Tem toda a razão o nosso consulente. A expressão "mano fico" não é latim, nem sequer macarrónico. Quando muito, seria italiano, pois, na língua de Dante, mano quer dizer «mão», e fico significa «figo».
Quanto a manus ficae, esta construção faria sentido em latim, se fosse possível atestar a forma fica, o que não se me afigura tarefa fácil, pois não acho esse vocábulo em nenhum dicionário nem na base de dados de autores latinos que perscrutei. No entanto, trata-se de forma plausível, ou mesmo expectável, pelo menos no chamado latim vulgar, dada a ocorrência do plebeísmo fica («vulva») em italiano. Seja como for, «figo» em latim era ficus, que fazia no genitivo singular fici pela segunda declinação, ou ficus pela quarta, e assim «mão de figo», se tivesse algum sentido, seria manus fici ou manus ficus na língua de Cícero.
Estou em crer que a expressão "mano fico", citada pelo consulente André Morais em resposta anterior, é corruptela do italiano mano in fica («mão em figa»), nome que o arqueólogo italiano Andrea de Jorio (1769-1851) deu ao milenar gesto na sua famosa obra La Mimica degli Antichi Investigata nel Gestire Napoletano («A mímica dos antigos investigada através do gesticular napolitano»), publicada em 1832.
A propósito, em resposta anterior foi citado um trecho da obra A Casa da Mãe Joana 2, da autoria de Reinaldo Pimenta, edição da Editora Campus, Rio de Janeiro, Brasil, a qual me merece pelos menos dois reparos.
Não é certo que a figa simbolize apenas a «união sexual, com o polegar representando o pênis, introduzido entre o indicador e o médio dobrados, correspondendo ao triângulo feminino». Existe outra explicação, que parece tão plausível como a anterior, segundo a qual a figa simbolizaria a vulva. De fa{#c|}to, quando se estende a alguém o braço com a mão em figa, o que a outra pessoa vê são as falanges proximais do indicador e do médio e, entalada entre elas, a cabeça do polegar, qual clítoris a surgir por entre os grandes lábios.
Creio haver equívoco na asserção de que «a poesia satírica latina registra vários trocadilhos entre ficus (figo) e fica (vulva)». Em primeiro lugar, como referi em parágrafo anterior, não é possível abonar a forma fica com os documentos actualmente existentes. Se a mesma não se encontra registada nos dicionários nem na base de dados de autores latinos, como poderá ser objecto de «trocadilhos»? Os trocadilhos que se conhecem são entre o vocábulo ficus (“figo”), que se declina pela segunda ou pela quarta declinação, e estoutro ficus (“hemorróidas”), que deriva do anterior mas pertence unicamente à segunda declinação, pelo que têm algumas formas homónimas, mas não todas. São frequentemente citados os seguintes versos de Marcial (Epigrammata, 1, 65):
Cum dixi ficus, rides quasi barbara verba,
Et dici ficos, Caeciliane, iubes.
Dicemus ficus, quas scimus in arbore nasci:
Dicemus ficos, Caeciliane, tuos.
«Cada vez que digo ficus, fazes pouco do meu latim,
E queres que se diga ficos, Ceciliano.
Vamos passar a chamar ficus aos que nascem nas árvores,
E aos teus vamos chamar ficos, Ceciliano.»
O trocadilho de Marcial é entre o acusativo plural ficus («figos») e ficos («hemorróidas»), por Ceciliano entender que o acusativo plural de ficus («figo») deveria ser sempre ficos, de acordo com a segunda declinação, e nunca ficus, segundo a quarta.