Não me parece que haja um equivalente exato em língua portuguesa. Este termo italiano é relativamente recente: não deverá ter muito mais de 20 anos, e há quem diga que foi cunhado pelos ativistas da Liga Norte, partido italiano fundado em 1991. Ora, este partido, que começou a aparecer de forma mais consistente na cena política do país a partir de 1994, tornou-se conhecido pela severidade com que encarava a criminalidade e as formas de punição da mesma. O termo buonismo (derivado do adjetivo buono, que quer dizer «bom») destinar-se-ia então a tachar a atitude contrária relativamente à criminalidade, ou seja, uma postura paternalista ou condescendente no que toca a este fenómeno.
Trata-se de um termo encontradiço nos meios políticos e jornalísticos, se bem que o seu uso não se limite a estes níveis da língua. De modo geral, refere-se a uma aplicação magnânima ou benevolente das leis, embora o seu uso se estenda também a outros campos, sempre nesta linha semântica. Seja como for, é normalmente pejorativo, ou mesmo escarnecedor. Seguem-se dois exemplos da sua aplicação recente.
Por ocasião do trágico naufrágio ao largo de Lampedusa, que vitimou trezentas pessoas, houve um jornal italiano (Il Giornale, publicado em Milão e conotado com a direita) que na sua manchete falava em «Trecento morti di buonismo», à guisa de crítica às autoridades que, de forma benevolente, teriam alegadamente deixado essas pessoas entrar sem controlo no país. Nos últimos dias, fala-se novamente de buonismo em Itália, a propósito da situação nas cadeias, que estão sobrelotadas. Os buonisti pretendem uma amnistia, enquanto os seus contrários exigem que os reclusos permaneçam nas prisões, e, caso estas não sejam suficientes, pugnam pela construção de mais presídios, para obstar à libertação dos condenados. Uma legge buonista é uma lei que permite que os reclusos, depois de cumprir certo tempo de pena, possam sair durante o dia, trabalhar fora da penitenciária, ficar em prisão domiciliária, etc.
Quanto à tradução do termo, podemos verificar, pelo acesso a memórias de tradução disponíveis em linha, que alguns tradutores optam por manter o vocábulo italiano, entre aspas ou em itálico, enquanto outros arriscam versões mais ou menos acertadas com recurso à prata da casa: «angelismo», «ingenuidade», «desejo de agradar», «facilitismo», «atitude indulgente», etc. A própria profusão de propostas deixa antever a dificuldade, ou quiçá a impossibilidade, de verter convenientemente este termo italiano. Em fóruns de discussão em inglês, nota-se o mesmo embaraço...
De todos os termos elencados no parágrafo anterior, estou em crer que aquele que mais se aproxima (ou o que menos se afasta...) será facilitismo. De facto, existe algo em comum entre a atitude de buonismo e a de facilitismo, e os efeitos práticos de uma e outra são idênticos. No entanto, estas atitudes diferem bastante na motivação: enquanto o facilitismo advém de inércia ou negligência, o buonismo, pelo menos na sua essência, provém de um grau exacerbado de benevolência.
Por último, refira-se que, no português falado aquém-Atlântico, existe o termo porreirismo, sobretudo na sua variante nacional-porreirismo, o qual, salvo melhor interpretação, designa certa forma de buonismo tipicamente luso, com traços evidentes de facilitismo. No entanto, este termo provém do coloquialismo porreiro, frequente em Portugal mas desconhecido no Brasil, onde equivale a bacana ou legal, segundo creio.