Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Encontrei uma palavra num trabalho universitário e gostava que me dissessem se existe em português de Portugal. A referida palavra é sobreconfiança. Conheço a versão «sobre confiança», mas nunca me tinha deparado com este substantivo agregado a uma preposição. Isto é válido?

Obrigado

Resposta:

O substantivo sobreconfiança existe na língua portuguesa e é válido, sendo formado pelo prefixo sobre- e pelo substantivo confiança. De acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa da Infopédia, sobre- é um elemento de formação com origem no latim super, que veicula a ideia de superioridade, excesso ou intensificação. Assim, sobreconfiança significa «confiança em excesso» ou «confiança exagerada».

Por outro lado, a expressão «sobre confiança», escrita separadamente, tem um significado distinto, relativo a algo que se refere a confiança: «este texto fala sobre confiança», i.e., «este texto fala acerca de confiança». 

 A degradação das plataformas digitais
O anglicismo enshittification

O neologismo inglês enshittification descreve o processo de degradação de serviços e produtos, especialmente os digitais, à medida que se priorizam estratégias voltadas para o lucro em detrimento da experiência do utilizador. Se o traduzíssemos para português, como ficaria? "Enshitificação", "embostificação", "merdificação" seriam opções aceitáveis, ou a perífrase «degradação das plataformas em linha» é mais adequada? A esta pergunta responde a consultora Sara Mourato, num texto em torno de um anglicismo que ganhou vida em 2022.

Pergunta:

Tendo consultado as vossas explicações, fiquei, todavia, em dúvida. Na frase apresentada, a preposição é necessária?

«Sei que ficaria mais fácil de escrever um texto que se lesse.»

Cordialmente

Resposta:

Com base na análise gramatical das construções com fácil (ou difícil ou impossível) (Gramática do Português, pág. 1940), a preposição de não deve figurar na frase em causa: «Sei que ficaria mais fácil escrever um texto que se lesse.»

Na frase em questão, a forma verbal «sei» seleciona um complemento direto realizado como oração subordinada substantiva completiva finita: «... que ficaria mais fácil escrever um texto que se lesse.»

Nesta oração, o predicado é «ficaria mais fácil» e o sujeito é a sequência «escrever um texto que se lesse», uma oração subordinada substantiva completiva de infinitivo. A ordem de constituintes da oração completiva finita está invertida (ordem inversa), uma vez que o predicado «ficaria mais fácil» vem antes do sujeito. Tanto na ordem inversa, como na ordem direta, a sequência «escrever um texto que se lesse ficaria mais fácil» não pode ser introduzida pela preposição de: *«... ficaria mais fácil de escrever um texto que se lesse», *«de escrever um texto que se lesse ficaria mais fácil» (o asterisco indica incorreção).

A preposição de só seria utilizada se a frase estivesse conforme a construção com valor passivo «alguma coisa ser fácil/difícil/impossível de» + infinitivo: «Este é um texto fácil de escrever» (= «este é um texto que é escrito facilmente»). Não é o caso. 

«Todos ansiam»?!
Caprichos flexionais dos verbos em -iar

Bruno Lage, ao afirmar que «o que interessa é responder da forma que todos ansiam», chamou a atenção para a conjugação correta do verbo ansiar.

 

Pergunta:

Se eu tiver um software que eu chamei "Prox", teria de me referir a ele como "O Prox" ou "A Prox", se eu decidir não fazer menção à palavra software na oração?

Se pudesse ter uma explicação sobre o assunto seria ótimo!

Obrigada

Resposta:

No caso de Prox,  o nome termina com um x, o que não dá indicação clara de género, mas, como a maioria dos nomes de software segue o género masculino por convenção, já que programa e sistema e outros termos relacionados são masculinos, pode  assumir-se que se dirá «o Prox». À sua semelhança temos «o Linux», «o Photoshop», «o Excel», entre outros, que seguem a mesma lógica de atribuição do género masculino.