Maria Eugénia Alves - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Maria Eugénia Alves
Maria Eugénia Alves
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Professora portuguesa, licenciada em Filologia Românica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com tese de mestrado sobre Eugénio de Andrade, na Universidade de Toulouse; classificadora das provas de exame nacional de Português, no Ensino Secundário. 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Existe pleonasmo vicioso na expressão «exaltação violenta»?

Obrigado.

Resposta:

     Celso Cunha e Lindley Cintra na Nova Gramática do Português Contemporâneo definem que o pleonasmo «é a superabundância de palavras para enunciar uma ideia [...] Ex.: - Saipara fora, João.(Miguel Torga, Novos Contos da Montanha, 228). 

    «O pleonasmo só se justifica para dar maior relevo ou emprestar maior vigor a um pensamento ou sentimento. Quando nada acrescenta à força da expressão, quando resulta apenas da da ignorância do sentido exato dos termos empregados, ou de negligência, é uma falta grosseira.» É este caso o do pleonasmo vicioso.

      Exemplos: «Ter o monopólio exclusivo»; «ser o principal protagonista.» Todos os monopólios são exclusivos; o protagonista é personagem principal.

      Tendo em conta esta definição, parece-nos que «exaltação violenta» se enquadra no âmbito do pleonasmo vicioso, uma vez que, por definição, exaltação é louvor entusiástico, fanatismo, excitação do espírito; irritação; zanga, encómio excessivo... (in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa) e, por isso, o adjetivo violenta não acrescenta maior vigor ao substantivo, uma vez que exaltação já encerra a conotação de violência.

Cf. 

Pergunta:

«Uma das bibliotecária aproximava-se, segurando com as duas mãos uma caixa vermelha de capa dura». Na análise sintática desta frase, um manual escolar do 10º ano identifica o segmento de capa dura como complemento do adjetivo. Não consigo entender essa classificação. Será que me podem ajudar?

Muito obrigada.

Resposta:

      O segmento de capa dura funciona na frase como modificador restritivo do nome. Este limita, restringe a realidade referida pelo nome que modifica, neste caso, caixa. A caixa não é uma qualquer, é a vermelha de capa dura (Aliás, vermelha é também modificador).

      O modificador restritivo pode ser realizado, entre outros, por um grupo adjetival (no caso de vermelha) e por um grupo preposicional (no caso de capa dura).
 

      O complemento do adjetivo é selecionado por um adjetivo, isto é, «há adjetivos que precisam de um constituinte que complete a sua significação.

Ex.: capaz de tudo; doente por futebol; parecido com o pai» (in Gramática de português, de Maria Regina Rocha, Porto Editora, 1ª ed., p. 125)

      No caso da frase em análise, o constituinte de capa dura não foi selecionado pelo adjetivo vermelha, de capa dura limita a definição da caixa, tal como vermelha

      Assim, o manual a que a consulente se refere apresenta uma incorreção, talvez resultado de gralha tipográfica.

Pergunta:

Embora tenha consultado as vossas respostas e as gramáticas de que disponho, continuo, assim como os meus colegas, a ter dúvidas no que diz respeito à classificação de último - se primeiro é um adjetivo numeral, por que razão último, que tem o mesmo comportamento "frásico", é, segundo respostas vossas e as gramáticas, um adjetivo qualificativo?!! Não tem o mesmo comportamento dos adjetivos dessa subclasse?! Na expressão «o último a chegar...», o antónimo é «o primeiro a chegar», logo, e segundo o que aprendi, tem de pertencer à mesma classe gramatical! Por favor, esclareçam - nos!

Muito obrigada.

Resposta:

    Na gramática tradicional, os adjetivos numerais designavam-se numerais ordinais

    São muitas vezes usados de forma abreviada, com vista a uma maior funcionalidade da escrita, uma vez que sua representação por extenso é complexa e pouco prática. Usa-se assim a abreviatura do número, seguida de ponto, que indica que houve eliminação de letras, seguida da terminação [º] ou [ª], que indica se o numeral é masculino ou feminino: 1.º, 1.ª, 34.º, 34.ª, …

   Na nomenclatura atual, designam-se por adjetivos numerais e «indicam a ordem ou a sucessão do que é referido pelo nome. Surgem geralmente em posição pré-nominal e podem ser precedidos de determinantes. 

      Ex. O quarto andar tem uma vista magnífica.

      Esse sexto volume tem 345 páginas.» (cf. Gramática de Português, de Maria Regina Rocha, Porto Editora)  

      Assim, se fizermos a lista dos adjetivos numerais, ela será infinita, e último não será o que veremos no fim dessa lista, pois não pertence a esta classificação.

     Último é um adjetivo qualificativo, que indica que não haverá outro posteriormente = derradeiro. Segundo o

Pergunta:

Gostaria de saber se existe algum livro ou artigo que façam uma classificação coerente e consensual dos dialetos e falares regionais brasileiros, explicitando as características de cada um. Tudo o que encontrei sobre este tema foram blogues ou outro género de publicações pouco científicas. Alguns chegam a falar de 10 dialetos e, inclusive, mais. Poder-me-iam esclarecer um pouco sobre este tema e recomendar alguma obra, por favor? Além disso, gostaria de saber qual é a diferença entre falar e dialeto. Entendo que o primeiro conceito se refere a uma variedade geográfica da língua, mas não entendo o conceito de “falar(es)”.

Muito obrigada pelos esclarecimentos.

Resposta:

Comecemos por recorrer à Nova Gramática do Português Contemporâneo¹ que, na página 4, esclarece:

«As formas características que a língua assume regionalmente denominam-se dialectos.

Alguns linguistas, porém, distinguem, entre as variedades diatópicas² o falar do dialecto.

Dialecto seria 'um sistema de sinais desgarrado de uma língua comum, viva ou desaparecida; normalmente, com uma concreta delimitação geográfica, mas sem uma forte diferenciação diante dos outros da mesma origem'. De modo secundário, poder-se-iam também chamar dialectos 'as estruturas linguísticas, simultâneas de outra, que não alcançam a categoria de língua'.

Falar seria a peculiaridade expressiva própria e uma região e que não apresenta o grau de coerência alcançado pelo dialecto. Caracterizar-se-ia, do ponto de vista diacrónico, segundo Manuel Alvar, por ser um dialecto empobrecido, que, tendo abandonado a língua escrita, convive apenas com as manifestações orais. [...]»³

No que respeita aos dialetos brasileiros, há uma insuficiência de informação rigorosa sobre as diferenças das variedades regionais que tem a ver com o extensíssimo território do país. Para Cunha e Cintra, os atlas dos Estados da Bahia e de Minas Gerais [e o Atlas Linguístico de Sergipe, coordenado pelo professor Nelson Rossi], são contributos importantes para o estudo do assunto. O proje...

Pergunta:

Na frase «Senta-te, que vais sentir-te melhor.», como devo classificar a segunda oração: coordenada explicativa, subordinada adverbial causal ou subordinada adverbial final?

Obrigada.

Resposta:

    Atentemos apenas sobre as hipóteses de coordenada explicativa e subordinada adverbial causal:

    A distinção entre o que explicativo e o causal levanta sempre algumas dúvidas, pois assenta numa natureza semântica e de interpretação da frase.

    1. Com a conjunção explicativa, estabelece-se uma relação de explicação, isto é, a segunda oração explica o acontecimento relatado na primeira:

    Ex.: «Não faças isso, que fico aborrecida.»

    As conjunções coordenativas explicativas ligam duas orações, a segunda das quais justifica a ideia da primeira. São várias: que, pois, porque, porquanto. Normalmente este porque vem antecedido de verbo no imperativo:

    «Compra o casaco, porque está frio.»

    «Não comas isso, que (= porque) não presta.»

  2.  Nas causais, a conjunção estabelece uma relação de causa:

      Ex.: Não fui à festa porque estava cansada. 

      Enquanto a causal, em geral, sugere "estar na origem de", a explicativa propõe "deduz-se de".

      Na frase em questão, deduz-se que a pessoa fica melhor, se se sentar. Não encontro uma relação de causalidade entre as duas orações...