O Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa regista puxão de orelhas, mas o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, na sua edição brasileira (Rio de Janeiro, Editora Objetiva, 2001), só inclui puxão de orelha. Podíamos pensar que se tratasse aqui de variação entre a norma portuguesa e a norma brasileira, mas o Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, que pertence à lexicografia brasileira, regista puxão de orelhas. Quanto a puxar as orelhas ou puxar a orelha, nota-se a clara preferência do Dicionário Houaiss (versão brasileira) pela segunda forma, atribuindo-lhe uma atestação: «puxar a orelha do filho» (idem).
Penso que, pelo menos, em português europeu, seria um tanto estranho dizer «puxão de orelha», para designar a situação em que se puxou uma única orelha. Já com a perífrase verbal, «puxar a orelha», é possível que ela ocorra, mas sempre como designação de um realidade já referida em discurso (p. ex., «ele ia-me arrancado uma orelha; mais tarde, perguntei porque me tinha puxado a orelha»). Estes usos parecem-me pontuais, visto as expressões «puxão de orelhas» e «puxar as orelhas» se terem fixado na norma portuguesa, ou seja, lexicalizaram-se com o plural de orelha. Se há variação no Brasil, havendo quem defenda e registe puxão de orelha e puxar orelha como formas legítimas, é possível que os falantes de português europeu venham também a sentir a necessidade de mudar a expressão, mais a mais quando se trata de adequar a língua à realidade. Em todo o caso, o que ainda parece ser corrente na norma europeia é puxão de orelhas e «puxar as orelhas», por muito infiéis que estes usos sejam à verdade, quando apenas uma orelha foi puxada…