Não encontrámos nenhum registo, nas obras1 consultadas, da expressão «filhos da Igreja», mas de uma outra idêntica — «filho de Deus» —, identificada como alentejana2 (por Guilherme Augusto Simões, no seu Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, p. 325), cujo significado está relacionado com o valor dado pelo consulente à expressão sobre a qual nos apresenta a questão: «enjeitado», «filho exposto», ou seja, «aquele que foi abandonado pelos pais; aquele cuja paternidade se desconhece» e que era, habitualmente, recolhido pela Igreja (razão pela qual ficou também conhecida a expressão «colocado na roda», que recua a épocas remotas, em que o bebé era colocado numa roda que havia no exterior dos mosteiros/conventos).
É interessante notar as várias expressões populares usadas para designar o filho enjeitado, recusado pelo pais, evidenciando o abandono a que a criança é votada e a entrega a uma entidade superior (filho de Deus) e à natureza: «filho das ervas3», «filho das tristes ervas», «filho das malvas» e «filho das ervas e neto das águas correntes».
1 Da bibliografia específica sobre as expressões correntes, populares e idiomáticas portuguesas: Dicionário de Expressões Correntes (Lisboa, Ed. Notícias, 1998), de Orlando Neves; Dicionário de Expressões Populares Portuguesas (Lisboa, Dom Quixote, 2000, de Guilherme Augusto Simões; Novos Dicionários de Expressões Idiomáticas (Lisboa, Ed. Sá da Costa, 1990), de António Nogueira Santos.
2 Guilherme Augusto Simões indica como referência a obra Vocabulário Alentejano (1913), de António Tomás Pires.
3 Sobre esta expressão, Orlando Neves, no seu Dicionário de Expressões Correntes (p. 195-196), diz-nos o seguinte: «para se compreender esta expressão, é necessário recuar ao exercício da mais velha profissão do mundo, a prostituição, segundo dizem. Muitos nomes havia para se chamar às mulheres que a exerciam durante a Idade Média. Um deles era hervoeira (hoje grafado ervoeira depois que erva perdeu o h inicial). Naturalmente, a prostituta dessas eras recebia os clientes em qualquer lugar: em casa, no mato, sobre a erva. Constituía, de resto, ofensa dar-se tel nome a uma mulher, tanto que um documento encontrado em Tomar e datado de 1388 dizia: "E se Confrade chamar à Confrada hervoeira ou aleivosa ou ladra pague 5 soldos à Confraria."»