Estamos certamente a falar de comportamentos e atitudes que dizem muito acerca da cultura dos países ou de certas áreas geográficas. Em Portugal, existe realmente um forte condicionamento das variedades regionais por aquilo que se considera a norma, por sua vez apoiada num padrão, o do falar das classes cultas ou influentes do eixo Coimbra-Lisboa. A verdade é que este padrão está há bastante tempo descrito e valorizado como norma desde, pelo menos, o século XVIII. É um padrão curioso, porque, no contexto da variação regional, é basicamente um dialecto centro-meridional (ver classificação das variedades do português em Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, págs. 9-24), o qual, por um lado, aceita uma inovação do Sul, a monotongação do ditongo representado por ou, e, por outro, mantém em muitos contextos, como ditongo, a pronúncia do ditongo que se escreve ei, ao contrário dos dialectos meridionais (onde se diz "manera", sem ditongo). De resto, a norma do português europeu rejeita características fundamentais dos falares setentrionais: a neutralização da oposição entre /v/ e /b/, resolvida como /b/ (daí, na metade norte de Portugal, a tendência para pronunciar "baca" em vez de [v]aca ou, em alternativa, por hipercorrecção, articular "voi" em vez de [b]oi); o chamado "s apical" (que ainda hoje se ridiculariza injustamente, referindo-o como traço definidor de um estilo apelidado de «falar axim») e a consoante africada [tʃ] (ainda articulada por certos falantes em palavras como chão, chave ou chapéu), que, no Sul e em quase todo o Litoral, há muito se confundiu com o x de baixo.
A preocupação pela pronúncia correcta é certamente devedora de uma prática que se encontra nas grandes línguas imperiais europeias como o inglês, o francês, o alemão ou o espanhol, ou mesmo numa língua de cultura como o italiano. Todas essas línguas estão associadas a visões da vida política e social eivadas de uma forte exigência de unidade, das quais decorre uma noção de uso correcto. Acrescente-se que, durante o século XX, se manteve a ideia de que existia, para além de regras ortográficas, uma ortoépia, isto é, uma forma correcta de pronunciar as palavras, a que foram especialmente sensíveis certos meios, como, por exemplo, o da preparação de actores no Conservatório Nacional ou o da locução na rádio e depois na televisão.
Em relação ao caso de colite, deve dizer-se que, entre falantes do português europeu, a preocupação com o grau da abertura da vogal átona da sílaba inicial se relaciona também com o facto de a escolarização ter posto em contacto muitos falantes com formas escritas cuja pronúncia pode não ser a das regras gerais. No sentido de evitar ser notado pela pronúncia que pode trair uma origem menos ilustrada ou sofisticada, é natural que muitos falantes de português tenham dúvidas sobre certos termos, em especial sobre os provenientes de certas áreas especializadas.