Inês Gama - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Inês Gama
Inês Gama
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Licenciada em Português com Menor em Línguas Modernas – Inglês pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e mestre em Português como Língua Estrangeira e Língua Segunda (PLELS) pela mesma instituição. Fez um estágio em ensino de português como língua estrangeira na Universidade Jaguelónica em Cracóvia (Polónia). Exerce funções de apoio à edição/revisão do Ciberdúvidas e à reorganização do seu acervo.

 
Textos publicados pela autora
A que classe de palavras pertence <i>muito</i>?
Uma palavra que pode pertencer a várias classes

Nas frases «Este livro é muito interessante» e «Ao ler o livro fiquei com muito medo», a que classe de palavras pertence a palavra muito? Esta é a questão que funciona como ponto de partida para a dúvida da semana, apontamento de Inês Gama no programa Páginas de Português da Antena 2, em 11 de dezembro de 2022.

Pergunta:

Eu gostaria se saber se há alguma diferença semântica entre a palavra diálogo e conversa.

Os meus mais sinceros agradecimentos.

Muito obrigado!

Resposta:

Do ponto de vista semântico, diálogo e conversa são geralmente vocábulos sinónimos quando apresentam o sentido de troca de palavras entre duas ou mais pessoas.

Segundo o dicionário em linha Infopédia, diálogo significa «conversa entre duas pessoas; troca de ideias ou opiniões com o propósito de chegar a um entendimento». Quanto a conversa, tem o sentido de «troca de palavras; assunto sobre o qual se fala» (Infopédia). No fundo, com base nos sentidos apresentados, pode-se depreender que estas palavras têm usos equivalentes quando referem a troca verbal entre pessoas.

Porém, no plano literário e linguístico, de acordo com E-Dicionário de Termos Literários, de Carlos Ceia, o diálogo é entendido como «uma forma de discurso e modo de expressão literária em que dois interlocutores (o “eu” e o “tu”) se alternam reversivelmente, interagindo na comunicação, discussão e troca de ideias, informações, sentimentos, pensamentos e atitudes»1. Portanto, no âmbito da análise de texto, o termo que se usa é diálogo, e não conversa.

 

1 No Dicionário Terminológico, podem encontrar-se outros esclarecimentos sobre o uso de diálogo nos estudos linguísticos e literários: [...] Género literário e filosófico-literário que representa diversos interlocutores, com orientações espirituais, filosóficas, morais, ideológicas, esté...

Pergunta:

As seguintes frases estão ambas certas, ou apenas a primeira?

«Os funcionários foram simpáticos, como não podiam deixar de ser.»

«Os funcionários foram simpáticos, como não podia deixar de ser.»

A primeira frase é de Mário Gonçalves Viana, no seu A Arte de Redigir, de 1951. Porém, em frases desse tipo eu costumo usar o verbo poder no singular. Está errado?

Muito obrigado.

Resposta:

Ambas as frases podem ser aceites em português, contudo a interpretação da primeira frase, «Os funcionários foram simpáticos, como não podiam deixar de ser», é diferente da segunda, «Os funcionários foram simpáticos, como não podia deixar de ser».

Em «Os funcionários foram simpáticos, como não podiam deixar de ser», o verbo poder concorda em número com o sujeito da primeira oração, o sintagma nominal (SN) «os funcionários», o que indica que, neste caso, o sujeito da primeira oração é o mesmo da segunda. Por conseguinte, entende-se que a informação veiculada por esta frase destaca os funcionários, sempre afáveis ou prontos a satisfazerem a obrigação de o serem.

Já em «Os funcionários foram simpáticos, como não podia deixar de ser», o verbo poder encontra-se flexionado na terceira pessoa do singular e não concorda em número com o sujeito da primeira oração. Isto indica que, nesta situação, o sujeito da segunda oração não é o mesmo da primeira, ou seja, enquanto na primeira oração o sujeito é o SN «os funcionários», por desencadear concordância em pessoa e número com o verbo ser, na segundo oração o sujeito é toda a primeira oração, «os funcionários foram simpáticos», o que desencadeia concordância verbal na terceira pessoa do singular. Sobre isto, Eduardo Paiva Raposo assinala na Gramática do Português que «nas orações, de facto, não existe um núcleo nominal ou pronominal que possa ser fonte de um traço de número para a concordância. Logo, o verbo assume automaticamente a flexão morfológica singular, quer o sujeito oracional seja simples, quer seja composto» (pág. 24481). Por isso, o sentido desta frase salienta globalmente o facto de ser comum os empregados serem simpáticos.

 

1. Raposo, E. P. (2021), Concordância Verbal. In Raposo...

Pergunta:

Gostaria de saber se verosímil e plausível são realmente sinónimos ou se existe alguma subtil diferença no significado.

Gostaria de saber também a origem etimológica das duas palavras, se será essa a razão para duas palavras tão exóticas e sinónimas coexistirem na nossa língua.

Agradeço, desde já, o vosso trabalho que é sempre exímio.

Resposta:

Em primeiro lugar, agradecemos as palavras simpáticas que nos endereçou.

A palavra verosímil tem como um dos seus sinónimos o vocábulo plausível. De acordo com o dicionário Infopédia, o adjetivo verosímil significa «que parece ser verdadeiro; provável; em que não repugna acreditar, plausível», e o adjetivo plausível apresenta o sentido de «digno de aplauso ou aprovação; aceitação; razoável». No fundo, tendo em conta o significado de ambos os termos, pode-se assumir que verosímil e plausível são palavras sinónimas quando descrevem situações aceites como verdadeiras. Também o dicionário Priberam assume estas duas palavras como sendo sinónimas.

Quanto à sua etimologia, ambos os adjetivos têm origem no latim, sendo que verosímil deriva do étimo latino verisimĭle- e plausível, da palavra latina plausibĭle- (Cf. Infopédia).

 

N. E. (17/11/2022) – A resposta tem em conta a descrição dos uso corrente dos adjetivos em apreço. Contudo, numa perspetiva especializada, verosímil e plausível distinguem-se claramente quanto ao significado, conforme observa o consultor Miguel Faria de Bastos<...

A expressão «desculpa lá»
A análise da palavra

«Por vezes, nas minhas aulas de Português como Língua Estrangeira, sou surpreendida com algumas questões singulares que me deixam a pensar sobre a forma como nós, falantes nativos, usamos a língua. Há uns tempos, um aluno perguntou-me se o «desculpa lá» que tinha ouvido na rua significava «I’m sorry». Mas afinal o que é este «lá»? E qual a função desta palavra em expressões como «desculpa lá»?» 

Reflexão de Inês Gama sobre os marcadores discursivos, nomeadamente sobre a função  da palavra «lá» na expressão «desculpa lá».