Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Mal ou mau.

Gostaria de saber o conceito, a origem desta regra de ortografia.

Resposta:

Em Portugal, "mal" pode ser um substantivo, um advérbio ou uma conjunção. Como substantivo, a palavra varia em número (singular – mal; plural - males). Como advérbio e conjunção, é invariável.

Ex.:

   1. O bem pode vencer o mal. (substantivo)
   2. São muitos os males de que ela padece. (substantivo)
3. O trabalho está mal feito. (advérbio)
   4. A vida corria-lhe mal. (advérbio)
   5. Mal ele chegou, ela saiu. (conjunção subordinativa temporal)

A palavra "mau" é um adjectivo, caracterizando algo ou alguém, podendo também aparecer substantivado.

Como adjectivo, flexiona em género (masculino – mau; feminino – má), em número (singular – mau, má; plural – maus, más) e grau (comparativo – pior; superlativo – o pior, péssimo).

   Como adjectivo substantivado, flexiona em género (masc. - mau, fem. - má) e em número (masc. pl. - maus, fem. pl. - más).

Ex.:

   1. Ele tem mau feitio. (adjectivo)
   2. Essa foi uma escolha. Pior do que a anterior. Melhor dizendo, uma péssima escolha. (adjectivo)
   3. Os maus vão para o Inferno e os bons para o Céu. (adjectivo substantivado)

No Brasil, na expressão oral, muitas vezes o l aparece vocalizado em u /w/, confundindo-se "mal" com "mau".

Pergunta:

Tenho dúvida sobre encontros consonantais.

Sei que existe encontro consonantal em Brasil, flor, apto, gnomo.

Quero saber se em carta e testa também ocorre encontro consonantal.

Sou brasileira, professora até a quarta série e moro no Distrito Federal.

Resposta:

Existe encontro consonantal sempre que há agrupamento de duas ou mais consoantes num vocábulo. Em Português, considera-se que esses grupos de consoantes são próprios quando constituídos pela combinação das oclusivas (p, t, c, b, d, g) e da fricativa f com as consoantes l e r, e impróprios os restantes.

Os grupos consonânticos próprios, chamados no Brasil de encontros consonantais inseparáveis, fazem parte da mesma sílaba e são os seguintes: pr, br, tr, dr, cr, gr, fr; pl, bl, cl, gl e fl.

Ex.: prato, com-prido, branco, Brasil, trazer, minis-tro, pedra, crime, grande, francês, plano, bloco, claro, glicose, flauta,

Pergunta:

Sei a definição de neologismo, mas continuo sem ententer o que é. Gostaria que me enviassem uma definição mais clara, contendo alguns exemplos de elementos nacionais e estrangeiros; e como esses "neologismos estrangeiros" vieram para o Brasil.

Resposta:

   Neologismos são palavras criadas para designar novas situações, conceitos, factos, objectos, etc. A palavra "televisão", por exemplo, foi criada no século XX quando surgiu uma realidade que não existia até aí. Assim, associou-se o elemento grego tele, que significa "longe", "ao longe", à palavra "visão" (do Latim visione-), que já existia em Português. Um outro exemplo pode ser o do termo "salazarismo", que designa o pensamento ou acção do político português Oliveira Salazar, ou "salazaristas", partidários do mesmo. Um exemplo actual, no Português do Brasil, é o das palavras "dolarizar" e "dolarização", termos criados a partir da palavra "dólar" para designar novas realidades.
   Como é lógico, um neologismo só é sentido como tal durante algum tempo. Tudo o que é novo só o é durante um período de tempo limitado: as pessoas são novas enquanto são jovens, os objectos são novos enquanto não têm um certo uso. Ora, com as palavras acontece o mesmo. Passados anos ou séculos, um determinado neologismo deixa de ser sentido como tal, porque a realidade que ele designa também já não é nova.
   Estrangeirismos são palavras importadas de outras línguas. Dois motivos:
   1 – por uma questão de moda ou por serem consideradas mais elegantes pelos seus utilizadores, substituindo outras que existem na nossa língua;
   2 – por designarem situações, produtos, objectos, etc., concebidos e produzidos no estrangeiro e que são importados, não se tendo encontrado ou criado em Português um termo ...

Pergunta:

Somos fabricantes de um equipamento cuja função é automaticamente posicionar, coletar e posicionar ovos em bandejas. O termo que poderia descrever exatamente a função deste equipamento seria "embandejadora" de ovos, porém não temos certeza da sua existência.

Solicitamos a gentileza de seus comentários e/ou propostas para podermos introduzir este equipamento no mercado brasileiro.

Grato.

Resposta:

Não. Essa palavra não existe.

O Dicionário Aurélio XXI regista as seguintes palavras, que poderão ser utilizadas nesse contexto:

embalador – que ou aquele que faz a embalagem de mercadorias, objectos, etc.;
embaladeira – feminino de embalador;
empacotador – que ou aquele que empacota;
empacotadora – feminino de empacotador; máquina agrícola para empacotar palha, feno, etc;
empacotadeira – o mesmo que empacotadora.

Pergunta:

Sei que não devemos ligar dois verbos diferentes a um mesmo complemento, como por exemplo: Gostei e recitei o poema. O correto seria: Gostei do poema e o recitei.   

Gostaria de saber se quando temos palavras que não são verbos, mas que são usadas com preposições diferentes, o uso de um mesmo complemento também configura erro. Por exemplo: A confiança e o amor pelo amigo... (a confiança no amigo e o amor por ele). Em suas idas e voltas da Europa (idas a Europa e voltas da Europa)...   

Obrigada desde já.

Resposta:

Não devemos ligar a um mesmo vocábulo palavras ou expressões que exigem regência diferente, escolhendo apenas uma delas. Devemos, no entanto, construir as frases de modo a, mantendo embora a natureza de cada uma das regências, não haver repetições deselegantes. Poderemos substituir substantivos por pronomes, alterar a construção frásica, introduzir um novo vocábulo que possa associar os dois termos e estabelecer a relação com o elemento comum, ou, até, deixar omissa no final uma das regências, quando a expressão o permite.

Os exemplos que deu poderiam ter, assim, as seguintes redacções:

   – a confiança no amigo e o seu amor por ele;
   – a confiança no amigo e o amor que sentia por ele;
   – a confiança que depositava no amigo e o amor que lhe tinha;
   – amava o amigo e tinha confiança nele, o que...;
   – idas à Europa e vindas;
   – viagens de ida e volta à Europa (as viagens é que são à Europa).

O que referi diz respeito à norma escrita. Oralmente, é admissível uma ou outra construção apenas com uma das preposições, o que corresponde a fenómenos pragmáticos como a marcação de um determinado tópico ou foco da frase.