Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Na frase «come as ameixas!», como resposta, diz-se "come-as tu", ou "come-las"? "Comei-as vós", ou "comei-las vós"?

Tanto quanto sei, digo sempre "come-as" e "comei-as", mas já me disseram que não é assim!

Agradecia esclarecimento!

Resposta:

Vejamos a resposta sem omitir «as ameixas»: 

1. «Come as ameixas tu»;

2. «Comei as ameixas vós».

Nas duas respostas percebemos que o verbo comer, conjugado no imperativo, na segunda pessoa do singular e na segunda pessoa do plural, termina em -e (1) e em -ei (2). Ora, estas terminações não preveem nenhum tratamento especifico quando optamos por utilizar o pronome do complemento direto, assim, o correto será: «come-as tu» e «comei-as vós». 

Para agregarmos o  ao pronome do complemento direto o verbo teria de terminar ou em -s ou em -r, como por exemplo:

3. «Tu comes as ameixas» – «Tu come-las»;

4. «Vós comeis as ameixas» – «Vós comei-las»; 

5. «Tu vais comer as ameixas» – «Tu vais comê-las». 

Pergunta:

Podemos dizer que contrastar e comparar são sinónimos?

No Dicionário Priberam, as aceções 6 e 7 dão-me a ideia de que sim, mas gostava de confirmar por esta via.

Obrigado

Resposta:

Os verbos contrastar e comparar são efetivamente sinónimos quando ambos relacionam duas ou mais coisas para procurar as relações de dissemelhança ou de disparidade que entre elas existam. Veja-se os exemplos:

1. «Comparou uma declaração com a outra»;

2. «Contrastou uma declaração com a outra». 

Pergunta:

Sei que não devemos dizer «ao nível de» quando pretendemos empregar o sentido de «no âmbito de».

Mas é correto dizer «A crise fez com que Portugal se atrasasse a todos os níveis»?

Resposta:

A expressão «a todos os níveis» em «a crise fez com que Portugal se atrasasse a todos os níveis» é completamente aceite. A mesma encontra-se registada, por exemplo, no Dicionário Estrutural, Estilístico e Sintático, de Énio Ramalho, com as seguintes  abonações: «A semana em curso tem ainda grandes novidades a apresentar… a todos os níveis de ação política e militar» (em todos os escalões);  «Houve reuniões a todos os níveis para tratar do problema da escolha dos novos comandos» (em todos os escalões hierárquicos); e «As manobras para a conquistado poder a todos os níveis.». Note-se que a expressão pode também ser introduzida pela preposição em: «A crise fez com que Portugal se atrasasse em todos os níveis.»

De ressaltar ainda que, ao contrário do que se afirma na pergunta, a expressão «ao nível de», na aceção de «no âmbito de»/«no domínio de», «à mesma altura» e «no mesmo plano de igualdade», e seguida de expressão nominal, tem uso aceite e atestado em Portugal (cf. dicionário da Academia das Ciências de Lisboa). No entanto, a expressão é vista com certa reserva no Brasil, cujos gramáticos normativos rejeitam geralmente uma forma parecida, «a nível de», por se tratar de modismo em lugar das preposições de, como e no (cf. Maria Helena Moura Neves, Guia de Uso do Português, UNESP, 2...

Pergunta:

Gostaria de saber se "Reich" deve ser escrito em itálico.

Resposta:

O termo Reich, atestado nos dicionários com o significado de «império, nação», deve, efetivamente, grafar-se em itálico. Trata-se de um termo alemão tradicionalmente usado para designar uma variedade de países soberanos, nomeadamente a Alemanha, em muitos períodos da sua história. Assim, se optarmos pela expressão alemã, devemos sim dar-lhe o tratamento previsto para um estrangeirismo (em muitos jornais, por exemplo, passa por se colocar entre aspas).

Pergunta:

Tenho uma pequena dúvida: regendo o verbo dissociar a preposição de («É necessário dissociar a água do fogo», por exemplo), o mais correto é dizer e escrever, por exemplo, «... para uma maior dissociação económica da China», e não «com a China»?

Estou certo, ou estarei a incorrer nalgum erro?

Obrigado.

Resposta:

O verbo dissociar1 pode, efetivamente, ser regido pela preposição de, enquanto transitivo direto e indireto, e não é, por outro lado, regido pela preposição com.

À semelhança deste verbo, o substantivo feminino dissociação tem o mesmo comportamento, ou seja, não ocorre com a preposição com. Assim, o correto será termos «... para uma maior dissociação económica da China...».

 

1 O verbo dissociar pode também ocorrer sem qualquer preposição enquanto verbo transitivo direto: «O estudo dissociava iliteracia e analfabetismo».