Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Tenho ouvido falar no termo "jidro" ou "gidro", como sendo relativo a coisas boas, das melhores, como por exemplo, «este vinho é do gidro (ou jidro)».
Não encontro significado em nenhuma consulta que fiz, pois creio tratar-se de termos com raízes populares. Assim, solicito a v/ajuda no sentido de confirmar ou não esta minha suposição.

Resposta:

Quererá o consulente dizer «gido», provincianismo beirão, adjectivo que significa «jeitoso», ou «gídio», vocábulo de gíria que significa «bom, belo»?

Pergunta:

Gostaria de saber o significado da expressão "noblesse oblige" tanto utilizado pelo José Castelo Branco na Quinta das Celebridades (TVI).
Grata pela a ajuda.

Resposta:

"Noblesse oblige" significa, à letra, "nobreza obriga". Esta expressão é utilizada quando se pretende dizer que o facto de pertencer a uma família de prestígio ou ter uma certa posição social ou ter um nome honrado ou famoso obriga a proceder de uma forma adequada, à altura do nome que se tem.
Dava-se o nome de nobreza a um conjunto de indivíduos que gozava de uma categoria social privilegiada, com direitos superiores aos da maioria da população, em virtude de uma transmissão legal hereditária. Nas sociedades primitivas, quando os homens mais fortes e mais hábeis se tornavam chefes de tribos ou de clãs, constituíam um corpo de indivíduos que os apoiava e que adquiriam prestígio em virtude do poder do seu chefe. Mais tarde, a riqueza ou a influência política muitas vezes permitiram aos seus possuidores usufruir de uma superior categoria social; por outro lado, a capacidade intelectual ou os feitos militares ou outros podiam ser recompensados por uma distinção social hereditária.
A distinção social associada à nobreza faz com que esta palavra também seja usada quando se fala em elevação de sentimentos ou de conduta, ou seja, pode falar-se de nobreza de sangue mas também de nobreza de carácter. A um nobre exige-se que se comporte como tal, ou seja, que tenha uma conduta elevada, acima de qualquer crítica, considerando-se, pois, mais reprovável uma acção indecorosa, desonrosa, num nobre do que noutra pessoa, já que o seu estatuto social o obriga ao dever de ter um comportamento exemplar.
Quanto à utilização da expressão «noblesse oblige» por uma determinada pessoa, desconheço o contexto em que ela foi ou é usada. Apenas poderei dizer que o estatuto de nobreza antigamente obrigava a que os nobres não trabalhassem num ofício nem fossem actores a troco de dinheiro, considerado um vil metal.

Pergunta:

Pensando que poderá arrumar de vez a questão da função de «A homem pobre» na frase «A homem pobre ninguém roube»», gostaria apenas de perguntar à Sr.ª Dr.ª Maria Regina como se deveria então classificar tal sintagma se o provérbio fosse «A homem pobre ninguém tire»...? Arruma a questão, não arruma? Pode ser complemento indirecto e, neste provérbio-variante, é-o mesmo!
Ansioso por um "feed-back" ("retroacção"? Algo obscuro... "resposta"? Algo estreito... Como traduzir aqui?)
Obrigado.

Resposta:

Se a frase fosse «A homem pobre ninguém tire...», estaria incompleta, pois exigiria que se perguntasse «Ninguém tire o quê?», esperando-se que a oração fosse completada com um qualquer complemento directo, visto, neste caso, o termo «a homem pobre» ser o complemento indirecto.
Mas a frase «A homem pobre ninguém tire...» não é equivalente a «A homem pobre ninguém roube», como passo a explicar.

1.º A frase que o consulente apresenta não está completa. Nesta frase, o verbo «tirar» exige um complemento directo expresso na oração. Não estando esse complemento directo expresso, a frase não é sentida como completa. Pelo contrário, a frase «A homem pobre ninguém roube» não exige mais nada; é sentida como completa tal como está.

2.º Isto acontece porque o verbo «tirar» não tem rigorosamente o mesmo significado do verbo «roubar». Na frase que o consulente apresenta, o verbo «tirar» tem o sentido de «privar de», «subtrair fraudulentemente» algo a alguém, enquanto no provérbio o verbo «roubar» significa «despojar», «espoliar», «esbulhar», acepções estas que o verbo «tirar» não contém.

3.º Na primeira resposta que dei a esta pergunta, explicitei que, se o provérbio estivesse construído de outra forma, com dois complementos expressos, então o verbo «roubar» estaria utilizado na simples acepção de «tirar» algo a alguém, podendo o termo «a homem pobre» ser um complemento indirecto, como, por exemplo, na frase «Ninguém roube o pão a um homem pobre», que – esta, sim – é uma frase equivalente a «Ninguém tire o pão a um homem pobre». Mas essa seria uma outra frase, que não está aqui em análise.

4.

Pergunta:

Podem dizer-me qual a origem da expressão «à papo-seco»?
Obrigada.
Bom ano.

Resposta:

Segundo a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, papo-seco é um termo popular que designa um indivíduo apurado no trajar, janota, casquilho, peralta, taful. A designação é proveniente de gíria de tavolagens (ou tabulagens = casas de jogo) e vem do espanhol, onde tem significação em forma obscena de “impotente sexual” (papo = testículo), tendo sido aplicada insultuosamente pelo pessoal galego dos restaurantes instalados em casas de jogo para designar certos sujeitos bem-postos que, ameaçando com provocar o encerramento desses estabelecimentos proibidos por lei, faziam pagar sob a forma de banquetes grátis a sua complacência em não efectuar a denúncia.

Pergunta:

O povo, pelo menos o povo nortenho [em Portugal], quando quer dizer que uma coisa «não fica à mão», utiliza a expressão «fica à desamão».
Ora, a expressão não me soa muito bem, e a minha bíblia da língua, o Houaiss, não parece resolver o problema.
É que «fora de mão» não parece ser a expressão equivalente ao que se pretende dizer.
Neste caso, ficar «à mão» é ficar próximo, ou «a jeito».
E o contrário? Pode ser o que diz o povo?
Obrigado.

Resposta:

A expressão “à desamão” está correcta. Significa «fora de mão», «fora de jeito», «fora de caminho» e está registada, por exemplo, na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira e no Grande Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora (2004).