, assiste-se a uma nova crise política com a queda do XXIV Governo Constitucional, numa conjuntura internacional gerada pelo que já se chama «nova ordem global». Entretanto, a atividade cultural continua, e celebra-se o bicentenário de um dos maiores autores de língua portuguesa do século XIX, Camilo Castelo Branco, que, apesar de nascido em Lisboa em 16/03/1825, passou a vida no norte de Portugal, até ao seu desfecho trágico, em 1890, em São Miguel de Seide (Vila Nova de Famalicão). Além da turbulência dos enredos, com o seu quê de autobiográfico, que caracterizam muitos romances e novelas, a obra camiliana salienta-se por uma enorme mestria no uso de palavras e registos associada a uma aguda consciência do funcionamento da língua. Como sublinha a linguista Sónia Valente Rodrigues (Faculdade de Letras da Universidade do Porto): «Na obra de Camilo Castelo Branco, [...] [t]êm sido destacadas, sobretudo, a diversidade e precisão vocabular, o capital lexical e a capacidade de recriação de diálogos plenos de marcas orais vivas da fala nortenha, forte contributo para a composição de quadros de costumes.»* Várias publicações tem assinalado a efeméride, entre elas, por exemplo, o n.º 382 (12/03/2025) de As Artes entre as Letras, dedicado à evocação de Camilo Castelo Branco e ao impacto do seu estilo, ainda hoje visto como modelo de vernacularidade. Numerosos são também os acontecimentos culturais, incluindo os académicos, que assinalam a efeméride, como é o caso de congresso internacional Camilo Castelo Branco, 200 anos depois, realizado de 14 a 16/03/2025 na Casa de Camilo, em São Miguel de Seide. Juntando-se o Ciberdúvidas à homenagem, sugere-se a leitura de dois textos da rubrica Antologia: "Obriga-se o cronista... (sobre os adjetivos substantivados)" (extrato do livro Crónicas, Textos Polémicos e Artigos Escolhidos, ed. Círculo de Leitores, com título da responsabilidade de Ciberdúvidas) e "A linguagem do padre António Vieira em Os Sermões – Génio, ironia e sarcasmo" (extrato de Curso de Literatura Portuguesa, Lisboa, 1876, p. 104).
* "Manifestações metalinguísticas na obra de Camilo Castelo Branco: estudo preliminar", in Desafios em língua portuguesa: do olhar da linguística textual à perspetiva retórica-argumentativa). Para acesso em linha à edição de obra de Camilo Castelo Branco pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, clicar aqui.
2. Amor de Perdição é muito provavelmente a obra mais conhecida de Camilo Castelo Banco. Por razões que muitos recordam e outros poderão desvendar, o verbo degredar e o nome degredo são palavras recorrentes no livro, com uma carga dramática que tem ponto alto numa carta de Simão Botelho a Teresa: «A vida é tudo. Posso amar‑te no degredo. Em toda a parte há céu, e flores, e Deus. Se viveres, um dia serás livre; a pedra do sepulcro é que nunca se levanta. Vive, Teresa, vive!» O verbo degredar é precisamente o motivo de uma das dúvidas da atualização do Consultório, a qual também abrange as áreas da sintaxe – A construção «cidade de Lisboa», "A sintaxe do verbo causar", "O verbo degredar com complemento oblíquo" – e do léxico – "Os verbos arder e queimar", "Despegar e desapegar", "A regência do verbo equiparar", 'A expressão «baia de estacionamento'" e "'Andar à pergunta' (regionalismo)".
3. A propósito da proibição de certas palavras na linguagem da nova administração dos EUA, divulga-se com a devida vénia, em Controvérsias, uma entrevista com a linguista Margarita Correia, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, peça que integrou em 05/03/2025 o número comemorativo do 35.º aniversário do jornal Público.
4. O que significará "cartar"? Em O Nosso Idioma, o consultor João Nogueira da Costa comenta em apontamento esta deturpação de acartar, uma variante popular de acarretar.
5. Quanto aos vídeos do Ciberdúvidas, fala-se do uso de «ter de» e «ter» em Ciberdúvidas Vai às Escolas (21.º episódio, com a participação do Agrupamento de Escolas de Alfornelos, no concelho da Amadora) e indica-se o uso correto de obrigada em Ciberdúvidas Responde (26.º episódio).
6. Um registo do mundo da educação, com interesse para o ensino do Português nas escolas de Portugal: os alunos do 1.º ciclo da escolaridade obrigatória vão poder manter os respetivos manuais escolares (pormenores no jornal Público, em 11/03/2025).
7. Quanto aos temas de dois dos programas que a rádio pública de Portugal dedica à língua portuguesa:
– Em Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 14/03/2025 às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), Vanessa Gomes Teixeira Anachoreta apresenta o livro Desafios e Descobertas: Perspetivas do Português como Língua Não Materna, lançado em 2024 pelo Centro de Linguística da Universidade do Porto.
– Em Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 16/03/2025, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 29/03/2025, às 15h30*), evoca-se a figura do destacado professor e linguista Luís Filipe Lindley Cintra (1925-1991). Conta ainda com a participação da professora Carla Marques, que discorre sobre o sentido de um provérbio popular: «julho debulhar, agosto, engavelar».
* Hora oficial de Portugal continental.