Há, por um lado, o cargo de prefeito, e, por outro, o prefeito ou a prefeita que fazem o exercício desse cargo. Ou seja, a língua é sexista, porque pressupõe que a designação do cargo, independentemente do sexo de quem o ocupa, é sempre do género masculino. Por conseguinte, quando alguém, mulher ou homem, se candidata ao lugar cimeiro da prefeitura, candidata-se ao lugar de prefeito. Mas quando se encara o exercício do cargo, usa-se o contraste de género: «O candidato a prefeito»/«A candidata a prefeita»; «Ele será/é/foi o prefeito»/«Ela será/é/foi a prefeita». Do mesmo modo, se dirá que «a Rita foi eleita governadora», porque passou a ocupar o cargo de governador.
Já no caso de «Júlia passou no concurso para juiz» é possível usar quer o masculino quer o feminino, em função do que se pretende referir: «Júlia passou no concurso para ocupar o cargo de juiz» vs. «Júlia passou no concurso para se tornar juíza (para passar a assumir o cargo de juiz)».
Acrescente-se que, dado a pergunta focar algumas funções específicas do Brasil, a nossa resposta baseia-se também na Lei n.º 2749, de 2 de Abril de 1956, que «dá norma ao género dos nomes designativos das funções públicas», critério adoptado por Luiz Autuori e Oswaldo Proença em Nos garimpos da linguagem1. Assim, verificámos que prefeito e juiz não se encontram aí registados (do que se depreende que manteriam a mesma forma no feminino) e retirámos da lista aí apresentada os seguintes casos de formação de feminino de cargos públicos:
capitão → a capitã ou capitoa
chefe → chefa
cônsul → consulesa
deputado → deputada
desembargador → desembargadora
escrivão → escrivã
general → generala
marechal → marechala
ministro → ministra
presidente → presidenta
senador → senadora e senatriz
No entanto, verificámos que o Dicionário de Masculinos e Femininos2 assinala prefeita como feminino de «prefeito, chefe do poder executivo municipal», explicitando com a seguinte abonação retirada do Jornal Correio da Manhã, de 15-X-1958: «(Dona Jandira de Souza) foi eleita com 1107 votos e será a primeira prefeita da Bahia» e, também, «juíza», como «mulher com cargo ou função de juiz».
Relativamente aos cargos públicos, há a assinalar, ainda, alguns casos, focados na Nova Gramática do Português Contemporâneo3, que fazem a diferença: o termo embaixador prevê, convencionalmente, dois femininos: embaixatriz (a esposa do embaixador) e embaixadora (funcionária chefe de embaixada).
Convém recordar, também, que «os substantivos terminados em -e são geralmente uniformes (excepto abade, barão, conde, diácono, duque e sacerdote) [e] essa igualdade formal para os dois géneros é quase que absoluta nos finalizados em -nte, de regra originários de particípios presentes e de adjectivos uniformes latinos, exceptuando-se um pequeno número que, à semelhança da substituição -o (masculino) por -a (feminino)», como é o caso de «governante → governanta, infante → infanta, mestre → mestra, monge → monja, parente → parenta» (idem, p. 105).
É natural, pois, que nos casos dos substantivos comuns de dois géneros, ou seja, os que «apresentam uma só forma para os dois géneros», se distinga o masculino do feminino pelo género do artigo ou de outro determinativo acompanhante, como é o caso de «o agente → a agente, o gerente → a gerente» (idem, p. 196).