DÚVIDAS

Nenhuns saíram

Agradeço ao prezado Sr. José Neves Henriques por sua atenta resposta de 10/02/99 a pergunta que fiz sobre o "nenhum".

No entanto, ainda fiquei em dúvida em um detalhe. Foi dito, no item "3" da referida resposta, que o verbo vai para o plural para concordar com "nenhuns" na seguinte frase: "Nenhuns de nós saíram."

Sobre isso, noto que, nas gramáticas, consta que, quando o sujeito é um pronome indefinido plural seguido de "de (ou dentre) nós (ou vós)", o verbo pode concordar com o primeiro pronome na terceira pessoa do plural ou com o pronome pessoal, dependendo se o emissor da mensagem quer incluir-se ou não entre aqueles designados pelo pronome pessoal. Desta forma, também estaria certa a frase "Nenhuns de nós saímos", ou seja: alguns de nós poderiam ter saído, inclusive eu, e não saímos.

Agradeço a preciosa confirmação, pois talvez eu esteja fazendo confusão.

Resposta

Vejamos, então, as frases seguintes:

(1) Nenhuns de nós saíram.

(2) Nenhuns de nós saímos.

A sua observação é de ponderar. Mas vejamos que, tanto na frase (1) como na frase (2), o pronome nós engloba completamente determinado grupo, no qual está incluído o eu. Isto é, tanto na frase (1) como na (2), ninguém saiu, incluindo o tal eu. Sendo assim, não é precisa a frase (2) para significarmos que «alguns de nós poderiam ter saído, inclusive eu, e não saímos

Como sabemos, a Língua Portuguesa é suficientemente maleável para ser correcto começarmos uma frase por uma palavra ou por outra. Experimentemos, então, começar por de nós as frases acima:

(3) De nós, nenhuns saíram.

(4) De nós, nenhuns saímos.

Em Portugal, não se costuma dizer a frase (4). Julgo que no Brasil também não. Em vez dela, dizemos a frase (3) ou, mais vulgarmente, a seguinte:

(5) De nós, ninguém saiu.

Estes factos levam-nos a não aceitar a frase (4), tanto mais que não é precisa a forma verbal saímos para englobar o eu, como já se disse.

Mas há uma explicação para não rejeitarmos definitivamente a frase (4). É a chamada concordância por atracção. Quando o emissor pronuncia a frase, o sujeito nenhuns como que se «esfuma», e ele fixa a atenção mais intensamente em nós, e assim é atraído a fazer a concordância do verbo com nós.

Para esta atracção para o «nós», contribui o facto de o emissor se ver e sentir como fazendo parte do grupo significado por este pronome pessoal.

Seja como for, devemos preferir a frase (3).

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa