Pedro Mateus - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Pedro Mateus
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Pedro Mateus, licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, Estudos Portugueses e Franceses, pela Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa; mestrado em Literaturas Românicas, na área de especialização Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea pela mesma Faculdade.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Numa “Ficha de Inscrição e Avaliação Inicial de Requisitos”, que me foi dirigida pela instituição que apoia o meu único filho, deficiente, para que eu a complete com dados, eventualmente, em falta, sou chamado de Significativo. Para melhor compreensão, alguns exemplos: «Dados a preencher pelo/com utente e significativos; Expetativas do Candidato e dos Significativos; Residentes fora do concelho de S. João da Madeira, mas cujos significativos exerçam atividade profissional neste concelho; Assinaturas – do Candidato – do Significativo».

Como podem adivinhar, a minha pergunta é: no contexto dos exemplos acima, está correta a aplicação de significativo(s)? Eu sei que todos nós podemos ser significativos para muitas pessoas, mas, neste caso, eu preferia continuar a ser encarregado de educação ou representante legal.

Agradeço, desde já, o vosso esclarecimento e, também, o extraordinário serviço que continuam a oferecer.

Resposta:

De facto, «Modelos de Avaliação da Qualidade das Respostas Sociais», desenvolvidos pelo Instituto da Segurança Social, IP (ISS, IP) «com o objectivo de constituir um referencial normativo que permita avaliar a qualidade dos serviços prestados e consequentemente diferenciar positivamente as Respostas Sociais», apresentam a seguinte definição oficial de significativos: «familiares, responsáveis pelo cliente, tutores, entre outros».

Deste modo, e respondendo diretamente à questão apresentada pelo estimado consulente, sim, parece estar correta a utilização do vocábulo significativo no quadro do exemplo sugerido. Efetivamente, esta parece ser a designação proposta pelas entidades oficiais que regulam o acesso ao tipo de apoios sociais aqui elencados.

Contudo, julgo que valerá a pena referir que nenhum dos instrumentos linguísticos de referência consultados apresenta uma definição do referido vocábulo que seja diretamente compatível com a aceção aqui em análise.

Pergunta:

Queria saber se o texto argumentativo é um texto onde se encontra o acto directivo directo.

Resposta:

O texto argumentativo desenvolve «um raciocínio com o fim de defender ou repudiar uma tese ou ponto de vista, para convencer um oponente, um interlocutor circunstancial ou a nós próprios» (Carlos Ceia, E-Dicionário de Termos Literários).

Os atos diretivos têm como finalidade principal «levar o interlocutor a agir de acordo com o conteúdo proposicional do ato de fala (ordens, pedidos, convites, sugestões, etc.)» (Dicionário Terminológico, DOMÍNIO C: ANÁLISE DO DISCURSO, RETÓRICA, PRAGMÁTICA E LINGUÍSTICA TEXTUAL).

Deste modo, e tendo em conta as definições sugeridas, creio que facilmente se entenderá que será de esperar a existência de uma possível estreita relação entre textos argumentativos e atos ilocutórios diretivos, diretos ou indiretos.

Leia-se, apenas a título de exemplo, estes excertos retirados do Sermão de Santo António aos Peixes, de Padre António Vieira:

«Considerai, Pregadores vivos, como morreram os outros que se pegaram àquele peixe grande [...].»

«Dizei-me, Voadores, não vos fez Deus para peixes? [...] Contentai-vos com o mar, e com nadar, e não queirais voar, pois sois peixes. [...] Olhai para as vossas espinhas, e para as vossas escamas, e conhecereis que não sois ave [...].»

«À vista deste exemplo, Peixes, tomai todos na memória esta sentença [...]. Ouvi o caso raro de um voador da terra [...]. Não quero que repareis no castigo, senão no género dele.»

«Louvai, Peixes, a Deus, os grandes, e...

Pergunta:

Ouço diária e insistentemente numa estação de rádio a frase seguinte, que me parece incorreta: «Todas as músicas que sabem bem ouvir.»

Esta frase, tal como é dita, parece querer significar que as músicas é que sabem ouvir, e até muito bem(!) quando o que creio que o autor da frase deverá querer significar é que nos sabe bem ouvir todas essas músicas.

Tendo como propósito este último significado, não se deveria dizer: «Todas as músicas que sabe bem ouvir»? Gostaria de conhecer a vossa opinião sobre estas questões (correção e significado).

Resposta:

De facto, tendo em conta a forma como o enunciado está construído, parece não haver dúvidas de que o verbo saber concorda com o constituinte músicas, sendo este o antecedente do pronome relativo que.

Assim, a não ser que haja efetivamente um erro de natureza sintático-semântica na construção da frase, dificilmente poderemos entender a mesma à luz mais restrita do significado da locução «saber bem» («ser saboroso; satisfazer o apetite; ter bom gosto, agradar» – Dicionário Houaiss; Infopédia): «Todas as músicas que sabe bem ouvir.»

Contudo, como refere o prezado consulente, trata-se, pelo que entendo, de uma espécie de spot publicitário adotado por uma rádio portuguesa. Deste modo, e tendo em conta o contexto específico em que se enquadra a referida frase, julgo que a podemos interpretar tendo em conta um escopo, digamos, mais criativo.

Assim, penso que não será descabido se aceitarmos a existência da elipse, por exemplo, do pronome vocês, entre os constituintes músicas e sabem, como forma de estabelecimento de pontes de contacto entre a rádio e o próprio ouvinte: «As músicas que (vocês) sabem bem ouvir», ou até – porque não? – de uma espécie de personificação das próprias músicas escolhidas pela estação radiofónica em causa: «As músicas que sabem bem ouvir (os gostos dos nossos ouvintes).» Neste caso, os responsáveis pelo referido spot poderiam eventualmente estar a querer dizer que, nesta rádio, escolh...

Pergunta:

Gostaria de saber a origem da palavra argamassa.

Na pesquisa remetem-me para o castelhano argamasa. No entanto, em espanhol (mortero), francês (mortier) e inglês (mortar), a origem é sempre a mesma: mortarîum.

Caso seja possível, pedia para me informarem o significado e quando surgiu a palavra mortarîum.

Se houver alguma razão para se usar uma palavra com origem espanhola, também gostaria de saber.

Resposta:

No que diz respeito à última pergunta apresentada pela consulente, remeto para esta resposta de Carlos Rocha, que me parece suficientemente esclarecedora.

Mortarium, ĭĭ é uma palavra latina, que significa «almofariz, gral; O que é preparado num almofariz, droga, pomada» (Dicionário de Latim-Português, Porto Editora). Segundo o Le Nouveau Petit Robert de la Langue Française, 2009, esta é uma palavra que remonta ao século XII, mais concretamente a 1190.

Valorize-se igualmente o facto de este vocábulo — mortarium — ser ainda atualmente usado na língua inglesa, para designar justamente alguns tipos específicos de objetos da olaria romana (Oxford English Dictionary; Wikipedia).

Relativamente à origem da palavra argamassa, parece ser difícil de garantir, de acordo com os instrumentos linguísticos consultados, a sua verdadeira proveniência e composição. O Dicionário Houaiss e o Aulete Digital, por exemplo, limitam-se a referir que esta é uma palavra de «origem controversa», e o Aurélio nota que se trata de um vocábulo composto por um «elemento obscuro + massa». Já a Infopédia garante-nos efetivamente a sua proveniência castelhana, «Do castelhano argamasa, idem». Por sua vez, o Dicionário da Real Academia Espanhola atesta a existência do vocábulo argamasa, mas nada nos diz sobre a sua proveniência ou processo de composição. Outros instrumentos linguísticos ainda, como, por exemplo, o

Pergunta:

Tenho algumas questões a respeito do correto uso de algumas palavras próprias da minha área de estudo, a biologia.

Que forma é preferível enquanto sufixo para indicar hidratos de carbono: -sacarídeo, ou -sacárido?

Resposta:

De acordo com a generalidade dos dicionários consultados, as duas formulações — -sacarídeo ou -sacárido (do grego sákkharon, «açúcar», pelo latim sacchăru-, «idem» + -ido) — podem ser utilizadas, sem qualquer distinção aparente (Infopédia, Priberam).