No seu texto há, creio, uma palavra-chave em torno da qual giram as diferenças entre o que se pode ler na resposta «Complemento determinativo e complemento circunstancial de matéria», que assino, e o que expõe nesta questão: «o legislador».
É sabido que cada área do saber, ou profissional, tem, ou pode ter, uma forma característica de usar a língua que pode, mesmo, assumir o carácter de terminologia específica. E a área legislativa, ou jurídica, como a linguística, ou, se preferir, a gramatical, não foge à regra.
Na resposta que dei, não utilizo o termo determinante, e, se o tivesse feito, no âmbito da terminologia gramatical e no contexto em que escrevi, teria cometido um erro, pois determinante, em gramática, tem outro significado, específico. O que refiro é complemento determinativo, que é, também ele, como creio ter explicitado na resposta em análise, associado a um determinado contexto e apenas a esse. Repare que na resposta em causa a preposição em apreço é sobretudo de, surgindo em dois contextos diversos: a seguir a um nome e na sequência de um verbo. E são estes dois contextos que pretendem ser focados para distinguir o que tradicionalmente se designa como complemento determinativo e por complemento circunstancial.
Em termos semânticos, os complementos em análise na resposta em apreço eram de matéria, ou assunto no sentido material, digamos assim, ou abstraco. Em «taça de cristal», «de cristal» indica a matéria de que a taça é feita; poderia ser «de vidro», «de barro», «de bronze». Em «falar de política», «de política» designa, ou refere, «o assunto tratado». Poderíamos dizer «matéria tratada» ou «tema tratado».
Do ponto de vista da análise gramatical, antes de mais, a expressão «dos Açores» ou «nos Açores» não tem valor que se associe a matéria em sentido concreto, nem abstracto. Designa, sim, o local, ou, quando muito, veicula uma certa ideia de pertença. É o Instituto de Reinserção Social dos Açores, não é o da Madeira, nem o de Lisboa. Os problemas que resolve pertencem à população dos Açores e não a outra qualquer, independentemente da relação hierárquica que esse instituto estabeleça com os seus congéneres. O sentido de posse, ou pertença, se entendido de forma estrita, é, todavia, frágil, como o consulente muito bem demonstra. O sentido predominante é o de lugar, e a preposição mais frequente para designar esse tipo de relação é a preposição em, embora a preposição de também possa ser usada em alguns contextos em que designa o lugar. Em «casa de campo», por exemplo, «de campo» tem o sentido de lugar, embora lhe possam ser associados sentidos outros.
Voltando à expressão que apresenta, na sua globalidade, podemos apontar-lhe diversos níveis hierárquicos e diversos níveis de relação: numa primeira instância, ou num nível mais elevado, temos «Instituto». Num segundo nível, introduzido pela preposição de, encontra-se o complemento do nome (em gramática tradicional, complemento determinativo) «de Gestão»; por sua vez «gestão» está num nível mais elevado do que o complemento que se lhe liga: «da Reinserção Social», no qual «social» surge ainda hierarquicamente abaixo de «reinserção». Com uma relação menos forte, temos o modificador (poderíamos chamar-lhe, até, complemento circunstancial para salientar que tem uma ligação menos forte com o elemento mais alto, «instituto», do que acontece com os complementos anteriores; mas a designação preferida pela gramática tradicional seria a de determinativo):
Instituto
de Gestão (complemento do nome instituto — ou, na gramática tradicional, complemento determinativo)
da Reinserção (complemento do nome gestão)
Social (modificador do nome reinserção)
dos/nos Açores (modificador do nome instituto ou, melhor, de toda a expressão anterior: «Instituto de Gestão da Reinserção Social»
Repare que o facto de, aparentemente, «de Gestão» e «dos Açores» estarem ao mesmo nível não implica que tenham o mesmo tipo de relação, sendo a relação estabelecida entre «Instituto» e «Gestão» muito mais forte do que a relação que liga a mesma palavra a «dos Açores».
Não comento, por incompetência, o teor mais jurídico, digamos assim, do seu texto. Limito-me a fazer a análise gramatical da expressão em apreço, que é a única que sei fazer, partindo do princípio que a expressão em análise é um título que tem um sentido comum, independentemente do valor jurídico que lhe possa ser atribuído. É no âmbito da língua portuguesa e sua terminologia que tenho dificuldade em perceber de que forma pode o nome, ou título, ou designação, de uma instituição ser visto como acto ilocutório, uma vez que o conceito subjacente a essa expressão, enquanto acto de fala que é, prevê a existência de uma situação de comunicação entre dois interlocutores e, se assertivo, implica que haja da parte do locutor intenção de veicular verdade sobre um determinado estado de coisas.