O verbo valĕo, vales, valēre, valŭi, valĭtum, que deu origem ao nosso valer, tinha vários significados em latim. Um deles, que nos interessa particularmente neste caso, pode traduzir-se por «ter saúde, estar são, estar bem de saúde, passar bem». Serviam-se os romanos amiúde deste verbo, não só para indagar sobre o estado de saúde de alguém (por exemplo, ut vales? ou quomodo vales?, «como estás?», «como tens passado?»), mas também como fórmula de despedida epistolar. Para este último efeito, recorriam ao imperativo singular vale! («passa bem!», «fica bem!») ou plural valete! («passai bem!, ficai bem!»), consoante o número de destinatários da missiva. Por vezes, para reforçar os votos, juntavam ao imperativo um advérbio, como bene («bem»), recte («como deve ser») ou feliciter («venturosamente”). Havia outras variantes, como fac valeas ou fac ut valeas (literalmente, «faz por estar bem»), que corresponde ao nosso «cuida-te», «tem cuidado contigo», e cura ut valeas, com o mesmo significado.
Esta fórmula de despedida epistolar, com as suas variantes, manteve-se ao longo de toda a latinidade, mesmo quando o latim deixou de ser uma língua nacional. Por exemplo, na obra Latim Renascentista em Portugal (Instituto Nacional de Investigação Científica, Coimbra, 1985), da autoria de Américo da Costa Ramalho (1921-2013), figuram várias cartas em latim, escritas por escritores e intelectuais portugueses dos séculos XV e XVI, e quase todas elas terminam com a fórmula vale, que o insigne académico traduziu umas vezes por “adeus” e outras por “passa bem”. Noutra obra (António Alberto de Andrade, Vernei e a Cultura do seu Tempo, Acta Universitatis Conimbrigensis, 1966, p. 568), depara-se-nos uma carta em latim, do punho do historiador Alessandro Borgia (1682-1764), parente afastado do célebre papa Alexandre VI (1431-1503) e então arcebispo de Fermo, escrita no dia 24 de maio de 1748 em Francavilla d’Ete e dirigida ao nosso Luís António Verney (1713-1792), na qual se pode ler a seguinte fórmula de despedida: Fac ut valeas, teque a me diligi scias atque amari («Passa bem e fica a saber que contas com a minha estima e carinho»).
Com o tempo, a fórmula de despedida epistolar dos romanos acabou por ganhar terreno também em todo o género de obras escritas em latim, particularmente naquelas em que o autor pretendia manter certa intimidade com o leitor. Algumas obras terminavam com a fórmula Vale, lector amice ou Vale, amice lector («Passa bem, amigo leitor», ou, simplesmente, «Adeus, amigo leitor»), podendo o termo Vale considerar-se, no caso dos livros, uma simplificação da expressão completa. Dado o prestígio da língua latina, é natural que Vale (ou Valete, no plural) tivesse ganhado terreno igualmente em obras escritas em português ou noutras línguas. Por exemplo, Fernando Pessoa (1888-1935), na sua magnífica Mensagem, despede-se da seguinte forma: Valete, Fratres («Passai bem, Irmãos»).