DÚVIDAS

Ceide (e não "Seide")

Muito grato ficarei se me for prestado esclarecimento sobre a forma correcta de escrever o topónimo onde se localiza a Casa de Camilo Castelo Branco: "Ceide" ou "Seide". Embora não sendo especialista na matéria, choca-me ver que as duas formas se encontram aplicadas nos sinais informativos instalados nas diversas vias de acesso a essa localidade, pois, em minha modesta opinião, tal facto não só contribui para que se tenha uma desfavorável imagem sobre as entidades que deveriam velar, e não velam, pela correcção desta anómala situação, como pode induzir em erro os forasteiros desconhecedores desta dualidade e não os ajudar a chegar ao destino correcto. Por isso me parece que tais entidades deveriam adoptar e aplicar a forma correcta, que penso deverá ser uma e só uma.

Grato pela atenção que me possa ser dispensada.

Resposta

A forma tida por correta, tanto no contexto do atual Acordo Ortográfico como no da anterior norma, é Ceide, e é esta que deve ser favorecida.

É de notar, porém, que, ao falar-se de topónimos, nem sempre é possível identificar a forma que se pretende apresentar como certa, porque, ainda que se pense que é correta a grafia tradicional de muitos nomes de lugares, vem depois a descoberta de que a tradição não é nem tão antiga como se julga, nem tão rigorosa assim na perspetiva da história da língua tomada globalmente. Esta consideração vem bem a propósito de vacilação entre Ceide e "Seide".

Tendo em conta os princípios da ortografia do português, desde a sua definição (e redefinição) com a reforma ortográfica de 1911 até hoje, a forma mais correta é Ceide. No que concerne ao uso dos grafemas c e s, antes de e ou i, o critério tem sido histórico (etimológico), tendo sobretudo em conta a documentação medieval e a prática de escrita quinhentista, nas quais, geralmente, c e s marcavam segmentos fónicos diferentes (cf. A diferença uma consoante africada e uma fricativa). No caso do topónimo em causa, e não entrando em pormenores grafemáticos nem fonológicos, as atestações medievais do século X ao XV apresentam c e ç iniciais (às vezes, z também), mas nunca s (cf. Ceide, em José Pedro Machado, Dicionário Etimológico Onomástico da Língua Portuguesa: Ceide, Zeide, Zaide, Ceidi, Çaide). Sendo assim, embora não possa hoje usar-se ç (nem z) em início de palavra para indicar a fricativa surda – çapato é hoje sapato –, é lícito c começar palavra antes de e ou i, se a história da língua o permitir. Daí, dever escrever-se Ceide.

Contudo, a neutralização do contraste fonológico subjacente à distribuição de c e s antes de e e i levou a que muitas vezes se escrevesse s em lugar de c, o que explica não só a grafia "Seide" como outras (por exemplo, Sezures ou "Serzedelo"). Estas formas com s enraizaram-se de tal maneira, que, muitas vezes, fazem parte da identidade local, e são preferidas pelas populações às formas mais compatíveis com a ortografia contemporânea e com os seus critérios filológicos mais exigentes.

De qualquer modo, à luz da história medieval e da ortografia atual, a forma que deve recomendar-se é Ceide, e não "Seide".

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