Orlando Neves (Dicionário de Expressões Correntes, Lisboa, Círculo de Leitores, 2000), António Nogueira Santos (Novos Dicionários de Expressões Idiomáticas, Lisboa, Edições Sá da Costa, 1990) e Guilherme Augusto Simões (Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1993) atestam a existência na língua portuguesa da expressão corrente «comer (muito) queijo» com o significado de «ser esquecido», «ter má memória».
A origem desta expressão portuguesa pode explicar-se pela relação de causalidade que, em séculos anteriores, era estabelecida entre a ingestão de lacticínios e a diminuição de certas faculdades intele(c)tuais, especificamente a memória. A comprovar a existência desta crença existe o excerto da obra do padre Manuel Bernardes Nova Floresta, relativo aos procedimentos a observar para manter e exercitar a memória: «Há também memória artificial da qual uma parte consiste na abstinência de comeres nocivos a esta faculdade, como são lacticínios, carnes salgadas, frutas verdes, e vinho sem muita moderação: e também o demasiado uso do tabaco» (Manuel Bernardes, C. O., Nova Floresta, tomo 2, título V – Beneficência, Benignidade, páginas 206 e 207).
Sabe-se hoje, através dos conhecimentos provenientes dos estudos sobre memória e nutrição, que o leite e o queijo são fornecedores privilegiados de cálcio e de fósforo, elementos importantes para o trabalho cerebral. Apesar do contributo da ciência para desmistificar uma antiga crença popular, a ideia do queijo como alimento nocivo à memória ficou cristalizada na expressão fixa «comer (muito) queijo». Esta expressão, reconhecida e utilizada no seio da comunidade de falantes de língua portuguesa como significando «ser esquecido» ou «ter má memória», é designada por expressão idiomática ou unidade fraseológica, que tem por características, no campo da fraseologia (uma disciplina no conjunto dos estudos do léxico), uma elevada frequ[ü]ência, a institucionalização pela língua devido à reprodução ou repetição e a atribuição de um significado convencional.