A expressão em questão não é uma expressão idiomática. Constitui, antes, criatividade linguística de Mia Couto, cuja escrita é marcada, entre outros aspetos, pela exploração morfológica que gera novas palavras e pela exploração sintático-semântica que produz novas combinações de vocábulos e, portanto, novos sentidos. Esta exploração sintático-semântica assenta muitas vezes na recriação de expressões já existentes que são apresentadas como se fossem usadas comummente:
No caso da frase em apreço, que julgamos querer significar que o homem estava muito magro, o autor explora várias realidades linguísticas que importará considerar:
(i) a expressão familiar «emagrecer/estar magro até ao osso», que se associa à expressão, também familiar, «ser/estar pele e osso», cujos significados apontam para uma magreza extrema;
(ii) o vocábulo popular tutano, usado para referir a «substância mole e gordurosa que se encontra no interior dos ossos» (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea), que surge também em expressões familiares como «chupar até ao tutano» (com o significado de “reduzir à miséria” (Idem)).
A partir do cruzamento destas informações semântico-lexicais, o autor explora criativamente uma expressão que intensifica a magreza da personagem: «emagrecer abaixo do tutano». Isto significa que a sua magreza não é apenas aquela que vai até ao osso, como familiarmente se afirma, é antes uma magreza que penetra até ao interior do próprio osso, indo «abaixo do tutano».
É esta exploração de sentidos resultante de associações inesperadas de palavras que constitui uma das riquezas incomparáveis que a literatura nos oferece.
Disponha sempre!