Recorrendo aos dicionários, apercebemo-nos de que o termo ordem designa «associação de pessoas que exercem a mesma profissão e que estão sujeitas a um regulamento (Ordem dos Médicos; Ordem dos Advogados, Ordem dos Engenheiros» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010, e Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, 2001) ou «classe de pessoas que exercem uma profissão e estão legalmente sujeitas a determinados princípios regulamentares» (Dicionário da Língua Portuguesa, de António de Morais Silva, 1980). Ordem está, também, ligada ao domínio da religião, sobretudo porque é a palavra usada para designar uma «regra monástica ou comunidade religiosa»: Ordem de Cristo, Ordem dos Templários, Ordem dos Pregadores, Ordem de S. Francisco, etc.).
Por sua vez, a palavra câmara é utilizada para designar as assembleias que têm como objetivo o interesse comum. Repare-se nas definições dos dicionários: «assembleia regularmente constituída que se ocupa dos assuntos de interesse comum (como é o caso da Câmara de Comércio, «instituição destinada a discutir os acontecimentos económicos e a advogar junto dos governos a defesa dos interesses dos seus associados»); «assembleia legislativa [uma vez que a câmara dos deputados é a Assembleia da República e o Parlamento britânico é constituído pela câmara baixa (dos comuns) e pela câmara alta (dos lordes)]. E mesmo câmara municipal ou câmara designa o «órgão da administração local que corresponde ao concelho ou ao município», o «conjunto de vereadores de um município» para além de corresponder ao «local onde funcionam os serviços desse órgão».
Se tivermos em conta o facto de o termo câmara estar associado à ideia (e ao princípio) de «interesse comum», inferimos que não é por acaso que os solicitadores estejam integrados numa câmara e não numa ordem. Atente-se no significado de solicitador: para além do de «aquele que solicita»: «profissão liberal que pratica atos de procuradoria (registos, preparação de escrituras, etc.) por conta e no interesse de clientes, podendo ainda exercer mandato judicial com certas limitações legais.» É natural, pois, que pertençam a uma câmara de solicitadores, mesmo que o sentido original de uma câmara se tenha perdido.
A etimologia, geralmente, ajuda-nos a chegar a conclusões sobre a especificidade de termos que parecem designar realidades semelhantes, de que o caso que nos apresenta é um exemplo.
Assim, o nome ordem, de que se encontra registo em documentos portugueses do séc. XIII, deriva «do latim ordine-, "fileira, linha, alinhamento; fila; ordem; classe social; sucessão, ordem; boa ordem, distribuição regular, arrumação, arranjo"» (Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado).
Câmara, por sua vez, provém «do latim cămăra, forma tardia de cămĕra, “teto abaulado, telhado côncavo, abóbada; quarto, compartimento”» e a palavra ocorre num texto de 1361 — «… na nobre ÇJdade de lixbõa na câmera do paaço do Conçelho…» — para designar, precisamente, um determinado compartimento/aposento do paço do concelho (onde se reuniam os membros do concelho). Tal como nos diz Vasco Botelho do Amaral, no seu Glossário Crítico de Dificuldades do Idioma Português (Porto, 1947, p. 86), «o progresso determinou novas divisões nas casas, e não admira que novas palavras surgissem, pois a linguagem acompanha a vida. A vida exige mortes e nascimentos, destruições e inovações. A câmara (quarto de dormir; aposento destinado a uma pessoa) de outros tempos só tem vestígio em dições, como câmara-ardente, em música de câmara, Câmara Municipal, Câmara de Comércio e semelhantes. Já ninguém diz — recolho à câmara, mas ao quarto, para dormir».